segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Consultorias - Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 02/02/2015 





Consultorias
Vosso país tem o recorde mundial de consultores. A começar pelos gatunos momentaneamente afastados da política, que inventam empresas de consultoria para receber os furtos e os frutos da Petrobras. Parodiando Bastos Tigre (1882-1957), o philosopho arrisca: Vê ilustre passageiro/Que belo tipo sarado/Embarcado ao pé de ti/E, no entanto, acredita/Não está desempregado/É Consultor Jequiti. Mesmo sem empresa registrada, durante anos ousei aconselhar um grupo europeu na compra de terras brasileiras para produzir e exportar carne de qualidade. Bons salários, risco de (perder a) vida, salvei o patrão de uma enrascada em que o seu grupo perderia US$ 22 milhões no dólar daquele tempo.

Encantado com a lábia de um bandido que conheceu alugando Ferraris nos EUA, o patrão estava a pique de se associar a um grupo paulista conhecido por vender e não entregar, comprar e não pagar, e mandar matar. Fui informado por pessoas que só me conheciam dos livros e revistas agropecuários, transmiti a informação ao patrão e devo ter andado com a cabeça a prêmio durante anos.

Há consultores sérios, a começar pelos esforçados que vendem os produtos Jequiti. Jovem senhora de minhas relações, professora e consultora de marketing, foi convidada para fazer palestra em um dos estados mais pobres do Nordeste. Palestra que deve ter agradado, porque o senador ligado ao governo estadual e federal a convidou, depois da conferência, para almoçar num sítio com o seu grupo, presentes governador, deputados, secretários, gente que apita no estado.

Champanha e uísque a rodo, manda-chuvas descontraídos, começaram as confissões. A consultora não me disse os nomes, nem perguntei e se soubesse não contaria. Mas a gabolice chega a ser infantil, tipo: “Claro que o meu Aston Martin fica em Miami”. E os nomes dos melhores bancos, lá fora, para guardar os respectivos caraminguás.

Fatos

Estuporado, contatei que o final de 2014 foi rico em estupros. Na Ilha Marion, uma das Ilhas de Príncipe Eduardo, no Atlântico Sul, focas machos da família dos focídeos, na falta de fêmeas, têm desrespeitado o pinguim-rei em atividades sexuais que, no mundo humano, seriam comparadas aos estupros. O estudo foi publicado na revista Polar Biology e mostra que as focas machos não se importam com o sexo dos pinguins, copulando indistintamente com machos e fêmeas.

Eleitores estuprando a lógica ao reeleger o pior governo de todos os tempos. Madonna denunciando o estupro não dela, mas de sua arte com o roubo de 13 canções de um álbum previsto para ser lançado em março de 2015.

A ilustre deputada Maria do Rosário (PT-RS) processando seu colega Jair Bolsonaro (PP-RJ) porque disse da tribuna que ela não merece ser estuprada. Ilustres senhoras jornalistas solidárias com a deputada gaúcha, como se o fato de não merecer estupro fosse uma capitis diminutio, perda total ou parcial da capacidade jurídica ou dos direitos do cidadão ou da cidadoa, bem como dos pinguins. O feminismo anda querendo transformar o elogio e a cantada em agressão, assédio sexual, estupro verbal. Que é estupro? É crime que consiste no constrangimento a relações sexuais por meio de violência, violação, forçamento.

Anos atrás, honrada deputada federal mineira propôs que o marido brasileiro, ao forçar o congresso sexual com sua legítima esposa naquelas noites em que a santa está com dor de cabeça, fosse acusado de estupro. Louvei o projeto pela mídia impressa baseado nos postos de trabalho que a lei criaria – fiscais do sexo conjugal –, com adicionais de trabalho noturno para reprimir ou constatar as tentativas e os estupros propriamente ditos. Sem falar do impulso na indústria de tintas fluorescentes usadas à noite nas partes pudendas do casal para permitir que o fiscal realizasse o seu trabalho. Parece que o projeto não foi aprovado.

Fluorescente, como o leitor deve estar lembrado, é substância que apresenta a propriedade da fluorescência ou da radiação associada ao processo de fluorescência. E fluorescência é luminescência que não persiste por um intervalo de tempo superior a 10-8 segundos, após a remoção da fonte de excitação. Presumo que no caso seja excitação sexual do maridão estuprador.

Enquanto seu lobo não vem, há uma bebida, que se diz 100% cerveja, veiculando na tevê propaganda em que entra num boteco bela morena, de corpo espetacular e roupas mais que provocantes, presumivelmente para beber um copo da loura, mas associando suas curvas à bebida. Salvo pela tatuagem, o visual da morena me agrada, mas ainda não tive coragem de encarar a cerveja.

O mundo é uma bola

2 de fevereiro de 962: Oto I é coroado imperador do Sacro Império Romano Germânico pelo papa João XII, ato considerado o início daquele império. O diabo é que não sei quem foi Oto I, que os portugueses chamam Otão, mas sou teimoso e descubro que foi cognominado Oto, o Grande, nasceu em Wallhausen em 912 e morreu em Memleben em 973. Filho de Heinrich I, o Passarinheiro, rei dos Germanos, e de Matilde de Ringelheim. Com a morte do pai foi coroado rei dos Germanos em Aquisgrana, que vocês conhecem como Aix-La-Chapelle ou Aachen, conforme estudem o assunto em francês ou alemão.

Hoje é o Dia do Agente Fiscal.

Ruminanças

“Não há na literatura brasileira página mais desastrada do que a crítica de Machado de Assis ao Primo Basílio, de Eça de Queiroz” (Guilherme Figueiredo, 1915-1997). 

A reforma política segundo Michel Temer - Renato Janine Ribeiro

Valor Econômico 02/02/2015


A reforma política proposta por Michel Temer, bem diferente da petista, tem consistência e merece ser mais discutida       




O vice-presidente Michel Temer defende uma reforma política que nada tem a ver com a proposta pelo partido da presidente Dilma Rousseff. O contraste dos dois projetos comprova a fragilidade do casamento de conveniência entre PT e PMDB.
Mas Temer é veterano na política e professor de Direito Constitucional num dos melhores cursos jurídicos do país, a PUC de São Paulo - e sua proposta é consistente. Examinemos seus pontos principais.

Ponto zero: o que têm em comum propostas de reforma tão diferentes como a do PT, a do PSDB e a de Temer? Que o sujeito oculto de todas elas é a eleição dos deputados federais. Se esse tema passa à frente das eleições para o Executivo e o Senado, ou para legisladores estaduais e municipais, é porque cremos que nele está a causa da corrupção nacional.

PT e PSDB afirmam isso explicitamente em suas propostas. Temer, porém, mal tocou no tema da corrupção, quando segunda-feira passada expôs sua proposta, a convite dos presidentes Paulo Skaf e Ruy Altenfelder, no Conselho de Estudos Superiores da Fiesp, do qual sou membro.

A maior parte dos analistas pensa, porém, que o sistema atual - voto proporcional com lista aberta - gera um excesso de partidos, fazendo a maioria no Congresso depender de negociações que não raro viram negociatas. Daí, a ligação entre o financiamento das campanhas e o modo de eleição dos deputados.

Primeiro ponto da reforma Temer: eliminar o voto proporcional para a Câmara, mas sem adotar o distrital, preferido pelo PSDB. Cada Estado seria um "distritão", elegendo-se os candidatos mais votados, independentemente do partido. Assim se elimina a coligação nas eleições para deputado e se reduz o número de partidos com assento na Câmara.

Isso não enfraquecerá os partidos, quebrando as tentativas de institucionalizar e disciplinar a vida parlamentar? Não, diz Temer - se enrijecermos a fidelidade, o que ele recomenda.

Nenhum partido terá interesse em lançar os 150% de candidatos (em relação às vagas) da legislação atual. Hoje, em São Paulo cada agremiação pode ter 105 candidatos, dado que a bancada do Estado tem 70 membros. (A ideia é que qualquer partido poderia fazer sozinho a bancada inteira, mais seus suplentes)

Na proposta Temer, cada partido quererá inscrever concorrentes em número próximo ao das cadeiras que espera obter, para concentrar - em vez de dispersar - os votos. A pulverização entre candidatos prejudicaria a legenda. Esse é o melhor argumento do distritão: responsabiliza os partidos e reduz seu número. Nem precisa haver cláusula de desempenho.

Mais que isso: com o PMDB lançando menos de 15 candidatos em São Paulo, em vez dos 105 de hoje, cada candidato poderá realmente usar o horário gratuito para dizer suas propostas. Esse será um avanço sensível sobre o atual modo de campanha

Mas não vamos esquecer que o voto proporcional tem a grande vantagem de assegurar que os eleitos representem as ideias ou convicções do eleitorado. É o que dá o retrato mais fiel da população. (É verdade que a multiplicação de partidos tornou difícil realizar isso na prática. Se mantivermos o proporcional, precisaremos de uma cláusula de desempenho severa)

Ponto dois: o financiamento de campanhas. Temer defende o financiamento público e privado, inclusive por empresas. Quer, porém, proibir que uma empresa ou holding financie rivais que concorrem ao mesmo cargo - como fez a Friboi, em 2014. Mas o curioso é que não mencionou a ação que corre no STF para proibir o financiamento eleitoral por empresas. A maior parte dos ministros já votou pela proibição. O assunto parece decidido, de todo modo, embora Gilmar Mendes, que pediu vistas, esteja adiando a proclamação do resultado. A proponente da ação de inconstitucionalidade, a OAB, sustenta que só pessoas físicas são eleitoras, não as pessoas jurídicas, e que não-eleitores não devem interferir no processo de escolha política pelo povo. Nestas condições, só posso imaginar que Temer queira, por emenda constitucional, restaurar a contribuição das empresas.

Ponto três: coincidência de mandatos. Temer pensa que temos eleições demais (cada dois anos), por isso propõe a coincidência: federais, estaduais e municipais numa só ocasião. Perguntei-lhe o seguinte: no modo atual, em que votamos a um só tempo para presidente, governador, senador e deputados, a escolha presidencial joga em segundo plano as legislativas, em especial as de deputado. Em 2014, a veemência da eleição ao Planalto obscureceu até as eleições de governador. Então, se pusermos no mesmo pacote as municipais, correremos o risco de só votar com atenção para um ou dois cargos, de um total de quase dez? Temer foi muito educado, mas insistiu em que o problema já existe. Concordo. Mas sua proposta o agrava.

Eleições têm um papel pedagógico e politizador, que se perde caso fiquem mais espaçadas no tempo. Este, aliás, me parece o grande argumento em favor de eleições separadas: que o cidadão tenha mais ocasiões de punir ou premiar os partidos conforme seu desempenho no governo, de qualquer esfera.

Em geral, mais eleições, melhor representação, mais participação, mais democracia (dentro, claro, de limites razoáveis).

Ponto quarto: o timing. Segundo Temer, a reforma tem que ser votada este ano, se não, não será apreciada nesta legislatura, mas só em 2019. E faz a sugestão original e inteligente de que seja aprovada para vigorar daqui a oito anos (na verdade, a partir de 2022), evitando que interesses de curto prazo façam parlamentares se opor a ela. Dessa maneira, todos podem se adaptar à reforma. Aqui tem toda a razão.