quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

MARTHA MEDEIROS - Aos remos

Zero Hora 28/01/2015

Não sou só eu que tenho a impressão de que estamos sentados sobre um barril de pólvora. É só dar uma espiada nos comentários deixados nas redes sociais, em conversas de bar, nas trocas de mensagens por WhatsApp, nos telejornais. O Brasil descarrilou, e agora?
Apagões, crise hídrica, obras superfaturadas que não terminam, escândalos de corrupção em todas as esferas, ausência crônica de segurança, aumento de impostos, saúde e educação vergonhosas, desgoverno evidente e início de uma recessão de que não se conhece ainda as consequências. Uma amiga pergunta no Facebook: “Todo mundo já decidiu para onde vai se mudar?”.
Ah, se fosse fácil assim. Fazer as malas e se mandar para algum lugar em que se pudesse caminhar pelas ruas sem medo, em que os policiais fossem bem treinados, em que houvesse metrô e muitas ciclovias, em que não se racionasse nada, a luz não caísse no meio da tarde e os tributos pagos revertessem em uma vida digna. É claro que qualquer nação tem problemas, mas o Brasil abusou da prerrogativa.
Eu adoraria fechar minhas contas e zarpar. Tenho condições de que raríssimas pessoas dispõem para fazer isso, a começar pelo meu trabalho, que não depende de nada a não ser de um laptop. Ainda assim, é muito difícil deixar amigos e familiares. E é frustrante desistir. Quem deserta está colocando um ponto final na confiança que um dia teve.
Por ora, ficarei, mas me pergunto: como ajudar este raio de país? De nada adianta declarar guerra à ponderação e incitar a violência. Em termos coletivos, o melhor caminho continua a ser a defesa da imprensa livre e sair todos às ruas de forma pacífica, como fizeram recentemente os parisienses por ocasião do atentado à Charlie Hebdo, como fizeram os argentinos por ocasião da morte do promotor Alberto Nisman, como fizemos nós mesmos em 2013 – é o jeito de exercer pressão e mostrar que nosso povo não é tão mole quanto parece.
Detalhe: de cara limpa, sem máscaras, sem queimar ônibus e destruir agências bancárias. Depredações são prova de fraqueza, não de força.
Nossa indignação coletiva precisa ser fotografada, filmada e difundida para o Planalto e o planeta, sem deixarmos de lado as atitudes particulares, que são fundamentais. É hora de agir com total responsabilidade dentro de casa, apagando as luzes, fechando as torneiras, economizando os gastos do prédio, do condomínio, da empresa.

Essa corja política não merece nossos sacrifícios, eu sei, mas não podemos continuar esperando que eles resolvam hoje o que nunca os preocupou antes. Temos que tomar conta do Brasil, assumir este país que deu profundamente errado, mas que é nosso. Porque até aqui, perdemos de lavada. Eles lavavam dinheiro e nós lavávamos as mãos. Deu no que deu: escassez de água e de futuro.

Maria Sklodowska - Eduardo Almeida Reis

Também não preciso de um Nobel de sexologia para saber que as mulheres normais, de 39 e mais anos, continuam gostando das coisas boas da vida


Eduardo Almeida Reis
Estado de MInas: 28/01/2015 



Nascida em Varsóvia, Polônia, em 1867, falecida em Passy, França, em 1934, Maria Sklodowska foi a única pessoa, até hoje, a receber dois Prêmios Nobel na área científica: de física, em 1903, pelas descobertas sobre a radioatividade e de química, em 1911, pela descoberta dos elementos químicos rádio e polônio. Recebeu-os com o nome de Marie Curie, como passou a chamar-se depois de se casar com o físico francês Pierre Curie (1859-1906), laureado junto com ela com o Nobel de 1903. Tiveram duas filhas. Uma delas, Irene Joliot-Curie, premiada com o Nobel da química em 1935.

Se Pierre morreu em 1906 e Marie em 1934, não preciso de um Nobel de matemática para calcular que ficou viúva durante 28 anos, a partir dos 39 aninhos. Também não preciso de um Nobel de sexologia para saber que as mulheres normais, de 39 e mais anos, continuam gostando das coisas boas da vida.

Até aqui temos uma história incomum e bonita. Marie sofreu o diabo para conseguir estudar. Pierre, ao que parece, tinha boa situação, nunca frequentou escolas. Estudava em casa e, aos 20 anos, já era doutor. Casaram-se, ela ganhou dois Prêmios Nobel na área de ciências, ele só ganhou um porque morreu logo depois.

Agora, vem o final da história. O astrônomo David Grinspoon, pesquisando os arquivos pessoais de Albert Einstein, encontrou uma carta que Einstein escreveu a Marie dizendo-se orgulhoso pela oportunidade de tê-la conhecido pessoalmente, de mesmo passo em que se dizia enojado com o tratamento que ela e as filhas vinham recebendo de parte da imprensa francesa, que a acusava de “destruidora de lares” pelo fato de namorar o físico Paul Langevin, que havia sido aluno de Pierre Curie. Langevin já estava separado e as cartas de amor trocadas entre ele a Marie teriam sido entregues aos jornais pela ex-mulher de Langevin. A campanha de certa imprensa contra Marie e as duas filhas foi tão forte que elas tiveram de se refugiar em casa de amigos. Ao que tudo indica, Langevin e Marie namoraram depois que ela enviuvou. E as fotos da época mostram que Marie era muito namorável.

Ainda bem que o Brasil, este impávido colosso de 8,5 milhões de km2 e mais de 200 milhões de habitantes, não conhece canalhices do gênero pelo fato de até hoje não ter sido lembrado para o Nobel que merece: o da corrupção.

Enfronhado

Como transitivo direto e pronominal, o verbo enfronhar significa tornar(-se) versado, instruir(-se), fazer tomar ou tomar conhecimento pleno de um assunto. Daí, o adjetivo enfronhado: que se enfronhou. Durante séculos, julguei-me enfronhado no assunto “produção de leite nos trópicos”, mas fui enfrouxecendo e hoje estou enfrouxecido. Pois é: o verbo enfrouxecer existe e significa fazer ficar frouxo, lasso. Não me lembro de o ter visto em letra de forma nem mesmo sobre assuntos sexuais. O pessoal prefere brochar, perder temporária ou definitivamente a capacidade de ter uma ereção, como queria o Houaiss, ou broxar, como defendia o Aurélio, dois dos nossos melhores lexicógrafos.

Não pense o leitor que me sentei diante do computador para escrever chulices ou tabuísmos, philosopho bem-intencionado que sempre fui. Sentei-me aqui para falar do verbo enfronhar no sentido de meter o travesseiro em fronha, uma das coisas mais difíceis que conheço. Escrevo num domingo, pouco antes do almoço, já assustado com a fronha que devo trocar à noite. É função complicadíssima, que já passei da idade de aprender.

Apavora-me a visão do travesseiro já desenfronhado sobre a cama ao lado da fronha lavada e passada, dobrada, à espera do artista incumbido da árdua missão. Com a comadre de folga, domingo é o diabo.

Terminado o belo suelto que você acaba de ler, desandei a philosophar e concluí que passaria a tarde inteira e boa parte da noite pensando na dificuldade que teria para enfronhar o travesseiro. Então, com a decisão de um grande comandante militar, gritei: “Avante!”. Fui ao quarto, lutei heroicamente e consegui enfronhar a peça. Foi duro, mas consegui. Depois, esquentei o almoço e passei o resto da tarde descansando da luta.

O mundo é uma bola


28 de janeiro de 1808: abertura dos portos brasileiros às nações amigas, mesmo porque não faria sentido abrir às nações inimigas. Em 1932, as forças japonesas começam a ocupação de Xangai. Em 1935, a Islândia é o primeiro país a legalizar o aborto, até hoje proibido num país grande e bobo, que prefere assistir ao nascimento dos seus anjinhos para mais tarde matá-los a tiros nas guerras do tráfico. Em 1942, presidido pelo ditador Getúlio Vargas, o Brasil rompe relações com a Alemanha e a Itália. Em 1943, Vargas e Roosevelt, em Natal (RN), iniciam as negociações que levariam à criação da FEB, Força Expedicionária Brasileira, durante a Segunda Guerra Mundial. O craque William Waack, um dos mais brilhantes jornalistas brasileiros, escreveu excelente livro sobre a FEB: As Duas Faces da Glória. Hoje é o Dia do Portuário e o Dia do Comércio Exterior.

Ruminanças

“Há em todas as cousas um sentido filosófico” (Machado de Assis, 1839-1908).