domingo, 19 de abril de 2015

EM DIA COM A PSICANÁLISE » Sobre a liberdade

EM DIA COM A PSICANÁLISE » Sobre a liberdade


Estado de Minas: 19/04/2015





Por liberdade entende-se geralmente ser livre para fazer, ir, falar, pensar o que quisermos. Muitos abraçam essa ideia como se fosse possível. Mas a liberdade é um conceito bonito, atraente e impraticável. Vejamos.

Engana-se quem acredita que existe para nós essa possibilidade. Nascemos por decisão do outro ou até mesmo por seu descuido. Não temos liberdade para decidir viver ou morrer. Sobrevivemos por decisão alheia. Não decidimos a hora do fim, por pior que seja, somos forçados a atravessar o que quer que seja.

Somos homem ou mulher. O corpo biológico não determina o desejo ou a sexualidade, se hétero ou homossexual. Uma escolha forçada subjetiva e inconsciente, ainda crianças nos identificamos com um sexo ou outro e muitas vezes só na adolescência assumiremos as consequências, o que pode causar muitas dificuldades para um sujeito.

Um pouco menores hoje, mas não esqueçamos que o famoso escritor Oscar Wilde foi condenado pela corte inglesa por sua conduta sexual considerada imoral e em dois anos de trabalhos forçados morreu numa prisão miserável. E sobre Tiradentes, nosso inconfidente, o que dizer?

Não somos quem desejaríamos ser. Ao contrário, muitas vezes gostaríamos de estar na pele do outro porque sua grama é mais verde... Ser diferente, sentir diferente, ter outro olhar, amar quem for melhor, mais adequado talvez, mas qual o quê! Quando vemos, fomos fisgados e já não somos donos de nós mesmos.

O Dicionário Aurélio (velho Aurélio, e não o Google) descreve a palavra liberdade como: “faculdade de cada um se decidir ou agir segundo a própria determinação”. Porém como gostaríamos de ter dito outras palavras, agido de outra forma, e por que não o fizemos, se como se, define no dicionário, somos livres para agir segundo nossa determinação? Muitos diriam: pergunta difícil não vale!

Porque somos determinados por uma força antagônica de origem inconsciente, que nos divide e nos faz ser pelas metades. E metades contrárias. Nossa divisão subjetiva nos faz conscientes das nossas vontades, e dos caprichos do ego e igualmente desconhecedores do desejo, o que resulta numa alienação perigosa, já que, sendo o desejo nosso melhor guia, ainda insistimos em não o escutar e nos deixar levar pelo ego, a vaidade, a imbecilidade que hoje impera no mundo.

Também o dicionário diz que liberdade é a “faculdade de praticar tudo quanto não é proibido por lei”, apontando com isso que o homem não pode fazer tudo o que quer e precisa aceitar limites que lhe são imprescindíveis. A educação é um exemplo de cerceamento necessário para a humanização.

Acreditar numa liberdade total, seja ela de expressão, de movimentos, de atitudes e ações, é ilusão e ingenuidade. Até mesmo a liberdade de pensamento deve ser observada, pois o pensar pode nos conduzir a lugares demasiado sombrios. E um corte em determinado momento muda a direção de uma vida.

E por isso mesmo concordo e concluo com o professor da USP e filósofo Clovis de Barros Filho: “E tudo isto nos permitiria concluir que fazer o que se quer é uma forma a mais de escravidão. Menos visível que correntes, algemas e celas. Mas não tão determinante quanto. O que talvez nos obrigasse a concluir que, para agir livremente, de verdade, teríamos que fazer o que não queremos. Na contramão dos apetites. Só assim teríamos a certeza de não estarmos sob o jugo tirânico da própria carne. O que, convenhamos, tiraria da liberdade todo o seu charme. Faria dos seus símbolos mais diversos, do cartaz com Che Guevara às caminhonetes 4x4, uma fonte a mais de tristeza no mundo”.

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