domingo, 26 de abril de 2015

EM DIA COM A PSICANáLISE » Palavra parada

EM DIA COM A PSICANáLISE » Palavra parada


Regina Teixeira da Costa - reginacosta@uai.com.br
Estado de Minas: 26/04/2015 




Existem pessoas inspiradas. Como as admiro e, por isso mesmo, desculpem-me a franqueza, as invejo (em 50 tons)! As pessoas assim dotadas precisam expressar seus sentimentos. Geralmente, encontram meios criativos para fazê-lo e, dessa forma, tocam as outras que, ao se depararem com seu feito, identificam-se e compartilham de um grande e prazeroso entusiasmo.

Freud escreveu sobre os “Escritores criativos e devaneio” (1908). Interessado pela criação imaginativa, comparou o brincar infantil com a criação poética. Ele indaga se não estariam na infância os primeiros traços da capacidade imaginativa, já que a criança prefere o brincar e usa nessa atividade muito da realidade em que vive. Freud sugere que, ao brincar, toda criança se comporta como um escritor criativo, pois cria um mundo próprio. O autor nos ensina que a antítese do brincar não é o sério, mas sim o real. Um equívoco frequente.

Além de colocar os escritores criativos e sua capacidade de fantasiar e de criar como herdeiros do brincar infantil, Freud ainda afirma serem as fantasias oriundas dos desejos insatisfeitos. Toda fantasia é a realização de um desejo, uma correção da realidade insatisfatória.

Nós, literalmente, pegamos uma boa carona no que os artistas criam e por isso mesmo desfrutamos de suas obras com tanto prazer. Freud era um excelente leitor, amava a literatura. Sergio Paulo Rouanet escreveu o livro Os dez amigos de Freud (Companhia das Letras, 2003) em dois volumes, apresentando 10 dos escritores preferidos e as afinidades do pai da psicanálise.

Os escritores sabem pelo menos intuitivamente a importância das palavras e como são fundamentais por urdirem os laços que nos ligam aos demais. Elas são a cura que nos alivia dos males sofridos e, ao mesmo tempo a faca que corta e fere frequentemente nosso semelhante. O conselho: devemos cuidar mais do que sai da boca do que do que por ela entra, é bíblico. Encontrei outro dia uma poetisa, Viviane Mosè, que escreveu: “Pessoas adoecem da razão, de gostar de palavra presa. Palavra boa é palavra líquida, escorrendo em estado de lágrima. Lágrima é dor derretida, dor endurecida é tumor”.

A palavra é vital de fato e, quando encontramos quem as use bem, ficamos fascinados. A força da palavra, seja falada, escutada, escrita, sustentada, é de inacreditável influência e poder. A psicanálise trabalha com a palavra presa e com a pedra que ela significa para um sujeito. A verdade íntima de cada um de nós espera ser resgatada de um recôndito estado de desconhecimento. Espreita palavras a serem pronunciadas. Ou não. É o que a poeta Sandra Viola toca nos seguintes lindos versos:

“Como uma pedra no mar/há em mim/uma palavra parada

Pedra e palavra aguardam/(inutilmente)/ a poesia”

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