domingo, 1 de fevereiro de 2015

EM DIA COM A PSICANÁLISE » Só nos resta o bem viver

Regina Teixeira da Costa
Estado de Minas: 01/02/2015 




Na sociedade atual, envelhecer parece uma coisa inaceitável e dramática. Entre tantas escolhas que podemos fazer e por serem tantas nos provocam ansiedade constante, uma delas é o que fazer contra o envelhecimento. Como se também fosse questão de escolha evitar qualquer sinal e seguir muitas dicas para prevenir o fim.

O visual é colocado acima de tudo. O corpo é, antes de mais nada, imagem. E a imagem exigida pela mídia e internalizada pelo coletivo, é moldada dentro de padrões muito rigorosos, nos quais o envelhecimento não se encaixa.

Todos gostariam de permanecer jovens, belos e sem rugas tanto quanto possível. Como isso está fora de cogitação, envelhecer bem inclui sentir-se vivo e ligado ao que está ao redor e também ao presente, embora as lembranças sejam importantes.

Não sou muito junguiana, porém encontrei num livro uma citação de Carl Jung que achei muito boa: um velho que não sabe dar ouvidos ao mistério dos riachos que murmuram desde os picos até os vales é tolo, uma múmia espiritual, que não é outra coisa senão passado estagnado. Ele permanece à margem de sua vida, repetindo-se tal qual uma máquina até cair na máxima banalidade. O que esperar de uma cultura que precisa de tais fantasmas?.

Podemos adiar um pouco os efeitos do tempo quando nos cuidamos. Aceitar a vida como ela é faz bem para a saúde também. Concordar que quando os anos passam não temos apenas perdas é uma coisa boa. Afinal, só os jovens nunca sentiram que envelhecer traz certo conforto interno. Estamos mais confiantes e íntimos de nós mesmos e de nossos desejos. Nós nos permitimos dizer não com mais tranquilidade e nos damos mais direito ao descanso, a chegar em casa e sentir um grande prazer em estar entre nossos filmes, livros, músicas – com liberdade para não embarcar em qualquer canoa furada. E podemos ficar apenas quando a conversa é boa.

Pretender eternizar a juventude pode se tornar algo verdadeiramente grotesco, principalmente numa sociedade cada vez mais velha. Esse ideal de juventude produz infelicidade. Aceitar envelhecer é aceitar viver melhor. Em grande parte da vida estaremos mais velhos do que novos. Isso é fato, senão morremos jovens.

Aqueles que pensam que o velho é um peso morto deveriam dar uma volta pelo mundo para ver como eles estão tomando sol nas praias, viajando, desfrutando o prazer da boa conversa, da música e da dança, lendo e apreciando a natureza. Aproveitando, enfim, a vida que ainda têm e pode ser vivida com bom humor, apesar de finita.

O grande lance é: o desejo não envelhece nem morre. Enquanto estamos vivos, em qualquer idade, o desejo permanece vivo e é o nosso maior guia para aquilo que realmente importa. Mas digo desejo mesmo, aquele que nos mantém e indica a direção. Ele não se confunde com qualquer vontade ou capricho.

Durante a vida passamos pela juventude e por sua perda. Uma primeira morte nos atravessa e nos faz ver mais além, descobrindo que há vida de qualidade para quem ainda sabe alguma coisa sobre o seu desejo e pode, pelo menos, realizar uma pequena parcela dele. Em qualquer idade. 

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