terça-feira, 1 de abril de 2014

Epitáfio entre as mãos geladas - Giselle Zamboni

 
Epitáfio entre as mãos geladas
Enterrou a semente
Enterrou o gato
Enterrou a mãe
Enterrou o filho
Não enterrou o Poema 
................................
Reviu a árvore
Reviu o gato
Reviu a mãe
Reviu o filho
Releu o Poema 
Se viu no espelho
Renasceu feliz.


 
 

Tereza Cruvinel - Silêncio nos quartéis‏

Tereza Cruvinel - Silêncio nos quartéis
 
Mais eloquente do que os discursos foi o silêncio dos quartéis



Estado de |Minas: 01/04/2014


O céu cinzento de ontem foi propício à recordação do dia em que o Brasil morreu na praia e embrenhou-se num túnel escuro, do qual sairia 21 anos mais tarde. Em verdade, no dia 31 apenas começaram, com a movimentação das tropas do general Mourão Filho, a partir das 5h da manhã, as 44 horas cruciais, que terminarão pouco depois da 1h da madrugada de 2 de abril. Foi mais ou menos àquela hora que, já estando a situação militar praticamente dominada pelos golpistas, um senador da República fez o serviço sujo institucional, apossando-se da Presidência num golpe de mão (e de falácias) para entregá-lo a um presidente da Câmara que se prestou ao fingimento no cargo, até que fosse empossado o primeiro general ditador. A exatidão da data não mudará a história, mas é parte dela, e assim devia ser ensinada.

Para os marcados pela ditadura, que pensaram tanto nela nestes últimos dias de tanta evocação, mais eloquente que alguns discursos e as poucas manifestações foi o silêncio dos quartéis. Por tantos anos, a Ordem do Dia nesta data foi uma bula a ser decifrada. Por ela, sabia-se quando o vento soprava a favor da distensão ou do endurecimento, se haveria trovoadas ou seria mantida a paz dos cemitérios. Mesmo após a redemocratização, elas continuaram sendo editadas, para recordar a “revolução gloriosa de 1964”. Há pouco tempo, deixaram de ser divulgadas mas não faltariam ontem, se não tivesse o ministro da Defesa, Celso Amorim, transmitido a determinação da presidente Dilma: não seriam admitidas celebrações por parte do pessoal da ativa. Os reformados, sim, que digam o que quiserem, desfrutando da liberdade de expressão garantida pela democracia. O silêncio dos quartéis no cinquentenário do golpe teve sua profecia musical. Apesar de você, de Chico Buarque, sempre foi cantada nas aflições da resistência. “Apesar de você/Amanhã há de ser/Outro dia. Inda pago pra ver/o jardim florescer/Qual você não queria./Você vai se amargar/Vendo o dia raiar/Sem lhe pedir licença.” Embora tão sutil, foi censurada.

Falaram ontem os que deviam falar. A presidente Dilma fez um bom discurso, contido na autorreferência, apesar do que sofreu no porão da tortura, restrito ao significado maior da data: “Nós podemos olhar para esse período e aprender com ele, porque nós o ultrapassamos”. Falaram os que viveram a hora crucial, como Waldir Pires e Almino Afonso, octogenários, mas donos de uma lucidez impressionante, na lembrança e na avaliação. O Congresso, que foi algoz e vítima, e ainda os que, tendo resistido, puderam governar o país na democracia, Lula, Sarney e Fernando Henrique. Aos mortos, que não falam, as evocações de ontem e de hoje eram devidas.

Jango

Mesmo nestes dias de revisitação dos idos de 1964, o papel do ex-presidente João Goulart segue deslocado do lugar que lhe cabe na história. Os conservadores de ontem e de hoje continuam responsabilizando-o por um golpe do qual foi apenas vítima. Parte da esquerda ainda lamenta que ele não tenha comandado a resistência enquanto era tempo, quando havia ainda forças militares leais. Errático, frustrou os aliados que esperaram por uma ordem que ele não deu. Mas o comportamento de Jango no golpe já fora esboçado lá atrás, na crise do veto militar à sua posse, depois da renúncia de Jânio, em 1961. Brizola comandou a resistência com uma metralhadora no ombro, uma rádio no porão do Palácio Piratini, cabeça da cadeia da legalidade, e as tropas prontas para agir. Na sinuosa volta da China, passando por Paris, Nova York, Buenos Aires e Montevidéu, Jango acabou aceitando o acordo para tomar posse sob o sistema parlamentarista, abdicando de parte dos poderes presidenciais. Assim contornava o veto militar e evitava derramar sangue. Decepcionou Brizola. Ali, depois de tudo resolvido, falou ao povo gaúcho: “Que Deus me proteja, que o povo me ajude e que as armas não falem”. Em 1964, não quis novamente que as armas falassem, sabedor que era das graves consequências de uma intervenção militar americana, que apontava inclusive para a cisão territorial do Brasil. Foi o que ele contou a Waldir ter ouvido de San Thiago Dantas.

Jango, fazendeiro na origem, não era um intelectual refinado, mas não era um político estúpido nem irresponsável. Elegeu-se deputado, foi ministro do Trabalho, duas vezes vice-presidente, com votações maiores do que as do titular da chapa, antes de suceder a Jânio. Não armava golpe, não era comunista nem entregaria o poder a eles. “Não serei o Kerenski de vocês”, disse, num encontro em que havia sindicalistas do PCB. Kerenski governou a Rússia entre a deposição da monarquia, em fevereiro, e a revolução bolchevique, em outubro. O PCB, ou melhor, Prestes, é que se iludia com a conjuntura brasileira.

Juremir Machado, em seu livro Jango, vida e morte no exílio, recompõe sua nostalgia no exterior, tão perto do Brasil em que não podia entrar. Voltou morto. Seu corpo exumado voltou recentemente a Brasília para a coleta de material para análises, no âmbito da investigação sobre as causas de sua morte. É importante sanar essa dúvida. O regime não tinha limites e era sócio da Operação Condor. Mas ele era cardiopata, já tivera pelo menos dois enfartes antes. Não é isso, entretanto, que lhe dará o devido lugar na história. É o resgate do significado de seu governo e da emergência do povo em defesa das reformas de base, da radicalização democrática que era ensaiada, despertando as reações que levaram a um regime que, apesar de sua resignação, acabou correndo sangue. E muita dor.

TeVê

TV paga

Estado de Minas: 01/04/2014



 (Canal Arte 1/Divulgação)

O filme do filme


Onde a terra acaba (foto), documentário de Sérgio Machado, será exibido às 20h30 no canal Arte 1. Narrado por Matheus Nachtergaele, o filme é uma homenagem ao longa homônimo, dirigido por Mário Peixoto em 1931. Na época, o diretor não chegou a concluir o filme por causa de divergências com sua atriz principal, Carmen Santos, que também assinava a produção do documentário. Machado utilizou cartas e cenas originais para dar sua versão da história.

ÚLTIMO EPISÓDIO DE
THE WALKING DEAD


A Fox exibe, às 22h30, o último episódio da quarta temporada de The walking dead. Rick e os outros começam a se reunir em Terminus e descobrem que o que consideram um santuário não é exatamente o que parece.

SEGUNDA TEMPORADA
DA SÉRIE CHICAGO FIRE


O 15º episódio inédito da segunda temporada de Chicago Fire, no ar às 22h, no canal Universal, começa quando Gabriela (Monica Raymund) se prepara para voltar ao trabalho como paramédica. Mas ela não está feliz por não ter passado no teste da academia de bombeiros. Casey (Jesse Spencer) tenta consolá-la, mas a paramédica se mostra ainda mais chateada. Depois, no batalhão, Gabriela se encontra com os bombeiros que a apoiam a continuar treinando na Academia para realizar novo teste.

COZINHA SAUDÁVEL
RIMA COM SAMBA


Bela Gil tem uma missão: provar que comida de verdade não faz mal, se soubermos fazer boas escolhas. No episódio de hoje do Bela cozinha, às 22h, no GNT, a chef e nutricionista recebe Arlindo Cruz. Acostumado aos petiscos mais tradicionais das rodas de samba que frequenta, ele vai experimentar as alternativas saudáveis de Bela: batata palito assada com molho de coentro, pipoca à baianada, bolinho de arroz com painço e barrinha de frutas com nozes.

ARTE PERNAMBUCANA
EM DOCUMENTÁRIO


O documentário Paranã-Pucã, onde o mar se arrebenta, de Jura Capela, é destaque no canal Curta!, às 20h45. O filme fala sobre o panorama das artes plásticas no Recife, apresentando pesquisa sobre os diversos grupos de arte e artistas, da década de 1930 aos dias atuais. A narrativa mostra as várias situações econômicas e históricas que se passaram nessas décadas no Brasil. Apesar de ser baseada em artistas da capital pernambucana, a pesquisa reflete a situação da arte contemporânea em todo o país.

QUEM VAI SER ESCOLHIDO
O MELHOR CONFEITEIRO?


No Discovery Home & Health, às 21h30, vai ao ar mais um episódio da série Batalha dos confeiteiros. Buddy Valastro, o “Cake Boss”, procura por um assistente e coloca 13 talentosos confeiteiros na disputa com a segunda temporada da série. A nova safra composta por 10 episódios mostra concorrentes dispostos a provar que merecem o novo emprego na Carlo’s Bakery, a famosa confeitaria de Buddy localizada em Nova Jersey, e o prêmio de US$ 100 mil que também fica com o vencedor.




CARAS & BOCAS » Último capítulo
Simone Castro

Amélia (Bianca Bin) e Franz (Bruno Gagliasso) serão felizes para sempre no desfecho de Joia rara (João Miguel Júnior/TV Globo)
Amélia (Bianca Bin) e Franz (Bruno Gagliasso) serão felizes para sempre no desfecho de Joia rara

O único mistério do capítulo final de Joia rara (Globo), que irá ao ar na sexta-feira, é o destino de Ernest (José de Abreu). Notícias de bastidores indicam que ele morrerá depois de ser baleado para defender Manfred (Carmo Dalla Vecchia), que raptou Pérola (Mel Maia). Mas, as autoras Duca Rachid e Thelma Guedes podem ter outros planos para o vilão que se redimiu com a ajuda da neta. Lembre-se que Dália (Tânia Khalill), namorada de Ernest, está grávida, à espera do primeiro filho do casal. Já outros casais têm a sorte selada. Silvia (Nathalia Dill) e Viktor (Rafael Cardoso) se casarão, assim como Arlindinho (Pedro Neschling) e Serena (Simone Gutierrez), Lindinha (Cacau Protássio) e Etelvino (Glicério do Rosário) e Belmira (Juliana Lohman) e Odilon (Tiago Abravanel). Hilda (Luiza Valdetaro) vai descobrir que espera um filho de Toni (Thiago Lacerda), assim como Amélia (Bianca Bin) e Franz (Bruno Gagliasso), que terão um final feliz ao lado da amada Pérola e de mais um herdeiro. Aurora (Mariana Ximenes) e Lola (Letícia Spiller) se reconciliarão com seus respectivos namorados, Davi (Leandro Lima) e Fabrício (Ricardo Pereira), e Iolanda (Carolina Dieckmann), que não pode mais ter filhos, e Mundo (Domingos Montagner) adotarão uma criança. Manfred (Carmo Dalla Vecchia) morrerá em um confronto com a polícia e sua mãe, Gertrude (Ana Lúcia Torre), acabará louca. Um show com as estrelas Lola e Aurola, finalmente dividindo o palco no cabaré, deve encerrar a trama com muita festa. Espera-se nos capítulos finais a volta de Nicette Bruno (Santinha), que estava afastada das gravações desde a morte do marido, Paulo Goulart.

XUXA CONTA QUE THALIA
FOI VETADA EM PROGRAMA


A apresentadora Xuxa, que está afastada da TV por problemas de saúde, revelou, em conversa com fãs, em vídeo do YouTube, que a participação da cantora Thalia não foi ao ar no Planeta Xuxa, porque na época a artista estrelava uma novela do SBT. “Acho que foi porque, na época, a Thalia era do SBT. Chegamos a gravar e tal, mas a Globo ficou com medo de fazer propaganda indevida, porque as novelas da Thalia davam grande Ibope. Acho que foi por isso.” Uma das novelas de sucesso da mexicana era Maria do Bairro.

BAND PLANEJA ATRAÇÃO
PARA SÁBADO À TARDE


Luciano Huck e Raul Gil terão concorrência, em breve, nas tardes de sábado, na Band. A emissora planeja atração para ocupar a grade vespertina, hoje com enlatados e esportivos. O canal paulista estaria desenvolvendo o projeto, que está guardado a sete chaves.

LUANA PIOVANI É NOME
CERTO EM SÉRIE POLICIAL


Glória Perez escreve série policial para a Globo. Batizada de Dupla identidade, será um suspense sobre serial killers. No elenco, entre outros, Luana Piovani, que vai interpretar a personagem Vera. O último trabalho da atriz na emissora foi na novela Guerra dos sexos. Nome cotado para um dos principais personagens da atração é de Thiago Fragoso, que recentemente interpretou o gay Niko, em Amor à vida.

PRATO NACIONAL


O SBT divulgou, ontem, o lançamento da versão nacional do programa Hell’s kitchen. O temido chef Gordon Ramsay estrela uma das versões mais badaladas, que vai ao ar no Brasil no canal TLC (TV paga). Ele toca fogo na disputa em que os candidatos tentam aprovar seus pratos. O chef Jefferson Rueda será o protagonista da versão do SBT, que estreia depois da Copa do Mundo. O formato é da Freemantle.

VIVA
A gravação do programa de rádio direto do Cabaré Pacheco Leão, em Joia rara (Globo). Mais uma vez, cenas para embalar nostálgicos com acerto na época retratada. Produção caprichada.

VAIA
O telespectador deve ter perdido a conta dos capítulos que tratam da doença de Cadu (Reynaldo Gianecchini), na trama de Em família (Globo), sem chegar a lugar nenhum. 

LITERATURA » Festival da Mantiqueira‏

LITERATURA » Festival da Mantiqueira
Estado de Minas: 01/04/2014


João Bosco vai cantar em festival literário (Gil Ferreira/divulgação)
João Bosco vai cantar em festival literário


A sétima edição do Festival da Mantiqueira – Diálogos com a Literatura, que será aberto em São Francisco Xavier (SP) na sexta-feira, destacará dois aspectos que nem sempre ganham holofotes em eventos do gênero: livros para crianças e canção popular. A ideia do festival é chamar a atenção também para narrativas pouco badaladas abordadas não só por escritores, mas por cineastas, historiadores, jornalistas e compositores.

A sessão de abertura contará com palestra do escritor Cristovão Tezza, encarregado de abordar o tema “Literatura à margem”. Vários mineiros participarão do evento: o cantor e compositor João Bosco, por exemplo, fará o show de abertura.

A mesa “O tempo da escrita”, no sábado, reunirá autores que lançaram o primeiro livro já maduros – caso do araxaense Evandro Affonso Ferreira. Domingo, o compositor Fernando Brant, sócio fundador do Clube da Esquina, e o baiano José Carlos Capinam, pioneiro tropicalista, discutirão a MPB nos últimos 50 anos. A mediação é do belo-horizontino Humberto Werneck, autor de Chico Buarque – Tantas palavras e O santo sujo – a vida de Jayme Ovalle.

Outro talento mineiro, Jacques Fux – que levou o Prêmio São Paulo de Literatura na categoria estreante com o livro Antiterapias –, vai bater papo com o público no domingo.

O festival convidou Daniel Munduruku para falar das relações entre o índio e a literatura brasileira, Ilan Brenman para comentar seus livros inspirados na cultura judaica, Reginaldo Prandi para abordar a cultura afro-brasileira.

Os 50 anos do golpe civil-militar de 1964 também serão lembrados em palestras do historiador Daniel Aarão Reis Filho e de Bernardo Kucinski.

A Copa do Mundo também entrou na roda literária. Autor do elogiado O drible, Sérgio Rodrigues vai falar das conexões do jornalismo esportivo com o romance.

7º FESTIVAL DA MANTIQUEIRA
Praça Cônego Antonio Manzi, São Francisco Xavier, São Paulo. De sexta-feira a domingo. Entrada franca. Informações: (31) 3288-0136 e www.festivaldamantiqueira.com.br

Memória viva Livros e filmes sobre os anos de chumbo ajudam a repensar a história do Brasil

Memória viva 
 
Livros e filmes sobre os anos de chumbo ajudam a repensar a história do Brasil
Daniel Camargos
Estado de Minas: 01/04/2014


Iara Iavelberg, a jovem guerrilheira que deixou a vida burguesa, é tema de documentário em cartaz em BH (Carlos Moura/CB/D.A Press)
Iara Iavelberg, a jovem guerrilheira que deixou a vida burguesa, é tema de documentário em cartaz em BH

Nos últimos meses, livros e filmes têm sido lançados no país com o propósito de esclarecer questões que permanecem à sombra da historiografia relativa ao golpe civil-militar de 1964, que ontem completou 50 anos. Um bom exemplo é o documentário Em busca de Iara, dirigido por Flávio Frederico, com roteiro e entrevistas feitas por Mariana Pamplona.

Mais que produtora, a roteirista é fruto do golpe. Seu nome homenageia a tia, a aguerrida Iara Iavelberg – que, na clandestinidade, atendia por Mariana e foi assassinada aos 27 anos, em Salvador. A morte se deu durante caçada policial à guerrilheira do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) e a seu companheiro, o capitão Carlos Lamarca, que desertou das Forças Armadas.

“A ideia surgiu a partir da filmagem que fiz da exumação dos restos mortais da Iara, em 2003. A família lutou anos na Justiça por essa exumação”, afirma Mariana, que estava na barriga da mãe quando a tia morreu. A versão oficial do governo militar era de que a militante se matou para não entregar Lamarca. Porém, análise da perícia mostrou que ela foi executada.

Iara Iavelberg já havia sido retratada no filme Lamarca, do diretor Sérgio Rezende, em 1994. Mariana explica que muitas obras trazem a versão errada da morte de sua tia, pois foram lançadas antes da perícia. A saga da bela judia paulistana que trocou a confortável vida burguesa pela guerrilha ajuda a compreender por que tantos jovens como ela aderiram à luta armada.

Na série de matérias sobre os 50 anos do golpe, o Estado de Minas publica lista com 10 sugestões de livros e filmes essenciais para compreender o período. O jornalista e ex-deputado federal Fernando Gabeira, autor do best seller O que é isso, companheiro?, garante: ainda há muitas histórias que merecem ser contadas sobre os anos de chumbo.

“Escrito no final do exílio, o livro tinha como objetivo dar um depoimento sobre o que vi durante a ditadura militar, de forma leve e jornalística, para alcançar o grande público. O que é isso... me trouxe muitas alegrias, inspirou um filme que concorreu ao Oscar e rendeu algum dinheiro para sobreviver quando cheguei ao Brasil”, recorda.

EXÍLIO

O mineiro Gabeira trabalhava no Jornal do Brasil quando participou, em 1969, do sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick, trocado por 15 presos políticos que partiram para o exílio. Preso, Gabeira deixou a cadeia rumo à Europa depois de ser trocado por outro diplomata, o alemão Ehreinfried Von Hollenben. Só voltou ao país em 1979, com a decretação da anistia.

Em 1997, quando o filme O que é isso, companheiro? foi lançado, reacendeu-se o interesse pelo tema, lembra ele. Dirigido por Bruno Barreto, o longa representou o país no Oscar. “Isso contribuiu para que mais pessoas, inclusive fora do Brasil, tivessem uma ideia do que se passou”, destaca.

Para Gabeira, a produção literária sobre o período poderia ser maior. “A ideia era de que a censura impedia a publicação de obras e, acabada a ditadura, muitos livros surgiriam. Mas o clima de falta de liberdade acabou contribuindo para que não saíssem das gavetas tantas obras assim, embora já se tenha escrito muito sobre o próprio período ditatorial”.

Cid Benjamin, um dos companheiros de Gabeira no sequestro do embaixador americano, vem hoje a Belo Horizonte fazer palestra na PUC Minas. Benjamin publicou recentemente o livro Gracias a la vida (José Olympio), que traz o relato de suas experiência como um dos líderes do Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8).

Além de relembrar os anos de chumbo, o autor faz um balanço de sua trajetória política. Depois de intensa militância no PT, Cid se filiou ao PSOL com críticas contundentes aos ex-companheiros que hoje estão no poder.

As atrizes Cláudia Abreu e Beth Lago, em Anos rebeldes, como a jovem Heloísa, que adere à luta armada, e a mãe, a socialite Natália (Viva/divulgação)
As atrizes Cláudia Abreu e Beth Lago, em Anos rebeldes, como a jovem Heloísa, que adere à luta armada, e a mãe, a socialite Natália



CONFIRA

50 ANOS DO GOLPE DE 64

Bate-papo com Cid Banjamin. Hoje, às 17h10. Prédio 13 da PUC Minas, Avenida Dom José Gaspar, 500, câmpus Coração Eucarístico. Entrada franca.

EM BUSCA DE IARA
Documentário de Flávio Frederico sobre a guerrilheira Iara Iavelberg.
12 anos. Hoje, às 19h. Cine 104 (Praça da Estação, 104, Centro).

LIVROS

A ditadura envergonhada, A ditadura escancarada, A ditadura derrotada e A ditadura encurralada
De Elio Gaspari
Editora Intrínseca, R$ 39,90
(cada volume)
• Lançados entre 2002 e 2004, os quatro volumes foram reeditados este ano. O trabalho de duas décadas do jornalista Elio Gaspari se baseou em acervo pessoal valioso, além de 25 caixas de documentos de Golbery do Couto e Silva, criador do Serviço Nacional de Informações (SNI).

Brasil nunca mais – um relato para a história
De Paulo Evaristo Arns e equipe
Vozes, R$ 65,70 e R$ 24,90
(edição de bolso)
• Lançado em 1985, traz o dossiê mais completo da tortura e dos torturadores que escreveram a página mais sombria dos 25 anos da ditadura civil-militar.

Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo
De Mário Magalhães
Cia. das Letras, R$ 60
• O jornalista escreveu a biografia completa do inimigo nº 1 dos militares: o comunista Carlos Marighella, líder da Ação Libertadora Nacional (ALN) e guerrilheiro de fama mundial.

Combate nas trevas
De Jacob Gorender
Ática, esgotado (disponível em sebos, custa cerca de R$ 100)
• Escrito pelo historiador comunista, o livro publicado em 1987 foi o primeiro a mapear as organizações de esquerda e o lado sombrio da repressão. Uma referência para quem pretende compreender o período, de autoria do intelectual que atuou no combate à ditadura.

O que é isso, companheiro?
De Fernando Gabeira
Cia. das Letras, R$ 23 (edição de bolso)
• Gabeira foi o primeiro a escrever sobre detalhes da guerrilha urbana, ao narrar sua participação no sequestro do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick, em 1969. O sucesso do livro, lançado em 1979, foi fundamental para a carreira política do ex-guerrilheiro, que se tornou deputado federal e disputou o governo fluminense e a Prefeitura do Rio de Janeiro.

1968: o ano que não terminou

De Zuenir Ventura
Objetiva, R$ 49,90
• O jornalista consegue capturar o espírito da época e conduz o leitor para o contexto do ano fundamental para a história do Brasil e do mundo. Em dezembro de 1968, foi decretado o AI-5, que iniciou os anos de chumbo.

Gracias a la vida – memórias de um militante
 De Cid Benjamin
José Olympio, R$ 35
• Pode ser lido como uma antítese à obra de Gabeira – ambos eram militantes do MR-8. Cid foi um dos mentores do sequestro do embaixador norte-americano, mas, diferentemente de Gabeira, sempre se posicionou à esquerda até romper com o PT e se
filiar ao PSOL.

Memórias de uma guerra suja
De Rogério Medeiros e Marcelo Netto
Topbooks, R$ 43,90
• O depoimento de Cláudio Guerra, ex-delegado do Departamento de Ordem Político-Social (Dops) no Espírito Santo, traz detalhes das barbaridades cometidas pelas forças de repressão.

Brasil: História indiscreta da ditadura e da abertura
De Ronaldo Costa Couto
Record, R$ 50
• Secretário no governo Tancredo Neves e historiador, o mineiro analisa as causas que levaram o Brasil à ditadura militar. Escrito a partir de tese de doutorado defendida na Sorbonne, o livro dá a palavra a militares e civis, à esquerda
e à direita.

Almanaque 1964
De Ana Maria Bahiana
Cia.das Letras, R$ 54,50
• Leitura leve, em estilo almanaque pop. Em vez de armas e conspirações, a jornalista fala de Nara Leão, Bob Dylan, Glauber Rocha e Rolling Stones, entre outros artistas que deram o tom à vida cultural dos anos 1960

FILMES E MINISSÉRIE


O que é isso, companheiro? (1997) – De Bruno Barreto
• O maior sucesso entre os longas que tratam do período. Baseado no livro de Fernando Gabeira, concorreu ao Oscar de filme estrangeiro e é focado no episódio do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick.

Batismo de sangue (2007) – De Helvécio Ratton
• Baseado no livro homônimo de Frei Betto, lançado em 1983. Aborda a ação dos dominicanos em apoio à Ação Libertadora Nacional (ALN) e a crueldade da tortura. Um dos frades, Tito, suicidou-se em decorrência dos maus tratos infligidos pelo delegado Sérgio Fleury.

Cabra marcado para morrer (1984) – De Eduardo Coutinho
• O documentário sobre a vida da família do camponês João Pedro Teixeira, assassinado por capangas de latifundiários em 1962, foi interrompido com o golpe em 1964. Retomado em 1981, depois de Coutinho ter escondido os negativos da repressão, o longa é um símbolo dos anos de chumbo e da volta da democracia.

Zuzu Angel (2006) – De Sérgio Resende
• Traz a história da estilista mineira que enfrentou os militares para exigir o corpo do filho, o militante Stuart Angel. Zuzu denunciou a ditadura nos EUA e morreu em acidente de carro atribuído a agentes da repressão.

Pra frente, Brasil (1982) – De Roberto Farias
• Um dos primeiros longas sobre o tema, foi rodado ainda na ditadura, graças ao processo de abertura política. A trama de ficção retrata a repressão e o clima de euforia com a conquista da Copa do Mundo de 1970, no México. O filme levou à demissão do então presidente da Embrafilme, Celso Amorim, atual ministro da Defesa.

O ano em que meus pais saíram de férias (2006) – De Cao Hamburguer
• Outra ficção sobre os anos de chumbo, a tortura e a Copa de 1970. Protegido pela comunidade judia, criança aguarda a volta dos pais, presos pela repressão.

Anos rebeldes (1992) – Minissérie da TV Globo
• Uma das obras de maior sucesso sobre os anos 1960/1970, a minissérie em 20 capítulos tinha como pano de fundo um caso de amor e abordava a opção de jovens pela luta política e a clandestinidade. Influenciou fortemente o movimento dos caras pintadas, que foi às ruas pedir o impeachment do presidente Fernando Collor.

Jango (1984) – De Silvio Tendler
• Documentário essencial para entender a trajetória do presidente gaúcho deposto pelos militares. Com trilha sonora
de Milton Nascimento e Wagner Tiso,
o filme levou meio milhão de espectadores ao cinema.

Que bom te ver viva (1989) – De Lucia Murat
• Militante de esquerda, a diretora foi torturada e sua obra é marcada por essa experiência. O documentário traz depoimentos de oito mulheres que optaram pela luta armada. A atriz Irene Ravache é uma espécie de alter ego de Lucia Murat.

Em busca de Iara (2013)
– De Flávio Frederico
• Mariana Pamplona, sobrinha da militante Iara Iavelberg, é autora do roteiro e fez as entrevistas sobre a trajetória da guerrilheira e companheira de Carlos Lamarca, ícone da esquerda. O filme mostra que Iara foi assassinada – ela não se suicidou, como concluíram inquéritos oficiais.

SAÚDE » Novo surto de ebola assombra a África‏

SAÚDE » Novo surto de ebola assombra a África OMS confirma 78 mortes na Guiné e quatro na Libéria. Há pacientes sob suspeita em Serra Leoa. Doença é grave, sem vacina ou tratamento 
 
Gabriela Walker
Estado de Minas: 01/04/2014

Equipe da organização Médicos Sem Fronteiras examina paciente em Gueckedou, na Guiné: última epidemia na África ocorreu em 2012 (Médicos Sem Fronteiras/AFP)
Equipe da organização Médicos Sem Fronteiras examina paciente em Gueckedou, na Guiné: última epidemia na África ocorreu em 2012

A confirmação de novos casos de infecção pelo vírus ebola aumentou a preocupação de que o surto se alastre pelo continente africano. Depois de 78 mortes decorrentes da doença na Guiné, principal foco do vírus nos últimos meses, quatro óbitos foram reconhecidos na Libéria e casos suspeitos são monitorados em Serra Leoa, ambos na fronteira sul do país. Ontem, a organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) classificou a situação no oeste africano como uma “epidemia de amplitude jamais vista”. Ao mesmo tempo, representantes da Organização Mundial da Saúde (OMS) tentavam evitar o pânico, alertando que “não há necessidade de aumentar algo que já é ruim o suficiente”, conforme defendeu pelo Twitter um representante da agência das Nações Unidas.

“Estamos enfrentando uma epidemia de magnitude jamais vista em termos de distribuição de casos no país: Gueckedou, Macenta, Kissidougou, Nzerekore e, agora, Conacri (a capital)”, alertou Mariano Lugli, coordenador do MSF. Por sua vez, o porta-voz da OMS, Tarik Jasarevic, que está no país desde a semana passada, assinalou que a preferência pelo termo surto, em vez de epidemia, se justifica pelo estágio inicial dos registros. “Em francês, língua que falamos aqui, diz-se ‘épidémie’ porque não há outro termo equivalente, mas preferirmos nos referir à situação como surto por ainda estar no começo”, explicou ao Estado de Minas.

Desde janeiro, a Guiné enfrenta uma proliferação da febre hemorrágica causada pelo ebola. Em seu último balanço, o Ministério da Saúde do país atesta que 22 óbitos em decorrência do vírus estão confirmados em laboratórios. Há 44 pessoas sob monitoramento. Na Libéria, além das quatro mortes, há três casos de infecção pelo vírus confirmados e outros sob investigação, segundo a OMS. Nenhuma vítima teve a doença diagnosticada em Serra Leoa – aguarda-se o resultado de exames em cinco pacientes.

Diante da situação, o governo do Senegal, ao norte da Guiné, fechou as fronteiras com o vizinho. A Mauritânia decidiu restringir o comércio com os países afetados. A empresa aérea Gambia Bird, que deveria começar a atuar na Guiné no último fim de semana, adiou o início das operações por causa do surto. Em comunicado, a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental destacou que a doença é uma séria ameaça à segurança na região.

Agressivo e letal Especialistas que atuam na região identificaram o vírus responsável pelo surto atual como “do tipo Zaire”, uma das cinco espécies da família dos filoviruses que causam o ebola. “Esse é o (vírus) mais agressivo e letal”, alertou o epidemiologista Michel Van Herp, ligado à MSF, em um comunicado da organização. Tem um índice de mortalidade de mais de 90%, assinala Van Herp. Segundo a ONG, mais de 40 toneladas de equipamentos foram enviadas à Guiné para tentar conter o avanço da doença.

Acredita-se que o ebola, descoberto em 1976, seja transmitido por morcegos. O vírus se espalha quando pessoas saudáveis entram em contato com fluidos corporais de indivíduos infectados, como sangue, suor ou leite materno. Depois de um período de incubação entre dois e 21 dias, os pacientes passam a ter febre alta, dor muscular, conjuntivite, vômitos e fraqueza. Sangramentos pela urina e pelas narinas também são comuns. Além da facilidade de transmissão, o vírus provoca uma alta taxa de mortalidade – entre 25% e 90% dos infectados. Desde o primeiro registro, cerca de 2,2 mil casos foram confirmados. Desses, 1,5 mil não resistiram às complicações da infeção.

Apesar disso, os surtos são considerados raros. A última epidemia foi registrada em 2012, quando centenas adoeceram em Uganda e na República Democrática do Congo (RDC). Segundo a MSF, outras “certamente passaram despercebidas por ocorrerem em áreas onde as pessoas não têm acesso a tratamentos de saúde”, o que impossibilita a confirmação de todos os casos. O ebola é classificado como um dos vírus mais contagiosos e mortais entre os humanos, segundo a OMS, e não existe nenhum tipo de tratamento ou de vacina específicos para a doença.

A partir da confirmação de um primeiro caso, todas as pessoas que tiveram contato com a vítima precisam ser isoladas e monitoradas. Médicos, enfermeiros e auxiliares que atendem pessoas infectadas devem usar roupas isolantes, luvas, máscaras e óculos de proteção, o que, muitas vezes, não ocorre em comunidades pobres e afastadas. Segundo organizações de saúde, a orientação da população é uma peça-chave para evitar novas vítimas.

O presidente da Guiné, Alpha Condé, fez um pronunciamento à nação anteontem, para tranquilizar a população e orientá-la a seguir medidas de precaução, como manutenção da higiene pessoal e distanciamento dos infectados. “Meu governo e eu estamos muito preocupados com essa epidemia”, disse Condé, acrescentando: “Peço às pessoas para que não entrem em pânico nem acreditem nos rumores que estão alimentando o medo”. Segundo Tarik Jasarevic, da OMS, apesar do clima de apreensão, os guineanos estão tranquilos e recebem informações diárias sobre como proceder. 

Aquecimento trará a fome - Paloma Oliveto

Se a temperatura global subir de 2 a 4 graus, a produção de alimentos afetará principalmente países mais pobres. Enfermidades e conflitos por terra e água aumentarão, e eventos extremos serão mais comuns no Brasil


Paloma Oliveto
Estado de Minas: 01/04/2014


Brasília – Um planeta mais faminto e doente. A falta de alimentos, a desnutrição e as moléstias infecciosas fazem parte do pacote de desafios que o mundo precisará enfrentar face a um aumento de temperatura de 2 graus a 4 graus em relação aos índices pré-industriais até o fim do século. Com a intensificação da radiação solar, o derretimento das geleiras e as alterações nos ciclos de precipitações e estiagem – já conhecidos problemas associados às mudanças climáticas –, entre outros, a produção alimentar será fortemente afetada. Os mais prejudicados serão os mais pobres, de acordo com o segundo volume do quinto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) das Nações Unidas.

O documento, divulgado em Yokohama, no Japão, traçou um cenário de ameaças ambientais das quais nenhuma região do planeta – nem os países ricos – escapará. No Brasil, a previsão é de mais chuvas e alagamentos em localidades que já sofrem com o excesso de precipitações e deslizamentos: o Sudeste. No Nordeste, o semiárido continuará castigado pela seca, que deverá se agravar. Poluição, desmatamento, destruição de recifes e acidificação no litoral são outras consequências do aumento da temperatura e da emissão dos gases de efeito estufa, citados no relatório. Os dados sobre o país serão detalhados hoje em uma coletiva de imprensa no Rio de Janeiro.

No informe Mudanças climáticas 2014: impactos, adaptação e vulnerabilidade, um grupo de 745 autores principais e colaboradores de 70 países, incluindo o Brasil, avaliou mais de 12 mil publicações científicas e 50 mil revisões técnicas sobre as alterações do clima no planeta. Ele faz parte de uma síntese que será divulgada em outubro, um mês antes da realização da COP-20, conferência mundial sobre o clima, que ocorrerá no Peru. O último relatório do IPCC, de 2007, serviu de instrumento para a convocação da cúpula de Copenhague, por apresentar dados preocupantes sobre o futuro global.

Os cientistas que confeccionaram o volume dois do relatório atual destacaram que o homem não terá de esperar até 2100 para sentir na pele os efeitos das mudanças climáticas. Elas já estão ocorrendo, alertaram. Além disso, o documento ressalta a participação antropogênica no aquecimento da Terra. Desde o surgimento do planeta, há períodos de resfriamento e aumento de temperatura, desencadeados por fatores naturais. Contudo, o mundo jamais esquentou tão rapidamente quanto a partir de 1900, quando as atividades industriais começaram a se disseminar. Por isso, para os autores do relatório, não há dúvidas de que, agora, é o homem que está à frente dessas mudanças.

Insegurança “O aumento da temperatura faz crescer a probabilidade de impactos severos, generalizados e irreversíveis em todo o mundo”, alerta o segundo volume da quinta edição do informe. Entre eles, está a insegurança alimentar e social. Embora nenhuma região escape dos efeitos do clima, são os países pobres e em desenvolvimento que pagarão o preço mais alto.

As pequenas ilhas do Pacífico, o sudeste asiático e as Américas do Sul e Central terão de enfrentar falta de água no semiárido, queda de produção de alimentos e propagação de doenças transmitidas por mosquitos. Embora estudos indiquem que o aumento da temperatura estimula o crescimento de grãos, a qualidade das culturas decai por causa da radiação solar intensa. A seca e as inundações também impactam sobre as áreas de agricultura e pecuária. “Sob alguns cenários, as mudanças climáticas poderiam levar a dramáticas quedas na produção global de trigo e de milho”, observa Maggie Opondo, geógrafa da Universidade de Nairóbi que participou da confecção do documento.

“Infelizmente, estamos em uma era na qual as mudanças climáticas não são um tipo de futuro hipotético. Elas já estão acontecendo. Eventos climáticos extremos serão um desafio severo para algumas das comunidades mais pobres do mundo”, disse, à Agência France-Presse, Chris Field, principal autor do relatório e vice-presidente do IPCC. Maggie Opondo observa que, em algumas partes do globo, a revolução verde já atingiu o platô. Nessas condições, torna-se ainda mais difícil imaginar como sustentar uma população cada vez maior.

Os grãos não são o único alimento a escassear. Em alguns locais dos trópicos, acredita-se que a pesca encolherá de 40% a 60%. “As mudanças climáticas levarão a um aumento nos preços dos alimentos, desencadeando instabilidade política. Isso, aliás, já vem ocorrendo. Tome como exemplo os motins que explodiram na Ásia e na África depois do choque do mercado de alimentos em 2008”, lembra David Lobeel, professor da Universidade de Stanford e um dos autores do capítulo sobre segurança alimentar.

“As mudanças climáticas tendem a atuar como multiplicadoras de ameaças sociais”, observou Chris Field. Competições pelo monopólio de água e comida, migrações de populações afetadas por enchentes e secas, fome e doenças são citadas por ele como fatores que podem desencadear conflitos regionais. “Há muitas coisas que fragilizam as pessoas, e quando você combina um choque climático com esses fatores, os resultados podem ser ruins”, alertou.

O professor da Faculdade de Negócios de Copenhague Bjørn Lomborg, autor do livro O ambientalista cético, diz que está tranquilo com a publicação do IPCC. Crítico da comunidade científica, a quem acusa de superestimar cenários nos modelos climáticos, Lomborg acha que o aumento de 1 grau registrado ao longo dos últimos 100 anos é pouco. “Não nego que a temperatura está aumentando, mas acho que é tão pouco – nos últimos 20 anos não houve quase aumento nenhum – que não podemos considerar que há um aquecimento global”, argumenta.

Não é, contudo, o que mostram os mais de 12 mil artigos escritos por cientistas climáticos, utilizados como base de confecção do relatório do IPCC. O volume de literatura científica sobre os efeitos das mudanças climáticas, inclusive, dobrou, comparado à última edição da publicação. Com isso, cresceu também o corpo de evidências de um futuro marcado por ameaças à vida. Embora o processo de aquecimento tenha sido tachado de irreversível pelo documento, os autores citam medidas para serem aplicadas de imediato, as quais podem minimizar os efeitos da temperatura mais quente. Entre elas, reduzir o desperdício de água, ampliar as áreas verdes nas cidades e proibir assentamentos humanos em zonas de alto risco.

Por que as pessoas mentem?‏

Por que as pessoas mentem? 
 
Getúlio Chaves
Analista comportamental e professor de eneagrama
Estado de Minas: 01/04/2014

A mentira é uma afirmação que omite, desvirtua, descaracteriza ou nega uma verdade e, geralmente, é usada como meio de fuga das consequências que uma verdade traria. Para algumas pessoas, torna-se um hábito que, com o passar do tempo, leva à descredibilidade. A Universidade de Amsterdã constatou que nem todos mentem, e que boa parte dos indivíduos consegue ser sincero o tempo todo, em pesquisa realizada com 527 pessoas. Conforme o estudo, 41% dos participantes afirmaram que não contaram nenhuma mentira nas últimas 24 horas; 51% revelaram que proferiram de uma a cinco inverdades no mesmo intervalo de tempo e 8% mentiram seis vezes ou mais.

Apesar dos dados, é muito difícil encontrarmos pessoas que não mentem, pois a ocorrência da mentira pode não ser percebida conscientemente, como acontece com pessoas que gostam de elogiar os outros, mesmo quando o reconhecimento não tem fundamento. Por outro lado, podemos localizar pessoas que, por meio do autoconhecimento, aumentaram sua resistência e a capacidade de administrar situações complicadas. Isso faz com que tenham uma atitude positiva e enfrentem momentos embaraçosos com determinação, porque sabem que o atalho oferecido pela mentira não é duradouro nem, muito menos, útil. Essas pessoas utilizam para a vida a metáfora que diz que a “mentira tem perna curta”, sendo estimuladas a seguir o caminho da sinceridade.

As pessoas descomprometidas com os outros e com suas tarefas tendem a mentir mais, pois estão sempre em busca de justificativas para suas atitudes inadequadas, de fato buscando alcançar o sucesso e, até mesmo, procurando manipular os outros, seja no meio profissional ou social.

Todos são capazes de mentir, mas, segundo a filosofia do eneagrama, algumas personalidades têm mais dificuldade em proferir inverdades que outras. O eneatipo 1, por exemplo, é definido como o organizado, disciplinado e responsável. As pessoas com essa personalidade são perfeccionistas e reprimem seus impulsos e desejos para manter uma postura que consideram ideal. O tipo 1 pode até mentir, mas não sabe permanecer no erro, pois suas atitudes, ações e os “efeitos colaterais” da mentira como nervosismo, transpiração excessiva, gagueira e rubor o entregam.

Diferentemente do eneatipo 1, os eneatipos 3 e 7 têm mais facilidade. As pessoas do tipo 3 estão sempre em busca do sucesso profissional e, por isso, muitas vezes, mentem, até mesmo inconscientemente, para criar uma imagem falsa e conseguir a admiração dos outros. Já pessoas com a personalidade de número 7 são consideradas divertidas e irresponsáveis, pois tendem a dispersar facilmente e estar sempre em busca de opções mais prazerosas em tudo o que faz. Agindo assim, esse eneatipo perde seu foco e, às vezes, seu comprometimento e vínculos com as tarefas e pessoas do cotidiano. As pessoas assim mentem, mas não para se vangloriar e conquistar a admiração alheia, e, sim, porque acreditam que sua imaginação e ilusões fazem parte da realidade.

Não é fácil reconhecer que a mentira está presente na atitude humana. Muitos se autointitulam sinceros, afirmando que não mentem ou não gostam de inverdades. Contudo, quando reconhecemos que temos o impulso de mentir e percebemos que essa não é a melhor forma de lidarmos com nossos medos e receios, é mais fácil promover uma mudança interna. Enfim, podemos optar por sermos mais corajosos e ousados, a ponto de modificarmos e desmascararmos nossos fantasmas. A transformação não acontece instantaneamente, mas de forma gradual, no cotidiano. Pode ser difícil; entretanto, não é impossível.