quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Na dúvida, não ultrapasse - MARTHA MEDEIROS

ZERO HORA - 08/01/2014

Basta alguém mencionar a expressão “on the road” para nos seduzir. Cair na estrada? Nem é preciso chamar duas vezes, convite aceito. Lá vamos nós de mochila, boné e óculos escuros, em boa companhia, escutando música vibrante e com um enorme mapa nas mãos – sim, de papel, nada de GPS e aplicativos, onde fica o romantismo das velhas aventuras?

Sempre fui fascinada por estradas. As que atravessam cordilheiras, as que cruzam desertos, as que se avizinham de plantações, as que costeiam o mar, as que passam em meio a pequenos vilarejos, as de terra, as asfaltadas, as estreitas, as desafiadoras, as que parecem que vão dar em lugar nenhum – mas sempre dão.

Estrada é movimento, liberdade, beleza, poesia. Sem falar no erotismo que ela insinua – não sei se por causa das curvas ou do quê.

Estamos na temporada mais festejada do ano: sol, praia, férias, e elas, as estradas. Mas corta! Onde estão o cenário, as cenas de filme, o charme? Estamos falando de BR-101, BR-116, RS-040 e demais vias lotadas de veranistas afoitos e caminhoneiros cansados, de carros velozes e de outros que já deveriam ter sido aposentados, de gente que corre demais e que, na dúvida, aí mesmo é que ultrapassa. Dã.

Lembro de escutar uma história sobre um cara que, ao ver um carro se aproximando na pista contrária bem no momento em que ele estava ultrapassando, em vez de recuar, acelerava ainda mais, enquanto berrava para quem vinha: “Vai se ferrar, vai se ferrar!!” (o verbo não era exatamente ferrar).

Muito engraçado. Mas eu não gostaria de pegar uma carona nessa piada.

Não importa quem é o imprudente, se o motorista de lá ou de cá, se quem vem ou quem vai, se quem é defensivo ou agressivo: basta um deslize e todos se ferram. Todos. Um pneu que estoura de repente, um irresponsável que bebeu antes de dirigir, um alucinado que pisa fundo para homenagear o Schumacher, um impulsivo que toma decisões sem pensar, um ansioso que não tolera perder 10 minutos e segue pelo acostamento, um que acredita que os outros motoristas têm bola de cristal e por isso não vê necessidade de acionar o pisca-pisca, outro que mal distingue se o carro que está 50 metros à frente está indo ou vindo.

Estrada é movimento, liberdade, beleza e poesia – mas quando vazia, quando estamos em locais onde a sinalização é espetacular e o asfalto parece um tapete, quando não há pressa em chegar, quando não há fluxo intenso, quando não prevalece a cultura da superpotência em quatro rodas, quando estamos a passeio, e não armados para uma guerra. Não na temporada de férias num país onde a imprudência ganha as manchetes dos jornais toda segunda-feira de manhã, depois das ultrapassagens arriscadas do final de semana.

Pegar a estrada é eletrizante, com certeza. Mas, motoristas, duvidem mais. 

FERNANDO BRANT » Sem fuso e confuso‏

FERNANDO BRANT » Sem fuso e confuso 

Estado de Minas: 08/01/2014






O mês de janeiro guardo para ficar quieto na cidade, gozar do trânsito livre nas ruas e, de preferência, não fazer nem programar nada. É o tempo da preguiça. Mesmo aquelas coisas prazerosas que costumo desfrutar – arte, amizade e um pouco de bebida – reservo para horas tardias do dia. Isento-me de compromissos e fico de olho na rede de balançar. Agora que o sol voltou aos céus mineiros, retomo o hábito de caminhar na piscina ouvindo a música que escolhi. Andar dentro d’água é um dos meus esportes favoritos, que o trabalho e as viagens afastaram do meu cotidiano. Fiquei desacostumado, mas essa é uma intenção para o ano que se inicia e pretendo segui-la fielmente. Sei o quanto é bom para a mente e o físico.

Estou lá, andando n’água, e me vejo observado, diria que guardado, por um belíssimo bem-te-vi. Evito movimentos bruscos para não assustá-lo e ele se posta diante de mim durante alguns minutos. Como chegou, vai-se, mas, antes, bica de leve o líquido da piscina. Seu imponente peitoral amarelo me faz crer que a vitória será nossa na Copa. Não tendo hora para dormir, não há hora para acordar. Nem para tomar o café da manhã, almoçar. O calendário, olho às vezes por causa dos impostos a pagar em todo início do ano. Mas o relógio da casa, pois de pulso nunca tive na vida, fica lá no canto, inobservado. A casa está em ordem em pleno 2014, mas os habitantes não querem ser regulados. Deu fome, come. Deu sono, dorme.

Acontece que, por ter descansado muito, procuro na madrugada algo para fazer antes de Morfeu me chamar. A televisão não ajuda muito, pois o controle passeia pelos canais e geralmente não encontro programa interessante. Existem as exceções. O canal de arte, mas que se repete muito. Os canais jornalísticos, também sempre girando sobre o mesmo. Na última noite, a surpresa: um bom programa sobre filmes publicitários. Conversa de gente inteligente, mas cheia de si. Um mar de egos. Pude rever trabalhos que marcaram época no desenvolvimento da criação publicitária do país. No meio da seleção, a curiosidade de ver um filme antigo de Fernando Meirelles para uma marca de sapatos copiado quase integralmente pela campanha de um banco que vem sendo exibida atualmente.

Foi divertido assistir ao elenco com gente de talento, todos, no fundo, considerando-se gênios. Valeu por eles e suas criações de alta qualidade. O que me fez lembrar, na confusão das horas, do tempo remoto em que, por necessidade, trabalhei em agência de publicidade. Nunca gostei de vender sabonete e nem máquina de lavar. Ficava incomodado em ter de criar frases belas para vender objetos e ações em que não acreditava. Pulei fora rapidamente. Desde então, tenho certa desconfiança da profissão. Principalmente dos marqueteiros da política, pois, mesmo que, individualmente, não compremos o seu produto, se muitos o fizerem vamos todos para o brejo.


>>  www.fernandobrant@hotmail.com

Frei Betto - Ano de mudanças‏

Ano de mudanças 

Temos tudo para fazer de 2014 um novo ano feliz para a maioria dos brasileiros. Vai depender de nossa capacidade de mudar
Frei Betto

Estado de Minas: 08/01/2014


Eis um ano novo de muitas expectativas. A primeira, evitar a volta da inflação. Felizmente não há nenhum indício de que veremos o mesmo filme dos últimos meses do governo Sarney, quando a inflação chegou à casa de 80% ao mês. O grave é que a especulação acelera, a produção e as exportações caem, o crescimento do PIB diminui, as privatizações se multiplicam, as desigualdades sociais se acentuam.

 É o ano de comemoração (= fazer memória) dos 50 anos do golpe que derrubou um governo constitucionalmente eleito e instalou a ditadura militar, sem que o paradeiro dos desaparecidos políticos tenha sido esclarecido, nem punidos aqueles que torturaram, assassinaram, sequestraram em nome e sob a cobertura do Estado, em especial das Forças Armadas.

 Na falta de mais pão, teremos circo: a Copa do Mundo. O Brasil entra manco, sem garra, com um time estressado pela obrigação de fazer dinheiro. Acabou o futebol arte, os efeitos de Didi, os dribles de Tostão, os avanços de Vavá, os gols de Pelé e o balé de Garrincha. Tudo indica que a nossa Seleção vai bater o ponto como boa anfitriã e sair de crista baixa, salvo um milagre, uma zebra que comprove que, em matéria de futebol, Deus também é brasileiro.

 Enfim, este é o ano de passarmos o Brasil a limpo. No dia 5 de outubro, cada eleitor irá às urnas escolher 7 novos servidores públicos: 1 deputado estadual, 1 federal, 1 senador, governador e vice, presidente e vice. Eis a chance de extirpar das assembleias legislativas os deputados de bicheiros e de cart[eis, mais interessados em multiplicar o próprio salário que servir à população carente.

 Em Brasília, poderemos passar uma vassoura geral, mandando para o lixo da história deputados e senadores com muitos anos de mandato e pouco serviço, corrompidos por empreiteiras e oligopólios, sem nenhuma visão do que seja cidadania e democracia. Dos governos estaduais os eleitores deverão aposentar as velhas raposas que sofrem de pleonexia – o apetite insaciável de poder, segundo Platão, que entendia de política e de políticos.

 O quadro da sucessão presidencial ainda não está definido, mas eis a hora de evitarmos que o Brasil volte a ser colônia dos EUA, que o salário mínimo seja deteriorado e os programas sociais, que têm tirado milhões da miséria, sejam engavetados em nome da redução de gastos públicos. É melhor um governo que seja mãe dos pobres e pai dos ricos do que um que trate os pobres como madrasta malvada e os ricos como bebês de colo, que precisam de toda atenção e cuidados.

 As eleições de outubro deverão confirmar o aperfeiçoamento da democracia, a valorização da cidadania e, sobretudo, a política como resposta às urgentes demandas sociais, como melhoria da educação, da saúde e do transporte público. Um governo que ouse fazer reforma agrária, promover a desconcentração da renda e redimensionar a dívida pública. Um governo que convoque uma Constituinte exclusiva para a reforma política e faça cessar o desmatamento da Amazônia. Um governo que abra os arquivos da ditadura em mãos das Forças Armadas e reduza a desigualdade social. Sem isso o Brasil terá como futuro imediato o aumento da violência e da miséria.

Temos tudo para fazer de 2014 um novo ano feliz para a maioria do povo brasileiro. Vai depender de nossa capacidade de mudar o que de ruim insiste em perdurar, renovar o que de antipopular teima em se repetir e apoiar o que de bom significa transformar.

TeVê



TV PAGA » Temporada de verão

Estado de Minas: 08/01/2014



 (Bruno Poppe/Divulgação )


Numa semana agitada, com a estreia de sua programação de verão, o canal GNT reservou para hoje mais duas novidades. Às 20h30, Alta temporada vai acompanhar gente que sabe aproveitar estes dias de calor, como a animadora de um resort que transformou sua alegria em profissão e um executivo que trocou a gravata por uma pousada em Pipa, no Rio Grande do Norte. Mas a grande aposta do dia é Amor veríssimo, série com 13 episódios que vai contar histórias engraçadas de casais modernos, sempre na faixa das 22h30 No elenco (foto), Luana Piovani (em participação especial), Marcelo Faria, Gabriela Duarte, Pedro Monteiro, Fernanda Paes Leme, Letícia Colin e Paulo Tiefenthaler.

Canal Max estreia hoje
minissérie de suspense


Novidade também no canal Max, com a estreia da minissérie A espiral, às 22h. Serão cinco episódios, narrando uma trama cheia de suspense, tendo como protagonista o artista de rua Arturo, que é conhecido por sua arte política e que idealiza um projeto muito mais ambicioso: com a ajuda de outros artistas, ele planeja roubar seis obras-primas.

Caçadores de relíquias
garimpam ouro no lixo

Mike Wolfe e Frank Fritz retornam ao canal History com três episódios inéditos de Caçadores de relíquias exibidos em sequência, a partir das 21h. Para quem não conhece o programa, Mike é professor de história e Frank arqueólogo. Eles percorrem os Estados Unidos em busca de objetos de valor abandonados em galpões, estábulos, garagens e lixões.

Está difícil distinguir
meninos de meninas

No NatGeo, o destaque de hoje é Histórias extraordinárias, às 20h. O episódio “Hermafrodita” vai mostrar que a intersexualidade não é  incomum, mas apenas algo de que não se fala muito. Acredita-se que uma em cada 2 mil crianças nasça com genitais tão ambíguos que os médicos não podem afirmar com facilidade seu gênero.

Cinema brasileiro será
sempre uma boa opção


Dirigido por Marcelo Gomes e Karim Aïnouz, o longa-metragem Viajo porque preciso, volto porque te amo já foi exibido pelo Canal Brasil, mas hoje estreia no Arte 1, às 22h30. O filme conta a história de um geólogo que atravessa o sertão nordestino para avaliar o percurso de um canal que será construído na região, fazendo uma reflexão sobre as próprias sensações de vazio e abandono. Em tempo: por falar em Canal Brasil, O último chocolate é a atração de hoje da sessão Histórias curtas, às 18h45, e às 22h é a vez do longa Corpos celestes.
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Ação, drama e humor
no pacotão de filmes

Na faixa das 22h, o assinante tem mais seis alternativas interessantes: João e Maria – Caçadores de bruxas, no Telecine Premium; Detona Ralph, no Telecine Pipoca; Bel Ami – O sedutor, no Telecine Touch; A mulher de preto, na HBO HD; O Besouro Verde, na HBO 2; e Mergulho radical, na MGM. Outras atrações da programação: Maridos e mulheres, às 21h, no Comedy Central; Uma lição de amor, às 21h55, no Glitz; Kick-Ass – Quebrando tudo, às 22h30, no Universal; e A supremacia Bourne, às 22h30, no FX.


CARAS & BOCAS » Novos guerreiros
Interino

 (Globo/Divulgação)

Os mineiros Alisson, Amanda e Letícia foram selecionados para o BBB 14
Os mineiros Alisson, Amanda e Letícia foram selecionados para o BBB 14

A Globo divulgou ontem nomes, idades, naturalidade, profissões e fotos dos 20 participantes selecionados para a 14ª edição do Big brother Brasil, que estreia dia 14. Entre eles, três mineiros: Alisson, de 27 anos, professor, de Contagem; Amanda, de 23, estudante de engenharia, de Divinópolis; e Letícia, de 27, bacharel em direito, de Belo Horizonte. A emissora explica que, desta vez, nenhum dos candidatos ao prêmio de R$ 1,5 milhão passará pela casa de vidro, todos entrarão juntos no confinamento. A maior novidade é a participação de Valdirene, personagem de Tatá Werneck na novela Amor à vida. Mas é bom avisar: a periguete não vai durar muito na casa, pois será eliminada logo no primeiro dia de programa por infringir algumas regras do jogo.

Val Delícia finalmente
vai ser capa de revista

Valdirene pode até não durar muito no BBB, mas vai realizar o sonho de ficar famosa em Amor à vida. Isso porque Val Delícia – esse é seu apelido na casa de vidro do programa – vai receber um convite para posar nua para uma revista masculina. Ela se acha uma estrela, só vai querer comida fina e destratar os fãs, mas tudo isso acabará atiçando o ciúme de Carlito (Anderson Di Rizzi). Resultado: ele volta com a enfermeira Raquel (Carol Rainato), com quem já havia se relacionado depois do primeiro fora que levou da periguete. Outro casal será formado na novela: Murilo (Emilio Orciollo Netto) e Ellen (Dani Vieira), ex-colegas de confinamento de Val Delícia.

Atriz Arlete Salles abre
o coração em entrevista

Arlete Salles é a convidada de hoje de Damas da TV, às 21h, no canal Viva (TV paga). “Vou terminar minha vida provavelmente, sozinha”, afirma, emocionada.
“O que permaneceu sempre ao meu lado, o meu porto seguro, e o que me faz viver, é minha profissão.”

Vale a pena ver de novo
o Gabi quase proibida

O SBT reprisa hoje a entrevista que Daniel Peixoto e Aretuza Lovi , ativistas do movimento GLTB, concederam a Marília Gabriela, no programa Gabi quase proibida, que vai ao ar à meia-noite.

Violência agora tem que
ser notificada pelo SUS

E por falar em GLTB, o programa Opinião Minas, apresentado por Técia Garcias, às 8h30, na Rede Minas, vai analisar em detalhes a lei federal que determina que o  Sistema Único de Saúde (SUS) faça a notificação de casos de violência contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais. O entrevistado do programa será Paulo Ceccarelli, pesquisador do Núcleo de Saúde e Paz da Faculdade de Medicina da UFMG.


Existe mesmo
a tal felicidade?

E Além do horizonte também começa a andar, desatando alguns nós de sua trama. Novos segredos começam a ser desvendados ainda esta semana. A novela tem sido considerada confusa e amargado baixa audiência entre as produções da Globo, e por isso os autores estão se virando para mudar os rumos da história, tornando-a mais atraente ao público. No centro das revelações estão Tereza (Carolina Ferraz) e seu comparsa Hermes (Alexandre Nero). E também LC (Antonio Calloni) terá que se explicar direitinho para a filha, Lili (Juliana Paiva).

viva

Boa a reprise de Os normais, pelo canal Viva (TV paga). No episódio de hoje, às 20h30, Rui (Luiz Fernando Guimarães) e Vani (Fernanda Torres) vão brigar por causa  de um livro!

vaia

O clima quente entre Celeste (Dira Paes) e Leandro (Cauã Reymond) não evitou o ritmo um tanto lento do primeiro capítulo de Amores roubados, que estreou segunda-feira, na Globo. 

Eduardo Almeida Reis-Vírgula‏

Vírgula 
 
Falta aos casamentos um botão de reinicialização quando enguiçam
Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 08/01/2014




Sou capaz de apostar que o leitor conhece de nome e de vista, por meio da tevê, o admirável líder Kim Jong-un, da Coreia do Norte, como também aposto que o caro e preclaro amigo, mesmo sabendo dela, nunca estudou a relação viriavunculocal do jovem Jong-un, filho de Kim Jong-il, que nos deixou em 28 de setembro de 2011. Quando tomei conhecimento da existência do adjetivo de dois gêneros viriavunculocal, tomei um susto com as últimas sete letras. Mais assustado ainda fiquei quando soube que significa o mesmo que avunculocal, também adjetivo de dois gêneros relativo a avunculocalidade, que, como todo mundo ignora, é o costume institucionalizado segundo o qual, após um matrimônio, os cônjuges vão morar com o tio materno, ou na mesma povoação. Kim Jong-un não apenas se recusou a morar com o tio como mandou matá-lo. Sua tia, ao que tudo indica, ficou muito satisfeita, porque deve ser duro aguentar os puns do segundo homem mais forte da República Democrática Popular da Coreia. Comunista adora a palavra “democrática”, tanto assim que a Alemanha comunista, criada em 1949, era a Deutsche Demokratische Republik. E dizer que dei com este venerando costado em viriavunculocal quando procurava no Houaiss a definição de vírgula: “sinal gráfico de pontuação ( , ) que indica pausa ligeira e é usado para separar frases encadeadas entre si ou elementos dentro de uma frase”. 

Pronto: deu a louca no Word 7 Ultimate, que começou a usar o sinal vírgula dobrado, o mesmo que aspas, embaixo da palavra que se quer aspear. Reinicializei e consertou. Falta aos casamentos um botão de reinicialização quando enguiçam, mas cuido da vírgula para dizer ao leitor que estou convencido de que o sinal gráfico tem vida própria. Andei relendo um livrinho que publiquei há quatro anos e descobri em cada página pelo menos 20 vírgulas que não me lembro de ter usado. Nem me lembro delas quando o livro saiu da gráfica. Portanto, só podem ter surgido depois que os exemplares foram parar nas estantes. É fenômeno que merece análise do pessoal que estuda essas coisas.

Números

Sentei-me diante do computador para escrever que, se pudesse, só compraria mantimentos na rede Gomes Supermercados, depois que Eugênio Ferraz, o diretor-geral da Imprensa Oficial de Minas Gerais, são-lourenciano de velha e boa cepa, me contou que o próprio Gomes vive comentando o que escrevo nesta coluna. São Lourenço é município sul-mineiro e o IBGE nos diz que o Brasil tem 5.561 municípios, 853 dos quais em Minas Gerais. Os 5.561 suscitam a seguinte pergunta: que interesse tem para o telespectador brasileiro e para a humanidade em geral a notícia de que o vereador Eduardo Soltur (PSD), o mais votado em Guarulhos (SP), e presidente da Câmara, estaria envolvido em contratos suspeitos da prefeitura com a Viação Transpérola, que estaria em nome da senhora Karina Celeste Moura? O ilustre homem público admite ser o pai de dois filhos da empresária Karina, mas a pergunta continua sendo: isso é notícia para telejornal de veiculação nacional? Se o pastor das toalhinhas inaugura um templo na Via Dutra, atrai 150 mil pessoas e os engarrafamentos impedem o acesso dos passageiros ao aeroporto de Cumbica, que fica em Guarulhos, tudo bem: é notícia. Como também é notícia o prédio em construção que desaba no Centro daquela cidade. Mas corrupção guarulhense? Notícia, no meu entendimento de philosopho, seria a de que, entre os 5.561 municípios brasileiros cinco ou seis não estão envolvidos em negócios escusos. Aí, sim, o fenômeno mereceria reportagem de veiculação nacional.

O mundo é uma bola

8 de janeiro de 1198: eleição do papa Inocêncio III, nascido Lottario dei Conti di Segni, de família nobre italiana. Inocêncio convocou o 4º Concílio de Latrão, o mais importante da Idade Média, de grande relevância em diversos campos teológicos. Foi contemporâneo de São Francisco de Assis e é conhecido por ter aprovado sua recente ordem religiosa, como também é lembrado por sua defesa do primado papal. É possível, como também é provável, que tenha inspirado o batismo de ilustre político nordestino, o médico Inocêncio de Oliveira (PR-PE). Em 1297, independência de Mônaco, só recentemente consolidada quando passou a residir no principado Carlos Eduardo dos Santos Galvão Bueno, amigo do nosso Jaeci Carvalho. Em 1805, a Colônia do Cabo, na África do Sul, torna-se colônia britânica, 208 anos antes do pranteado e interminável enterramento de Nelson Mandela. Em 1889, Herman Hollerith patenteou sua máquina de tabulação, que foi usada pela primeira vez para compilar os dados de um recenseamento. Os leitores menos jovens estão decerto lembrados que holerite, substantivo feminino, era sinônimo de contracheque no tempo de antigamente: documento que comprova o depósito dos vencimentos de um funcionário em sua conta bancária, ou que o habilita a receber na tesouraria. Em 1963, di-lo a Wikipédia, “é adoptada a bandeira do estado de Minas Gerais”, o que faz de 8 de janeiro um dia importante como evento vexilológico. Hoje é o Dia do Fotógrafo e da Fotografia.

Ruminanças

“O Brasil corre o risco de ficar obsoleto antes de ficar pronto” (Claude Lévi-Strauss, 1908–2009).

Coquetéis paliativos - Bruna Sensêve

Coquetéis paliativos 
 
Tratamento contra o HIV tem ação limitada no corpo. Uma das opções eficientes para combatê-lo é iniciar o uso de remédios o quanto antes. Medida entrou no SUS em 2013 
 
Bruna Sensêve
Estado de Minas: 08/01/2014


Funcionária da Fundação Ezequiel Dias mostra medicamento genérico para Aids e hepatites, que começou a ser produzido há quase três anos em BH (gladyston rodrigues/em/d.a press - 9/2/11)
Funcionária da Fundação Ezequiel Dias mostra medicamento genérico para Aids e hepatites, que começou a ser produzido há quase três anos em BH

Há 26 medicamentos antirretrovirais licenciados no mundo para o tratamento da infecção pelo HIV. O surgimento da terapia combinada com esses remédios, no fim da década de 1990, levou a reduções imediatas na mortalidade, que foram seguidas de uma série de medidas que ampliaram o acesso ao tratamento, como a disponibilidade de genéricos e o aumento da ajuda financeira internacional. Hoje, o Brasil ganha posição de destaque ao ser o primeiro país em desenvolvimento a fornecer tratamento público e gratuito a qualquer cidadão diagnosticado com infecção pelo vírus. O início imediato do uso de antirretrovirais é a principal forma de combate ao mal em pessoas que já têm o HIV instalado no organismo.

Segundo o diretor do Departamento de DST/Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Fábio Mesquita, na maioria dos países, a fim de que o tratamento com a terapia antirretroviral altamente ativa (Haart, em inglês) seja iniciado, é preciso obedecer um critério sobre a resposta imunológica do paciente. Para isso, é feito um teste de contagem de linfócitos T CD4 – células do sistema de defesa alvo do HIV. “Elas são uma espécie de general do exército de defesa. Com o ataque do vírus, é como se todos os glóbulos brancos estivessem preparados para a batalha, mas o general foi morto”, explica Mesquita. Por isso, o mecanismo de defesa do organismo não funciona. O antirretroviral recupera as células T CD4, impedindo que o paciente desenvolva infecções oportunistas, seja hospitalizado, entre outros agravos.

“Até então, só eram incluídos no tratamento público gratuito, via Sistema Único de Saúde (SUS), pacientes com a contagem de CD4 em 500 células/mm³ de sangue. A partir de agora, podemos incluir no tratamento todo mundo que é HIV positivo, independentemente do nível de CD4 ou de ter desenvolvido a Aids”, diz Mesquita. Isso porque foi provado que o medicamento mata também o vírus circulante, diminuindo a carga viral do paciente e, principalmente, de fluidos corporais como esperma, secreção vaginal e sangue, que transmitem o HIV. Com isso, além do tratamento ser altamente efetivo, pois derruba a carga a níveis indetectáveis se realizado já no começo da infecção, reduz substancialmente a capacidade de transmissão do soropositivo.

Perigosos reservatórios A carga viral se torna indetectável, mas não quer dizer que o tratamento possa ser interrompido ou que o paciente esteja curado da infecção. Os medicamentos atuam no sangue, que pode ser chamado de seção periférica do organismo. “O HIV está também no compartimento que didaticamente podemos chamar de central, localizado basicamente no tecido linfoide”, explica Artur Timmerman, infectologista do Hospital Israelita Albert Einstein. Os dois compartimentos estão associados e um dos maiores reservatórios de HIV do organismo está no tecido linfoide do trato gastrointestinal, onde o coquetel de antirretrovirais não atua.

“O coquetel age basicamente onde o vírus está se replicando ativamente. Nessa parte central, eles estão em estado latente. Não quer dizer que estão absolutamente sem se replicar, mas que fazem isso a uma velocidade muito menor do que o vírus periférico”, acrescenta Timmerman. Se o tratamento for interrompido numa situação em que, por exemplo, a carga viral está indetectável, as células em replicação latente são jogadas na corrente sanguínea, o processo é acelerado e a infecção volta com mais força. “Vira uma bola de neve. Ao fazer o exame uma semana depois, já existem muitas partículas virais no sangue, mostrando que não houve interferência do coquetel sobre esse compartimento central.”

Segundo o médico do Albert Einstein, alguns trabalhos mostram que se os antirretrovirais forem usados durante 50 anos, é possível que os reservatórios se esgotem e os pacientes fiquem curados. “Mas tomar um remédio desses por 50 anos com risco de efeitos colaterais sérios é complicado demais. Então, começaram a estudar a possibilidade de extirpar esse reservatório”, diz. A purge (purgar, em tradução livre) é uma estratégia ainda em teste, mas bem difundida. Propõe o uso de drogas que estimulem a capacidade replicativa do vírus latente, tornando possível o coquetel atuar sobre ele.

Bebê curado

Cientistas do Hospital Universitário Johns Hopkins (EUA) conseguiram, no primeiro semestre do ano passado, curar funcionalmente um bebê infectado pelo HIV. O feito único, porém, dependeu de circunstâncias extremamente particulares, como o diagnóstico da infecção menos de 24 horas após o nascimento da criança e o início do tratamento nas seis horas seguintes. Especialistas na área supõem que a intervenção imediata com antirretrovirais não permitiu que o vírus formasse reservatórios latentes. 

Palavra de especialista
Mário Schefer, professor do Departamento de Medicina Preventiva da USPAtendimento caótico

“Quanto mais pessoas conseguirem ter o diagnóstico, o acesso ao teste e ao tratamento, maior será o impacto na transmissibilidade do HIV, já que hoje há uma convergência entre o tratamento e a prevenção. Existe um avanço constante do tratamento com medicamentos cada vez mais potentes e com menos efeitos adversos. Essa evolução dá mais qualidade de vida para quem segue corretamente o tratamento, mas é ainda um avanço internacional. No Brasil, temos problemas que nos impedem de nos beneficiarmos dessas novas possibilidades. O SUS está sobrecarregado, com a qualidade e a capacidade de atendimento diminuídas. A política de tratamento para todas as pessoas diagnosticadas nos coloca de frente com uma rede caótica, que precisa urgentemente de uma política de readequação. Mesmo com o diagnóstico, a primeira consulta só acontece muito tempo depois. Isso é um grave sintoma desse problema.” 

EVOLUÇÃO » Ardi era mais humano que macaco, diz estudo‏

EVOLUÇÃO » Ardi era mais humano que macaco, diz estudo

Estado de Minas: 08/01/2014


Crânio do Ardipithecus ramidus analisado no estudo apresentou semelhanças com o do Homo sapiens (Tim White/Divulgação)
Crânio do Ardipithecus ramidus analisado no estudo apresentou semelhanças com o do Homo sapiens

Um dos mais acalorados debates sobre as origens do Homo sapiens concentra-se em como a espécie africana Ardipithecus ramidus, que viveu há 4,4 milhões de anos, relaciona-se com a linhagem humana moderna. Ardi, como é chamado o primata, habitava a região onde hoje é a Etiópia e era pouco comum. Embora tivesse um pequeno cérebro e um dedão anatomicamente desenhado para trepar em árvores, ele tinha dentes caninos muito semelhantes aos do homem, e sua pélvis já estava modificada para o andar bípede, com pés firmes no chão e coluna ereta.

Os cientistas discordam sobre em que ramo evolutivo deve ser encaixada essa estranha mistura de características. Alguns argumentam que Ardi era um primata com traços humanos herdados de um ancestral da época em que as linhagens dos chimpanzés e dos homens se dividiram, entre 6 e 8 milhões de anos atrás. Outros defendem que a espécie era, na verdade, um parente direto do Homo sapiens, e que ainda exibia elementos de parentes distantes, macacos que pulavam de galho em galho.

Agora, baseados em estudos fósseis, pesquisadores da Universidade Estadual de Arizona reforçam a relação evolutiva próxima entre Ardi e humanos modernos. Liderados pelo paleoantropólogo William Kimbel, os cientistas examinaram o crânio parcial bem preservado de um exemplar da espécie e garantem que encontraram um padrão de semelhança que liga Ardi ao australopiteco e ao Homo sapiens, mas não aos macacos modernos. A pesquisa foi publicada na edição on-line de segunda-feira da revista Proceedings of the National Academy of Science (Pnas).

Crânio O fóssil foi encontrado na Etiópia, local em que a equipe do coautor do estudo Tim White, da Universidade da Califórnia em Bekerley, vem escavando desde a década de 1990. A pesquisa mais recente realizada com esse mesmo crânio foi publicada na revista Science em 2009 e já dava dicas sobre os aspectos físicos típicos de humanos exibidos pelo antigo primata. “Dado o tamanho muito pequeno da caveira de Ardi, a semelhança dele com a base do crânio humano é incrível”, conta William Kimbel, conhecido mundialmente por ter participado da equipe que descobriu o mais antigo fóssil de um australopiteco – a espécie de Lucy –, em Hadar, na Etiópia.

A base craniana é uma fonte de muita importância para o estudo da filogenética (relação evolutiva natural), porque a complexidade anatômica e sua associação com o crânio, a postura e o sistema de mastigação dão dicas sobre a evolução adaptativa ao longo do tempo. Nos humanos, essa estrutura é profundamente diferente da encontrada em macacos e outros primatas. Segundo Kimbel, o mesmo ocorre com o fóssil de Ardi, anatomicamente mais próximo ao do australopiteco, um ancestral direto do Homo sapiens. Tudo indica, por exemplo, que a articulação da espinha com o crânio localizava-se mais para a frente, assim como ocorre com humanos e seus antepassados. Outras características semelhantes às observadas no Homo sapiens são a base mais curta na frente e aberturas laterais, para passagem de vasos sanguíneos e nervos, mais largas.

“A base craniana de Ardi preenche importantes lacunas no nosso entendimento sobre a evolução do homem acima do pescoço”, diz Kimbel. De acordo com ele, os estudos sobre a adoção da postura ereta e do bipedalismo terão de ser reavaliados agora, à luz da descoberta de que Ardi está mais próximo, na árvore evolutiva, do homem do que dos chimpanzés. 

Choque de perseverança - Vilhena Soares

Choque de perseverança 
 
Ao estimular com eletrodos uma região específica do cérebro, pesquisadores americanos fazem pacientes experimentar uma sensação de determinação para enfrentar problemas 
 
Vilhena Soares
Estado de Minas: 08/01/2014


Brasília – Por que, diante de um grande desafio, algumas pessoas permanecem dispostas a superá-lo enquanto outras desistem logo da tarefa? A perseverança é um traço que pode fazer toda a diferença nas conquistas de uma pessoa ao longo da vida. Agora, experimentos conduzidos por pesquisadores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, apontam uma região do cérebro que parece estar ligada a essa capacidade. Além de ajudar a compreender melhor esse tipo de atitude, o estudo pode ajudar, futuramente, em tratamentos de diferentes problemas psicológicos, incluindo a depressão, acreditam os autores.

Josef Parvizi, professor do Departamento de Neurologia e Ciências Neurológicas da instituição de ensino californiana, explica que o experimento realizado por ele e sua equipe foi feito com duas pessoas que sofriam de epilepsia. Com eletrodos implantados nos cérebros dos pacientes, que já serviam para tratar a doença, os médicos puderam estudar o que acontecia quando uma região chamada córtex anterior cingulado era estimulada por impulsos elétricos. “ Em dois pacientes com eletrodos intracranianos implantados no mesmo local, trabalhamos com a hipótese de que as mudanças de percepção e de comportamento poderiam ser provocadas pela estimulação”, conta Parvizi.

Ao receber a carga, os pacientes descreveram uma sensação similar à “expectativa de desafio”, como se assumissem uma atitude de determinação que os ajudaria a enfrentar algum problema que viessem a ter. Ao mover o eletrodo para um ponto a apenas 5mm de distância do alvo anterior, os pesquisadores não tiveram o mesmo resultado.

“Nosso estudo aponta as coordenadas anatômicas precisas das populações neuronais que suportam os estados psicológicos e comportamentais complexos associadas à perseverança”, diz Parvizi, em um comunicado à imprensa. “Poucos pulsos elétricos entregues a uma população de células do cérebro dão origem a um conjunto de emoções e pensamentos que nós associamos à perseverança, e isso nos diz que nossas qualidades humanas únicas estão ancoradas na operação de nossas células cerebrais”, complementa o pesquisador.

Terapias O principal autor da pesquisa, publicada recentemente na revista Neuron, esclarece que os resultados obtidos sugerem que a função de perseverança obtida com a estimulação do córtex anterior cingulado pode estar ligado à capacidade das pessoas de enfrentar situações difíceis em suas vidas. Isso pode levar a novos tratamentos de distúrbios psicológicos, como por exemplo, por meio da eletroestimulação da área avaliada.

De acordo com Ronaldo Maciel Dias, neurologista do Hospital Santa Luzia, de Brasília, o trabalho americano foca em uma área cerebral muito estudada nos últimos anos. “Essa região é muito sensível a estímulos. Os cientistas fizeram o experimento em pessoas com epilepsia porque elas têm alta atividade ali”, explica o médico, que não participou do estudo. Dias também acredita que a pesquisa pode ajudar a pensar novas formas de tratamento. “A perseverança é algo ausente em muitas doenças psicológicas. Acredito que, caso surjam mais estudos que comprovem realmente essa área como ligada a essa habilidade, outros tratamentos psicológicos possam surgir”, afirma. “Mas claro, ainda precisamos de muito mais pesquisa.”

Mente Coordenador do Grupo de Neuromodulação da Neurologia da Santa Casa de São Paulo, Maciel Simis alerta que, apesar de o artigo de Stanford mostrar de forma eficaz uma região do córtex como relacionada à perseverança, é necessário levar em conta todo o cérebro para entender seu funcionamento. “Hoje, temos um conceito mais moderno, que trata o cérebro como uma grande rede de conexões que precisa de um ‘terminal’ para que tudo o que esse órgão complexo tenha que fazer funcione”, destaca. “Por conta disso, precisamos ter cuidado ao falar que uma área seria responsável por uma atitude específica. Outras regiões podem fazer parte dessa função também”, defende.

O especialista acredita que tratamentos com eletrodos, como o utilizado no estudo, possam ajudar em tratamentos futuros. “Trabalho em uma área que utiliza estímulos elétricos para tratamentos e acredito que, dessa forma, conseguiremos tratar problemas específicos, como a falta de perseverança. Contudo, temos de levar em conta que um problema como esse pode vir acompanahdo de outros fatores”, ressalta.

“Devemos estudar esses casos com cuidado. A mente é parte do cérebro ou não? Muita gente critica esse tipo de estudo por achar que isso minimiza o cérebro, como se a mente fosse simplesmente uma coisa biológica. De qualquer modo, esses trabalhos nos ajudam a seguir em busca de tratamentos mais eficazes”, conclui.