domingo, 5 de outubro de 2014

EM DIA COM A PSICANáLISE » Seca e silêncio

Regina Teixeira da Costa - reginacosta@uai.com.br
Estado de Minas: 05/10/2014 



Essas duas palavras aparentemente não têm relacionamento direto, porém, o que vimos ocorrer com a nascente do Rio São Francisco reflete claramente o silêncio e a passividade com que o poder público e grande parte da sociedade lidam com a questão ambiental no Brasil.

A nascente secou sim por causa da pior estiagem da história do rio. Mas o ocorrido não se restringe à falta de chuvas. Também é consequência das ações do homem sobre a natureza. O desmatamento das matas ciliares e outras nas proximidades e o assoreamento do rio são igualmente causadores da desertificação do planeta.

Ainda nestes dias de seca, em que toda a mídia publica diariamente relatórios assustadores, vemos nas ruas lavarem passeios com mangueiras, vemos vazamentos e tanta falta de consciência que nos assusta. Qual seria o motivo dessa barbaridade? Alienação, desprezo pela vida do planeta, odiosidade, falta de educação?

Nenhuma campanha educativa foi lançada pelo estado e nada foi feito para conscientizar a população de que é preciso uma mudança de comportamento radical. E que cada um é responsável pelo uso razoável de um bem que é de todos, que vivemos numa coletividade. Sendo assim, cada um depende do outro.

Ocorre que até hoje nem mesmo coleta seletiva de lixo é feita corretamente pelos vários condomínios e residências na cidade. Alguns dizem que até o recolhimento é irregular ou inexistente. Que esperança podemos ter no futuro? O que será de nossos descendentes?

E nada disso é por desconhecimento de causa. É sabendo. E assim as pessoas contraem o vírus da Aids; assim elas têm câncer de pulmão porque fumaram toda a vida; cirrose porque beberam; matam porque querem o que o outro tem; roubam porque não acham que o trabalho lhes será lucrativo; e cobiçam conquistar por força aquilo que não conquistam pela competência.

E se disserem que sou simplista e que problemas sociais maiores são a causa disso, concordarei, lembrando, entretanto, que muitos vencedores de hoje saíram da extrema pobreza e triunfaram por seu próprio esforço.

Finalmente, agradeço por ter encontrado em meu caminho da ética psicanálise como recurso para não apenas suportar esse real duro de roer como também para entender um pouco melhor a conduta humana. Mas entender não resolve coisas fundamentais, que dependem de todos.

Mesmo assim, insisto: para a psicanálise, o homem está dividido entre a pulsão de morte e a de vida e há uma constante luta entre essas duas forças que o movem. Essa divisão nem sempre é conhecida racionalmente, o posicionamento cabe a cada um, mas nem todo ele é consciente, sendo parte da vida psíquica inconsciente. Nem sempre somos capazes das melhores escolhas. Simplesmente vai-se vivendo sem pensar no amanhã.

Talvez por nos sabermos mortais, agimos como se a batalha entre a morte e a vida estivesse perdida, posto que todos morrem no fim. Mas a vida não se resume à nossa existência curta e pontual. Além de nós, existe a continuidade da vida do planeta e daqueles que virão depois. E toda a construção da civilização caminha, apesar da curta vida de cada um.

A vida em jogo está para além da morte naqueles que darão continuidade à espécie e ao prolongamento da vida da Terra. Mas por que a voz dos educadores, intelectuais, artistas, homens públicos não surte reação? Por que nenhuma campanha expressiva até hoje? Por que não nos unimos incansavelmente em campanha pelo nosso maior bem? Por que o silêncio da maioria?

Nenhum comentário:

Postar um comentário