sábado, 6 de setembro de 2014

Liderança global - Dan M. Kraft

Liderança global Estaríamos diante de um momento sensível e grave como a década de 1930, em que o conflito global estaria se aproximando?



Dan M. Kraft
Advogado e professor de direito no Brasil e no Canadá
Estado de Minas: 06/09/2014



Uma persistente crise de liderança ocorre nos meios privados e públicos. Um novo modelo de governança de interesses coletivos (sejam eles de acionistas ou de cidadãos) não substituiu o antigo, que é personalista e autoritário, não acostumado a prestar contas ou ouvir. Estamos no meio do caminho, como autômatos que não sabem muito bem a razão dos acontecimentos que afetam nossas vidas em sociedade.

No mundo corporativo, grandes conglomerados não conseguem emular seus fundadores e líderes, como Steve Jobs, Kiichiro Toyoda e Antônio Ermírio de Moraes, sucumbindo lentamente à mesmice e abrindo mão da inovação. A aversão ao risco, à firme tomada de decisão, substitui a ousadia e condena empresários a se tornarem burocratas, seguidores de gurus charlatães, vendedores de fórmulas de sucesso, bem como reféns de consultorias comprometidas com o status quo.

Na vida política, ocorre exatamente a mesma coisa, lado da mesma moeda da liderança fraca, opaca, comprometida, mal instruída e engessada. Os países ocidentais, beneficiários do racionalismo iluminista, que desenvolveram culturas extremamente avançadas na paz e na guerra, estão em franca decadência. Seus governantes insistem em repetir o mesmo ou em acreditar piamente que outros povos imitarão suas fórmulas centenárias e libertárias.

Quando Barack Obama foi anunciado como ganhador do Prêmio Nobel da Paz, antes de concluir seu primeiro ano de governo, ficou claro quão fracas andam não apenas as lideranças mundiais, mas também aqueles que as avaliam. Presidente hesitante em política externa, que abandonou seus aliados para apaziguar o discurso de ódio de nações declaradamente inimigas, Obama não fez – nem faz – por merecer um prêmio que, muitos dizem, lhe deveria ser cassado.

A atual ausência de liderança mundial, papel guardado após a Segunda Grande Guerra pelos Estados Unidos, não se substitui por organismos multilaterais como a ONU, que serve de fonte inspiradora de princípios, mas cujos dentes e garras ninguém assustam. Nos conflitos da Sérvia, a Europa pouquíssimo fez e assistiu-se, a poucas centenas de quilômetros dos magníficos Champs Elisées, o genocídio do século, após a queda do nazismo.

A crescente ameaça islâmica, representada pelo califado e seu Estado Islâmico que desconhece as fronteiras internacionais, combinada com o insistente desafio russo à autodeterminação ucraniana, desafiam o mundo, que ainda resta silente salvo raras exceções. A paz sempre foi uma quimera na humanidade, mas interdependência econômica e diplomacia transformaram os últimos 60 anos em um período razoavelmente livre de conflitos em escala mundial. As tecnologias da guerra são mais ameaçadoras hoje em dia, pois, além do confronto corpo a corpo, a destruição remota, inclusive eletrônica, pode causar milhões de vítimas.

Um mundo sem liderança cai no caos. A obra literária de Winston Churchill, primeiro-ministro britânico que arquitetou a derrota de Hitler, é o melhor relato sobre como as nuvens da tempestade foram se reunindo, até ser inevitável o conflito que dizimou dezenas de milhões de vidas pelo mundo. Problemas econômicos e a negação da realidade fizeram com que o posicionamento de povos de bem desse espaço à destruição duradoura dos tiranos.

Estaríamos diante de um momento sensível e grave como a década de 1930, em que o conflito global estaria se aproximando, permitindo a polarização genocida? Os analistas internacionais estão muito divididos sobre qual o ponto de não retorno.

O fato é que a liderança atual norte-americana, que comanda a armada mais possante do planeta, elegeu dar passos para trás quando se trata de impor a paz. Após a prepotência da era Bush, Obama invocou para si a missão de enterrar a Pax Americana. Entretanto, o problema não é sair do lugar, e sim não chegar ao destino. O mundo desconhece para onde caminha e essa falta de direção é a receita do desastre. Quando regimes totalitários resolvem ampliar suas áreas de influência e poder, líderes globais fracos tornam seus povos presa fácil. Líderes visionários andam fazendo muita falta.

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