segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Conflito homem x bichos‏

Jacarés, capivaras e quatis fora de controle mostram que Belo Horizonte não tem política adequada de manejo dos animais silvestres que vivem em áreas urbanas

Sandra Kiefer
Estado de Minas: 08/09/2014



Rapaz fotografa quati no Parque das Mangabeiras.  Convivência complicada na principal reserva ambiental de BH (JUAREZ RODRIGUESEMD. APRESS)
Rapaz fotografa quati no Parque das Mangabeiras. Convivência complicada na principal reserva ambiental de BH


Uma das maiores metrópoles do país, Belo Horizonte ainda não está preparada para lidar com a presença cada vez mais constante dos animais silvestres que, em função da destruição do seu hábitat, acabam indo buscar alimento e abrigo nos grandes centros urbanos. O problema do desequilíbrio ambiental começou com os quatis do Parque das Mangabeiras, que, por falta de orientações e conscientização para as pessoas não alimentarem os bichos, se proliferaram sem controle em um dos pontos turísticos mais charmosos da capital. Em seguida, a questão atingiu proporções mais graves com as capivaras da Lagoa da Pampulha, cartão-postal da cidade. E, agora, o desafio são os jacarés encontrados na mesma lagoa. Levantamento feito pela empresa que executa as obras de desassoreamento da represa mostra que 21 exemplares da espécie vivem na represa.

No caso das capivaras, a remoção dos animais, já autorizada pelo Ibama e pelo Ministério Público do Meio Ambiente, começa hoje. Sem uma política estabelecida de manejo e castração dos mamíferos roedores, o que antes era uma única família multiplicou-se em nove grupos de capivaras, que se espalharam por diversos pontos da barragem da Pampulha. “Se demoraram a retirar as capivaras, imagine quanto tempo vai levar para darem um jeito nos jacarés”, questiona o empresário Vicente Procópio, morador do Bairro Castelo. Ele evita levar à Pampulha o filho Davi, de 6 anos, por medo da contaminação com a febre maculosa, transmitida pelo carrapato-estrela, que se hospeda nas capivaras.

O alerta em relação ao aumento descontrolado do número das capivaras surgiu em julho de 2013, quando elas foram flagradas pastando e pisoteando os jardins tombados de Burle Marx, nas imediações da Casa do Baile, que estavam em processo de restauração. Depois da longa novela da remoção, com idas e vindas, a prefeitura garante que, a partir de hoje, elas começam a ser encaminhadas para o cercado do Parque Ecológico Promotor Francisco Lins do Rego. “Decidimos enfrentar um problema que está aí há mais de 20 anos. Primeiro, as capivaras vão para um lugar isolado no parque, onde as famílias serão identificadas e marcadas. Só então serão transferidas para local específico, licenciado pelo Ibama”, defende-se o vice-prefeito e secretário municipal de Meio Ambiente, Délio Malheiros. Ele garante que nenhuma capivara será sacrificada e que o processo será acompanhado de perto pelo MP e por representantes da Sociedade Protetora dos Animais.

Embora os ativistas de defesa dos direitos dos animais critiquem a remoção das capivaras, especialistas alertam que elas estão ameaçadas na Pampulha. Em março, três foram atropeladas na Avenida Otacílio Negrão de Lima, perto da igrejinha da Pampulha. Durante os exames nos corpos dos animais foi constatado que eles estavam com alto nível de contaminação do organismo, causado pelo contato com a água poluída da represa. “Não adianta só achar bonitinho apreciar os animais silvestres. A Pampulha é frequentada por um grande número de pessoas, que caminham na orla e se deitam na grama. As capivaras não estão em situação de equilíbrio e representam um problema de zoonose”, alerta o biólogo Ricardo Motta Pinto Coelho.

BOA CONVIVÊNCIA Durante congresso no Paraná, no último fim de semana, Coelho visitou os municípios de Marechal Rondon, Toledo e Foz do Iguaçu, citados como exemplo de boa convivência entre animais silvestres e a população, dentro de parques ecológicos. “Não é o caso da Pampulha. São lagos urbanos dentro de reservas, em equilíbrio, onde os animais ficam isolados do restante da população. Fico encantado que as pessoas possam admirar a vida silvestre, mas em condições controladas e em segurança”, reforça o biólogo.

Quanto aos jacarés, cujo manejo será estudado pela PBH, segundo Délio Malheiros, eles não são uma ameaça à população. “A não ser que haja pessoas se banhando na água, os jacarés não oferecem risco”, esclarece o biólogo da UFMG Paulo Garcia, doutor em zoologia. Ele explica que esses animais atacam apenas em situação de pressão e priorizam presas menores, como peixes, aves e filhotes de capivaras. Encontraram na Pampulha ambiente ideal para botar os ovos e se reproduzir nas ilhas assoreadas. “Quanto mais sujo e desorganizado o ambiente, melhor eles se camuflam para capturar as presas. Se a água estiver limpa, a tendência é haver uma regulação natural da espécie”, diz.


Jacaré-de-papo-amarelo

Nome científico: Caiman Latirostris
Classe: Reptilia
Ordem: Crocodylia
Família: Alligatoridae
HÁbitat: Lagoas e rios
Pode medir até 3 metros de comprimento. Tem cor esverdeada, com o         ventre amarelado, o foci nho largo e achatado. Alimenta-se de peixes,         aves e mamíferos. Seu período de reprodução é entre janeiro e março e         uma fêmea põe entre 30 e 60 ovos por ninhada. Pode viver até 50 anos.

Fonte: Fiocruz


Quati

Nome científico: Nasua nasua
Classe: Mammalia
Ordem: Carnívora
Família: Procyonydae
HÁbitat: Árvores

Tem comprimento de 60cm e mais 75cm só de cauda. Com garras  longas e fortes e focinho em forma de trombeta, é capaz de escavar por  toda parte em busca de comida. Sobe em árvores e se desloca pelo chão de forma rápida, com a cauda erguida. Pode pesar até 11kg e viver  15 anos. Tem uma ninhada por ano.

Fonte: Portal Saúde Animal


CaPIVARA

Nome científico: Hydrochoerus hydrochoeris
CLASSE: Mammalia
Ordem: Rodentia
Família: Hydrochaeridae
HÁbitat: Florestas úmidas e secas, pastagens  próximas à água

Mamífero roedor típico da América do Sul,  seu nome em  tupi-guarani significa comedor de capim. Tem quatro dedos nas patas dianteiras e três nas traseiras unidos por uma membrana, fazendo dela uma ótima nadadora. O tempo de vida varia de 10 a 12 anos. Ao nascer, pesa cerca de 2kg e, adulto, pode passar de 60kg.

    Fonte: Portal Saúde Animal

Ameaças à vida animal Hábitos da população de BH põem em risco a sobrevivência de espécies que habitam o Parque das Mangabeiras e outras regiões da cidade. Ninguém se preocupa com os bichos
Sandra Kiefer


Segundo os ambientalistas, as capivaras deveriam permanecer na Lagoa da Pampulha, em convivência harmônica com as pessoas (Jair Amaral/EM/D.A Press)
Segundo os ambientalistas, as capivaras deveriam permanecer na Lagoa da Pampulha, em convivência harmônica com as pessoas


Apesar das insistentes placas distribuídas no Parque das Mangabeiras, ensinando a manter distância mínima de dois metros dos animais silvestres, a descartar o lixo em casa e a não dar comida, muitos moradores de Belo Horizonte ainda menosprezam e riem das recomendações. “Trouxemos bananas para atrair os micos. Viemos com um grupo de oito alemães que estão doidos para ver macacos no Brasil”, revelou a integrante de um grupo de intercâmbio para idosos. “A gente joga uma banana. De um lado, vêm os micos, e do outro, os biólogos do parque”, explica a mulher, que tomou o cuidado de, pelo menos, não oferecer alimentação industrializada aos animais.
Da mesma maneira, duas pipas são avistadas no céu, embora esteja terminantemente proibido entrar com papagaios no parque. Nos últimos dois meses, na temporada de ventos, foram recolhidas cerca de 800 aves feridas e mutiladas pelas linhas, mesmo sem o uso de cerol, entre gaviões, corujas, pardais e rolinhas. “Se o atendimento de saúde para a população já é precário, imagine a situação dos animais acidentados em vias públicas que dependem da boa vontade de voluntários e das clínicas veterinárias para ajudar”, denuncia o veterinário Leonardo Maciel, especialista em animais selvagens. Ele lembra que a capital paulista já estuda construir o segundo hospital veterinário gratuito.

“Belo Horizonte precisa desenvolver uma relação de respeito para com os bichos. O problema é que o ser humano deixou de conviver com os animais, a não ser que estejam presos no zoológico ou na coleira”, alerta a advogada Val Consolação, ativista da causa animal. Mais eficiente do que o manejo das capivaras e jacarés da Pampulha, além de outros sujeitos ao desequilíbrio, os ambientalistas preconizam como estratégia para a capital mineira a castração dos animais. “É uma forma de controle populacional ética. Os bichos deixam de se reproduzir e a situação se resolve naturalmente, por meio do envelhecimento”, afirma Maciel. Segundo ele, foi o que aconteceu com a população de gatos do Parque Municipal de BH, castrados com a ajuda dos voluntários das ONGs especializadas na proteção aos direitos dos animais.

ATRAÇÃO NA COPA “É bom lembrar que os animais silvestres chegaram aqui antes de nós”, adverte Fernando Perini, que estuda os mamíferos no Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG. Ele lembra que, no caso da Lagoa da Pampulha e do Parque das Mangabeiras, o ser humano criou verdadeiros oásis para os animais silvestres, ao espantar predadores maiores e oferecer alimento em abundância. “Essa política de remover as capivaras da Pampulha vai se tornar inócua, porque outras virão pelos córregos, assim como vieram as primeiras. É perfeitamente viável a convivência pacífica entre os homens e os animais silvestres”, defende ele, dizendo que as capivaras foram a maior atração para os estrangeiros na Copa do Mundo, mais do que a arquitetura de Niemeyer e os jardins de Burle Marx.

A adaptação das aves ao ambiente urbano é outro desafio a ser enfrentado. Segundo o ecologista de aves da UFMG Marcos Rodrigues, das 700 espécies de aves existentes em Minas Gerais, somente 200 conseguem sobreviver em meio às luzes da cidade. “Elas são fotofóbicas, ou seja, têm medo da luz. Gostam de viver no escurinho da cidade e estão totalmente adaptadas à vida na floresta, alimentando-se de insetos e frutos”, explica. Ao mesmo tempo, em função da maior oferta de recursos alimentares nas metrópoles, algumas aves estariam se dando bem com as novas condições ambientais nos centros urbanos. Com o aumento das palmeiras nos condomínios fechados, que oferecem coquinhos, começaram a aparecer revoadas de tucanos e periquitos nas cidades grandes, nos últimos 20 anos. Para tudo existe um lado bom. 

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