quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Mal que entra pelo ouvido - Augusto Pio

Ruído fora de controle é um dos agentes mais nocivos à saúde humana. Especialistas analisam os níveis de barulho, as consequências não apenas à audição e as possibilidades de tratamento


Augusto Pio
Estado de Minas: 27/08/2014



Pesquisas mostram que o ruído fora de controle é um dos agentes mais nocivos à saúde humana, causando perda da audição, zumbidos, ansiedade, nervosismo e até mesmo impotência sexual. Bruno Castro, médico otorrinolaringologista da Clínica Alves de Sousa e membro da Sociedade Mineira de Otorrinolaringologia, explica que o ruído ou barulho é todo som audível que se torna desarmônico à audição, tornando-se, dessa forma, pessoal e subjetivo. “O ruído intenso, que pode causar alguma perda de audição, está acima de 85 decibéis (dB ) por um período de oito horas. Para cada 5dB aumentado, a exposição ao ruído deve diminuir pela metade, ou seja, 90dB por apenas quatro horas de exposição. E 95dB por apenas duas horas e, aos 110dB, a exposição deve ser de apenas 15 minutos.”

O especialista ressalta que esses excessos de ruído podem gerar a perda de audição chamada de perda auditiva induzida por ruído (PAIR), que, por sua vez, pode gerar zumbido (ou tinnitus ), transtornos de atenção, ansiedade, insônia e até depressão. “A perda auditiva pode ser gerada por duas formas de ruído intenso, sendo a primeira já citada anteriormente pela exposição prolongada (geralmente ocupacional); a segunda é  chamada de trauma acústico (TA) por uma exposição súbita e intensa, como nas explosões acidentais, casos de fogos de artifício e tiros, entre outros. Essas perdas são por lesão de células não renováveis pelo organismo humano e, dessa forma, tornam-se irreversíveis, havendo necessidade de uso de aparelhos de ampliação sonora individuais (aparelho auditivo).”

Quanto ao zumbido, o médico esclarece: “Primeiramente, devemos definir o zumbido, ou ainda acúfeno, tinnitus ou tinido, a uma sensação auditiva cuja fonte não advém de estímulo externo ao organismo. É um sintoma associado a várias formas de perda auditiva. Entre as várias causas de zumbido, a perda auditiva é a principal e mais comum, independentemente do tipo de perda auditiva, seja pela idade, por doença genética e familiar, por otites, por doenças metabólicas como diabetes, colesterol e tireoide, por doenças do sistema nervoso central e até das articulações dentárias, determinados tipos de alimentos e outras. É importante deixar claro que é a perda auditiva que gera o zumbido e não o contrário.”

Bruno reforça que o zumbido pode afetar o indivíduo, causando distúrbios de atenção, ansiedade, insônia, depressão, baixo rendimento no trabalho ou escolar, sendo pessoal e depende da sua intensidade. Geralmente, a queixa é principalmente noturna, quando há mais silêncio. “A cura do zumbido está diretamente relacionada à causa, e o otorrinolaringologista está preparado para investigar e tratar adequadamente. É uma tarefa exaustiva e exige paciência e persistência, tanto do profissional assistente quanto do assistido.”

patologia O especialista afirma que há várias formas de tratamento, com medicação ou até mesmo aparelho auditivo, por meio do que é chamado de habituação ao zumbido. Mas isso depende sempre da patologia causadora do zumbido, tornando o tratamento individualizado. “Sempre que houver um barulho que incomode ou que gere um zumbido, exposição deve ser evitada. Para medir essa intensidade sonora há alguns aplicativos de smartphones, que determinam em dB a intensidade sonora do ambiente e sugiro avaliar o volume do fone de ouvido que a pessoa estiver usando, pois, devido à proximidade com a membrana timpânica, pode tornar sons pouco intensos em prejudiciais à saúde, gerando perda auditiva e zumbido.”

Bruno esclarece que os profissionais mais afetados são os que trabalham com ruído intenso: operários da construção civil (maquita e britadeiras), motoristas de coletivos, professores de ginástica, cabeleireiros, manipuladores de som em boates, trabalhadores de aeroportos, atendentes de lanchonetes (com uso excessivo de liquidificadores) e até dentistas, que trabalham com motor de alta rotação. O barulho do dia a dia no trânsito é uma forma de poluição sonora considerável, mas não é causador de perdas auditivas de forma geral, pois a exposição nem sempre é contínua e prolongada. E, de certa forma, a educação no trânsito é fundamental para evitarmos buzinas e ruídos extremos causados pelas descargas de veículos, principalmente de motocicletas.”

Os danos do zumbido 

A fonoaudióloga Amanda Neves, gerente de produtos da Microsom BH, explica como a exposição contínua a altos níveis de ruído pode causar deficiência auditiva. “Há variação considerável de indivíduo para indivíduo relativa à suscetibilidade ao barulho. Entretanto, padrões estabelecidos indicam o quanto de som, em média, uma pessoa pode tolerar. Apesar desses níveis permanecerem controversos, tem-se orientado as pessoas para não experimentar níveis de ruído que excedam de 85dB a 90dB.”

Quanto ao zumbido no ouvido, Amanda ressalta que, embora saber a causa exata seja um desafio, muitos pacientes que têm história de exposição a ruído apresentam zumbido. “Nesse caso, a maior parte dos pacientes tem também problemas auditivos, mas uma pequena porcentagem (menos de 10%) tem a audição dentro dos limites da normalidade”. Ela esclarece que o zumbido pode acarretar depressão, insônia, afetar a qualidade de vida e a capacidade de executar atividades rotineiras, como trabalhar ou estudar. “Muitos pacientes notam aumento do zumbido quando ficam expostos a ambientes ruidosos. Por isso, deixam de frequentar alguns locais, principalmente festas com música.”

Amanda diz que pessoas alegam escutar um zumbido por um curto período de tempo após exposição prolongada a sons intensos. “Uma vez que o paciente deixa de escutar a fonte do ruído, o zumbido desaparece e se torna inaudível até a próxima exposição. Se a exposição ao barulho continua, o zumbido aumenta de volume e se torna constante. Para alguns casos, consegue-se a cura, mas em outros é difícil ter o controle. Não há tratamento que propicie melhora de 100% em todos os casos. Apesar da tecnologia disponível, e diferentes opções de tratamento, o mais importante é ouvir o paciente e buscar todas as possíveis causas.”

A especialista salienta que há muitos estudos e investigações clínicas e pouco a pouco são descobertas novas causas. “O melhor tratamento seria com uma abordagem interdisciplinar, pois os fatores psicológicos têm papel importante na percepção no processamento do zumbido. Logo, o diagnóstico psicológico deveria ser parte integrante da abordagem. Há várias causas do zumbido: problemas no ouvido (inflamação, cerume, perda auditiva), taxa de glicemia alta, problemas cardiovasculares, estresse, alterações emocionais, metabólicas, hormonais, uso de alguns medicamentos, maus hábitos (cigarro, bebida alcoólica e cafeína em excesso), exposição a ruídos etc. Quando as causas são identificadas, são elas que devem ser objeto do tratamento. O ideal é achar maneiras que possam curar o zumbido, e não simplesmente ‘ensinar’ a conviver com o problema.”

O tratamento é direcionado de acordo com o quadro clínico. “Há pacientes que apresentam problema de disfunção de ATM (articulação têmporo-mandibular). Esses podem ser encaminhados a fisioterapeutas, fonoaudiólogos ou ortodontistas (uso de placas de alívio ou aparelhos ortodônticos). Também há zumbido associado à perda auditiva e, nesse caso, há a possibilidade de indicação de um aparelho que combine soluções que ajudem o paciente. Há ainda casos metabólicos de hipertensão arterial e diabetes que se resolvem com tratamento medicamentoso. Também podem ser prescritos remédios que aliviem o desconforto e os problemas derivados do zumbido: tranquilizantes, anticonvulsivantes, antidepressivos e fitoterápicos à base de ginkgo biloba.”

O uso de fones de ouvidos está cada vez mais comum e a fonoaudióloga alerta: “Pessoas que usam esse acessório por longos períodos são sérias candidatas a danos irreversíveis. O maior problema não é o uso do fone de ouvido em si, mas o exagero em relação à intensidade. Ouvir música com volume alto por muito tempo pode danificar estruturas sensíveis internas da orelha e levar à perda permanente da audição.” (AP) 

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