domingo, 17 de novembro de 2013

MARTHA MEDEIROS - As vantagens da solidão

Zero Hora 17/11/2013

Sozinha para sempre, nem pensar. Mas há que se valorizar as vantagens de se passar um tempo desacompanhada. A solidão não será um bicho de sete cabeças se você tiver bom humor e souber se divertir com o momento de entressafra.

Por exemplo, sozinha você não mente, não finge, não se faz de sonsa. Ninguém é mais autêntico do que um solitário. Não precisa fazer de conta que está gostando da conversa, não precisa inventar desculpas para ir embora, não precisa dizer que está tudo bem quando está tudo bem nada.

Sozinha você não comete gafes. Não esquece o nome da tia do seu marido, não confunde o sobrepeso da prima dele com gravidez, não pergunta pela mãe do melhor amigo dele. Não te contaram? Está presa por assalto a mão armada.

Sozinha você não dá vexame por ter bebido demais, você não ameaça tirar a roupa no final da festa, não se insinua para o namorado da filha dos outros. Sozinha você provavelmente ficou em casa no sábado e não termina a noite sendo o trending topic do twitter.

E não bate-boca, não faz fofoca, não fala alto demais, não provoca ninguém. Sozinha você é perfeita.

Já que um jantarzinho a dois está fora de cogitação, não julgará a maneira como seu amado maneja os talheres, o jeito que ele dança, quanto deixa de gorjeta, a miséria do seu vocabulário, aquela insistência dele em cortar o cabelo numa espelunca do centro. Quantas vezes a gente se arrepende por ter aberto a boca demais? Por ter se intrometido onde não devia? Sozinha, você é uma lady.

Sem relação estável com ninguém, você não cobra fidelidade, não reclama da bagunça, não faz perguntas repetitivas e indiscretas. E ao viajar só, longe das manias de um acompanhante, você não faz a louca diante de uma roubada, não inventa desculpas para fugir de uma indiada, não ameaça fazer as malas e voltar sozinha – já está sozinha mesmo.

Você praticamente fica sem o que contar para o padre no confessionário. Você não peca.

Acabou-se a fama de chegar sempre atrasada. Ou de ser pontual demais. Ou de furar encontros. Você não chega nem sai, você está fora do circuito.

Sozinha você economiza batom, lingerie, depilação, cabeleireiro, academia. Em compensação, gasta demais em croissants, biscoito recheado, bombons de licor. Quem é que vai se importar se você engordar dois ou três quilos?

Sozinha você é a maluca que dança no meio da sala, a demente que fala com as plantas, a artista que canta alto no chuveiro, a crente que faz pedidos para a primeira estrela que surge no céu. Você pede o quê, mesmo? Que essa solidão abençoada não seja vitalícia: que dure no máximo até o fim de novembro. Deus a livre de não ter em quem dar um beijo no Réveillon.

Viúvas da ditadura - Ancelmo Goes


Tv Paga

Estado de Minas: 17/11/2013 



 (Juliana Coutinho/Divulgação)


BEIJA-SAPO A escritora Thalita Rebouças (foto) estreia amanhã no canal Multishw, à frente do programa Desencalha, às 20h. Ela vai bancar o cupido e formar casais diante de uma plateia de 100 pessoas. Em cada episódio, os pretendentes passam por três provas, e o encalhado (ou encalhada) só consegue ver o escolhido nos momentos finais do programa.

MPB O Canal Brasil apresenta hoje, às 17h, o show Janelas do Brasil, da cantora cearense Amelinha. Gravado no Teatro Fecap, em São Paulo, conta com as participações especiais de Toquinho, Fagner e Zeca Baleiro. Amelinha é acompanhada de um trio afinado, formado por Dino Barioni, Emiliano Castro e Alex Vianna.

DOC No segmento dos documentários, um dos destaques é o bloco Super máquinas, às 16h, no Nat Geo, com episódios de S.O.S carros (“O triunfo do Stag”) e Fanáticos por carros (“Guerreiros de fim de semana”). Na Cultura, às 21h, a atração é Casanova, sobre o lendário conquistador veneziano do século 18. 

Novas telas O velho hábito de ver TV vem sofrendo profundas mudanças com o surgimento de novas tecnologias, com "Caparelhos inteligentes" que oferecem uma grande variedade de recursos

Publicação: 17/11/2013 04:00

Assistir a um jogo de futebol já não é tão simples assim. O telespectador vira torcedor de fato (Silas Scalioni/EM/D.A Press-27/04/2011)
Assistir a um jogo de futebol já não é tão simples assim. O telespectador vira torcedor de fato

Quanto mais se fala sobre a TV nas redes sociais, mais audiência as emissoras ganham. A dimensão do buchicho em torno de determinado programa, que no passado poderia ser facilmente mensurada em uma feira livre, hoje ganha força com a web. É o que mostra recente pesquisa desenvolvida pelas empresas Qual Canal, especializada na análise de redes sociais; e Ibope Media, conhecida por dimensionar o alcance da TV no mundo real. Ou seja, quando uma atração ultrapassa os 17 pontos no ibope, cada 5.000 tuítes adicionais equivalem a mais um ponto em âmbito nacional.

“Falamos no trabalho, em casa e com os amigos sobre os programas da TV. E o que ocorre atualmente é que passamos a fazer isso também nas redes sociais, no momento em que o programa está no ar”, analisa André Terra, sócio-fundador da Qual Canal. Ainda de acordo com o especialista, o interesse natural das pessoas em comentar programas de TV ultrapassaria hoje os limites do mundo físico, ganhando uma nova dimensão na internet.

PEGOU GERAL Telespectador assíduo e fã de carteirinha de diversas séries da TV fechada, Caio Focchetto, cofundador do blog Box de Séries, costuma escrever nas redes sociais suas impressões sobre determinadas atrações, enquanto a TV fica ligada. “É mais ou menos o que acontecia quando você via TV e levantava da cama ou do sofá, de tão impressionado com o que aconteceu. Nessa hora, a vontade era a de compartilhar a opinião sobre o que se viu. E o Twitter é ótimo para isso, afinal, já há uma afinidade entre quem te segue e você, e a possibilidade de continuar o diálogo (e também de ser ouvido) é maior”, acredita ele.

O fenômeno é chamado por especialistas de “TV em duas telas”, definido pelas ações de assistir TV e gerar conteúdo no Twitter, live blog ou mesmo no Facebook, simultaneamente. O termo difere-se de outro parecido, o “segunda tela”, que pode ser usado quando uma emissora oferece um conteúdo diferente do que está sendo exibido na TV, por meio de smartphones, tablets e outras ferramentas do gênero. A Band usou essa tecnologia na Copa das Confederações, em que ofereceu informações complementares aos jogos, ao mesmo tempo em que exibia as disputas.

 Na opinião de Gabriel Baños, presidente da Zauber Labs, companhia especializada em análise de redes sociais, o hábito de as pessoas ficarem sintonizadas em duas telas merece atenção por parte dos canais e dos anunciantes. “Se o conteúdo que o usuário postar for mostrado e respondido na TV, provavelmente ele se sentirá ouvido e será fiel ao programa. Por outro lado, se ele fizer um comentário e não receber nenhum retorno, certamente, desligará o aparelho.”

Sob a ótica da interação com o espectador, tanto Baños quanto Focchetto acreditam ser o futuro da TV. Para o executivo, “o próximo passo, que já está começando a ser notado, é a mudança do conteúdo da TV com base no que dizem os usuários das redes. Ou seja, interferirmos diretamente na programação por meio da web social”. O blogueiro complementa: “Apesar de ser entusiasta das mídias sociais, tenho de lembrar que a porcentagem de público presente em uma rede como o Twitter (mais de 30 milhões de usuários brasileiros) ainda é muito menor do que o público geral de uma novela, por exemplo. Talvez a opinião do Twitter ainda não reflita a opinião geral”.

AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA » Último aprendizado‏

AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA » Último aprendizado 


Ela tomou o copo, bebeu o conteúdo, dormiu e morreu

Estado de Minas: 17/11/2013

Sentou-se ao meu lado no avião e começamos a conversar. Conversa vai, conversa vem, de repente a doutora Margareth Dalcolmo me narra que um conhecido cientista político francês acompanhou a mulher a Zurich, para que ela tivesse a morte assistida. Ela se internou num hospital, o médico veio, deixou um copo com uma bebida determinada. Ela tomou o copo, bebeu o conteúdo, dormiu e morreu.

Seguimos falando sobre a urgência de o Brasil liberar a morte assistida. É desumano ficar entubado, ligado a aparelhos que mantêm a morte artificialmente, quando a pessoa não está mais aí. É um gasto tremendo, um calvário para a família. Margareth me prometeu uma bibliografia sobre isto. Não se pode separar o aprendizado da vida do aprendizado da morte. Escrevi crônicas e poemas sobre isto, sobre isto dei cursos vários: aprender a morrer é uma questão vital.

Chego em casa e vejo um email de um médico, dr. Neif Musse dizendo que vai publicar um livro de crônicas/depoimentos sobre o que tem visto nesta relação das pessoas com a morte. Manda-me um texto sobre uma bela adolescente que teve um acidente e morreu. Ele sabe que esse assunto me interessa. E devo fazer a apresentação do livro dele.

Marcamos um encontro para conversar sobre a vida e a morte. Não há como separá-las. E o lugar marcado é bem o lugar das celebrações, o restaurante/bar Garota de Ipanema perto de nossa casa. Fui andando para lá, me lembrando que nos anos 60 morei na Rua Montenegro ( hoje Vinicius de Moraes) e vi, com esse olhos que a terra há de comer, aquelas figuras míticas do bairro tomando chopp e olhando as pernas das airosas mulheres que passavam.

Ouvi muito do que o dr. Neif tem para contar. Ele também sabia daquela estória do Rubem Braga, que decidiu morrer quando descobriu que câncer de garganta ia levá-lo a várias humilhações. Rubem comprou as frutas de que gostava na feira em frente de sua casa, foi para o hospital e com a ajuda de um médico amigo acordou morto.

Saio da conversa com dr. Neif e, por concidência, vou à portaria da casa da Dra. Margareth, lá na Lagoa Rodrigo de Freitas, para pegar os livros que me prometeu sobre o assunto. Não resisto em lhes passar os títulos : « La mort est une question vitale » ( Dr. Elizabeth Kubler-Rosso), « La bataille de l’euthanaisie »- enquête sur les 7 affaires qui ont bouleversé la France (Tugdual Derville), »Lettre ouverte aux techocrates qui prennent l’hospital pour une usine », « L’avenir de la médicine »( Jean Bernard), « On death and dying »- what the dying have to teach doctors, nurses, clergy and their own femilies » Elizabeth Kubler-Ross, « La mort intime – ce que vont mourir nous apprenent à vivre » Marie de Hennezel, « La médicine sans corps- une nouvelle réflexion éthique » Didier Sicard e « Hippocrate et le scanner- reflexion sur la médicine contemporaine », Didier Sicard .

Lembrei-me, de repente, da sinopse de um curso que darei na Casa do Saber. É sobre literatura. Tardiamente me ocorre que deveria ter proposto um sobre o aprendizado da morte. Aliás, a literatura que nos ensina a viver nos ensina também a morrer.

E outra coincidência, vital e poética: falarei sobre isto ( a convite da Universidade Estadual de Minas Gerais) na Academia Mineira de Letras, quinta, 21. É que adotaram o livro Sisifo desce a montanha para vestibular. E como vocês sabem, Sísifo, foi condenado porque fez uma coisa inconcebível: sequestrou a morte…

Já pensou se ninguém morresse?

Eduardo Almeida Reis - Tetra-hidrocanabinol‏

Tetra-hidrocanabinol 
 
A maconha, ainda oficialmente proibida, já se vulgarizou na chamada melhor sociedade deste país grande e bobo 
 
Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 17/11/2013




Bancário, tive um chefe solteirão que se relacionava com uma profissional moreníssima, de aréolas róseas, que fazia ponto na Avenida Atlântica quase esquina com a Rua República do Peru, na cidade do Rio de Janeiro.

Informado, procurei a afro-brasileira, confirmei a linda cor das suas aréolas e desde então nunca mais tive problemas de faltas ou atrasos com o chefe. Bastava inventar: “Ontem à noite, estive com a Fulana e ela repetiu que homem, mesmo, é o Thomaz”. O patrício acreditava, se derretia e me deixava assinar o ponto dos próximos dois ou três dias, porque sempre tive a mania de fugir da cidade grande para a roça fluminense.

O pacientíssimo leitor sabe que a C12H30O2 é substância encontrada nas folhas e especialmente nas inflorescências femininas do cânhamo, Cannabis sativa, e que atua no sistema nervoso central promovendo sedação, diminuição do desempenho psicomotor e da força muscular, sensação de bem-estar e/ou euforia, sonolência, hipoglicemia etc.. É usada na medicina especialmente por suas propriedades antieméticas, acho que para evitar o vômito. É constituinte ativo da maconha e do haxixe, o melhor dos quais, di-lo a Interpol, é produzido em Marrocos, onde o Atlético Mineiro vai buscar o título de campeão mundial de clubes.

Afirmei que o leitor sabe porque deve ter lido no Houaiss, como acabo de fazer. Da leitura dos jornais, sabemos que o Uruguai vem de estatizar o plantio e a venda de maconha, que já é permitida em diversos estados norte-americanos. Comentaristas informados, como os do programa Manhattan connection, acham que a liberação no mundo inteiro é coisa para demorar 10 anos, no máximo. Portanto, em uma década a Terra vai conviver com o paradoxo paradoxal de ter a Cannabis sativa liberada, de mesmo passo em que todos os governos ameaçam com as piores penas do inferno as pessoas que se atrevem a fumar erva anual de até 1,5m, Nicotiana langsdorffii, da família das solanáceas.

O que o leitor talvez não saiba, como o seu philosopho não sabia, é que a maconha, ainda oficialmente proibida, já se vulgarizou na chamada melhor sociedade deste país grande e bobo. Faz tempo que não frequento festas de jovens. Há 45 anos, engravatados ou não, os jovens dançavam, podiam conversar com o som educado das discotecas e dos bares, tomavam pileques e chegavam eventualmente aos finalmentes na maior felicidade, entre juras de amor eterno.

Hoje, além do barulho ensurdecedor que caracteriza as reuniões, me dizem que na melhor sociedade o negócio se limita à maconha e ao pó. Sei disso porque conheço brasileiros humildes que trabalham nas tais festas e me contam: é pó, é fumo, é o fim do caminho. Até o sexo tem sido trocado pela sedação, diminuição do desempenho psicomotor e da força muscular, sensação de bem-estar e/ou euforia, sonolência, hipoglicemia.

Bons sinais
Sou quase do tempo dos sinais de fumaça e ouso dizer que, na linha do horizonte, vejo fumaça verde no que respeita ao jornalismo impresso. Warren Buffett tem 44 bilhões de dólares, é o quarto sujeito mais rico do planeta, não gosta de rasgar dinheiro e vem comprando uma porção de jornais. Jeff Bezos tem US$ 25 bilhões, é um dos vinte mais ricos e acaba de comprar The Washington Post. Também não é homem de rasgar dinheiro. Portanto, Buffett e Bezos, que não devem ser dois idiotas, estão vendo nos jornais impressos algo que os pessimistas não veem.

Se estivessem atrás de propaganda pessoal, com os milhões de dólares que investiram na aquisição dos jornais comprariam anúncios de primeira página nos maiores jornais do mundo provando que são lindos e inteligentes. Por US$ 20 mil contra nota fiscal, não precisando assinar o texto, provo que tanto Buffett como Bezos são mais bonitos que Tom Cruise e mais inteligentes que Planck, Sagan e Asimov somados. Por US$ 25 mil, sempre contra nota fiscal eletrônica, incluo Einstein e Newton na lista.

O mundo é uma bola

17 de novembro de 1558: Elizabeth I, da Inglaterra, torna-se rainha e é a última representante da dinastia Tudor a ocupar o trono. A Casa de Tudor, como sabemos todos os que consultamos o Google, foi uma dinastia de monarcas que reinou na Inglaterra entre 1485 e 1603.

Em 1717, tem início a construção do Convento de Mafra, a 25 quilômetros de Lisboa, monumental palácio e mosteiro em estilo barroco na vertente alemã. Iniciativa de dom João V, de Portugal, cumprindo promessa caso a rainha Maria Ana de Áustria lhe desse descendência.

A biblioteca de Mafra, estantes estilo rococó e chão de mármore, tem mais que 36 mil livros encadernados em couro, gravações a ouro, rivalizando com a biblioteca da Abadia de Melk, na Áustria. Em Portugal, a biblioteca acolhe morcegos que ajudam a preservar os livros. Saem durante a noite das caixas em que vivem por baixo das estantes: cada um se alimenta de insetos equivalentes à metade do seu peso.

Hoje é o Dia da Criatividade e o Dia Nacional de Combate à Tuberculose.

Ruminanças

“Ora, ora, ministro Wellington, não é aéreo: a pronúncia é aeroportuário.” (R. Manso Neto)

Toques de mestre - Gustavo Werneck‏

Toques de mestre 
 
Às vésperas da abertura do ano do bicentenário de Aleijadinho, equipe da Escola de Belas Artes da UFMG conclui restauração de duas peças atribuídas ao gênio do barroco brasileiro 

 
Gustavo Werneck

Estado de Minas: 17/11/2013


  No ateliê da Escola de Belas Artes/UFMG, no câmpus da Pampulha, a estudante de conservação-restauração Cristina Neres traz de volta a beleza da imagem de Santa Luzia, enquanto a colega Grasiela Nolasco (abaixo) se dedica à de Nossa Senhora do Carmo, com uso de raios X. As peças voltarão para Caeté em 15 de dezembro (FOTOS: CRISTINA HORTA/EM/D.A PRESS)
No ateliê da Escola de Belas Artes/UFMG, no câmpus da Pampulha, a estudante de conservação-restauração Cristina Neres traz de volta a beleza da imagem de Santa Luzia, enquanto a colega Grasiela Nolasco (abaixo) se dedica à de Nossa Senhora do Carmo, com uso de raios X. As peças voltarão para Caeté em 15 de dezembro

A mão direita do menino se enrosca no cabelo da mãe, com os dedos na altura da nuca, em busca certamente de segurança e proteção. O gesto delicado esculpido na madeira tem beleza, arte e, mais do que isso, parece ter vida tal a demonstração de intimidade. Com 1,13 metro de altura, a imagem de Nossa Senhora do Carmo, com Jesus no colo, está em fase final de restauração, ao lado da de Santa Luzia, um pouco menor (86 centímetros) e não menos expressiva. Em comum, as duas peças do século 18 têm a procedência – Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso, de Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte – e a marca de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814), o mestre cujo bicentenário de morte será lembrado de amanhã (veja a programação), Dia do Barroco Mineiro, até 18 de novembro de 2014. “São peças maravilhosas”, afirma, com brilho nos olhos, a professora Maria Regina Emery Quites, do Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (Cecor) da Escola de Belas Artes (EBA) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O serviço iniciado em agosto foi mantido em completo sigilo e agora é mostrado com exclusividade pelo EM.

No ateliê da instituição, no câmpus da Pampulha, em Belo Horizonte, duas alunas do curso de conservação-restauração, orientadas pelas especialistas Maria Regina e Beatriz Coelho, trazem de volta a forma e a policromia dos objetos de fé eternizados em cedro. Para Grasiela Nolasco e Cristina Neres, do 8º período, estar diante de uma imagem atribuída a Aleijadinho é uma “honra” e estudar para impedir a deterioração desse patrimônio, oportunidade única. “É a primeira vez que trabalho no restauro de ‘um’ Aleijadinho. Trata-se de peça primorosa”, diz a aluna, dando os retoques no manto dourado de Nossa Senhora do Carmo. Fruto da parceria entre a Arquidiocese de BH e a EBA/UFMG, a iniciativa vai beneficiar outros tesouros de igrejas e capelas. A entrega das imagens será no próximo dia 15.


 Com um olho no aparelho de raios X, equipamento usado para ver as condições internas da imagem, e outro em Santa Luzia, Cristina nutre o mesmo sentimento da colega, destacando a função devocional das esculturas e sua importância para a comunidade católica de Caeté. “Sabemos da grande expectativa na cidade para receber as esculturas”, informa a estudante, que, também faz, com essa tarefa, o trabalho de conclusão de curso (TCC), supervisionado pela professora Yacy-Ara Froner. Para proteger o acervo e garantir a tranquilidade da equipe, as peças são mantidas sob forte vigilância e guardadas em cofre. “Neste momento em que lutamos pelo reconhecimento da profissão de conservador-restaurador, vale destacar que trabalhos dessa natureza jamais podem ser feitos por amadores. Aqui temos a expertise da presidente do Centro de Estudos da Imaginária Brasileira (Ceib), Beatriz Coelho”, diz Yacy-Ara.

VELAS A situação das peças era precária, embora não fossem encontrados cupins e ataque de outros insetos, como é muito comum em talhas, retábulos e outras peças sacras de madeira. Segundo Maria Regina, havia muita sujeira, desprendimento da policromia e rachaduras. Especificamente na imagem de Santa Luzia, verificaram-se queimaduras pelo uso de velas e estragos na salva de madeira que porta os olhos da padroeira da visão. Já na imagem de Nossa Senhora do Carmo, a equipe encontrou desprendimento na parte rendada da veste. O serviço demandou tratamento emergencial, com a fixação da pintura (policromia), limpeza, reintegração cromática e nivelamento.

“Além do restauro, as alunas fazem um estudo profundo, com análises dos materiais e técnicas, partes iconográfica e histórica e estilo. Ao mesmo tempo, escrevem monografia sobre o restauro e a prática diária, a qual será apresentada perante banca examinadora. Depois dessas etapas, Grasiela e Cristina vão à comunidade fazer uma palestra”, diz Maria Regina. Com larga experiência no setor, a orientadora diz que é sempre uma emoção trabalhar numa obra de Aleijadinho, “pois ficamos frente a frente com uma força que encanta”. E mais: “Não se consegue parar de admirar ”. Ela ressalta que o mestre do barroco apenas esculpia as imagens, ficando a policromia por conta de outros artistas. “Devemos, assim, dar um crédito aos policromadores, mesmo sem saber o nome deles”.


 Os contatos com a equipe da Escola de Belas Artes foram feitos pela historiadora Mônica Eustáquio Fonseca, coordenadora do Inventário do Patrimônio Cultural da Arquidiocese de BH. “Na Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso, a imagem de Nossa Senhora do Carmo tem um altar dedicado a ela, enquanto a Santa Luzia fica no de São Francisco de Paula. O altar de Nossa Senhora da Conceição também é atribuído a Aleijadinho”, afirma a historiadora. Pelo trabalho de cooperação técnica, a arquidiocese fornece o material para restauração, grande parte importada, e a escola a mão de obra, devendo outras igrejas dos 28 municípios que compõem a instituição serem beneficiadas pela ação conjunta.


Programação
Abertura do Ano Aleijadinho

» Belo Horizonte

– Amanhã, às 20h, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais –Comemoração, pela primeira vez, do Dia do Barroco Mineiro, iniciativa do Legislativo, e homenagem à memória de Antonio Francisco Lisboa, cujo falecimento completará dois séculos em 18 de novembro de 2014. Presença do governador Antonio Anastasia
Amanhã, às 20h, na sede do Crea-MG (Avenida Álvares Cabral, 1.600 – Bairro Santo Agostinho, na Região Centro-Sul) – Abertura da exposição de fotografia Um olhar para o barroco mineiro – Homenagem a Aleijadinho
Até o dia 6 de dezembro, das 9h30 às 17h, na Imprensa Oficial (Avenida Augusto de Lima, 270, Centro) – Exposição O Aleijadinho pop, da artista plástica Simone Ribeiro, mostra que deu origem a um livro de mesmo nome

» Ouro Preto
– Hoje, às 19h, na Igreja de São Francisco de Assis, no Centro Histórico – Missa solene, com Coral e Orquestra São Pio X
– Amanhã, às 19h, no mesmo local – Apresentação artística (Arandela canta Vila Rica). Às 19h30, entrega da Medalha do Aleijadinho 2013

» Congonhas
– Amanhã, às 20h – Inauguração do projeto de iluminação das seis capelas com as sete cenas da via-crúcis, em frente ao Santuário Basílica do Senhor Bom Jesus do Matosinhos


DIA DO BARROCO MINEIRO
Iniciativa da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o Dia do Barroco, comemorado amanhã, foi instituído pela Lei 20.470/2012. Para o presidente do Legislativo, deputado Dinis Pinheiro (PP), autor do projeto de lei (PL 3.396/12), “o barroco, sendo uma riqueza do Estado, precisa ser celebrado permanentemente. Dessa forma, a sociedade mineira pode dar sua contribuição para manutenção e divulgação desse grande patrimônio, simbolizado pela figura de Aleijadinho, o maior artista plástico de nossa história”.  A lei criou uma comissão curadora para tratar da programação do bicentenário. O grupo será auxiliado por uma comissão gestora.



MEMÓRIA: Acervo restaurado em Nova LimaEm 2009, o Estado de Minas mostrou a fase final do restauro de um dos maiores conjuntos de esculturas em madeira de autoria de Aleijadinho, localizado na Matriz de Nossa Senhora do Pilar, em Nova Lima, na Grande BH. O acervo inclui quatro altares de cedro, dois púlpitos e uma tarja do arco-cruzeiro, a única que ainda apresenta policromia. A obra foi coordenada pela professora Bethania Veloso, diretora do Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis (Cecor) da Escola de Belas Artes da UFMG, instituição à frente da empreitada. As peças estavam originalmente na Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Jaguara (século 18), em Matozinhos, na RMBH, e foram transferidas para Nova Lima no início do século passado. Houve descobertas no tesouro barroco tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), como um sacrário, até então desconhecido da maioria dos fiéis, localizado no altar dedicado a Nossa Senhora da Conceição.

Exercício diário - Lilian Monteiro

Exercício diário

 Para especialista, indivíduos genuinamente gentis têm mais saúde psicofísica do que aqueles que têm apenas atitudes esporádicas



Lilian Monteiro

Estado de Minas: 17/11/2013


Geraldo Caldeira, médico e psicanalista, diz que os gentis demonstram   estado de humor adequado, alegria de viver e gostam de si mesmo (Maria Tereza Correia/EM/D.A Press)
Geraldo Caldeira, médico e psicanalista, diz que os gentis demonstram estado de humor adequado, alegria de viver e gostam de si mesmo

Não é possível mascarar a gentileza. Fingir ser gentil. As pessoas podem até aplicar artimanhas para passar a imagem de agradáveis, aprazíveis e delicadas, mas não a sustentarão por muito tempo. Vão se revelar como realmente são. O médico e psicanalista Geraldo Caldeira explica a diferença entre quem é gentil e aquele que se comporta como tal, seja em determinadas situações ou épocas do ano. “Os gentis demonstram estado de humor adequado, alegria de viver e gostam de si mesmos. São pessoas que têm as necessidades básicas mais ou menos preenchidas, já que totalmente não existe porque o ser humano é um ser faltoso. Aliás, esse é o eterno preço a pagar por ter dado um salto na natureza, ter se separado do animal para se transformar num ser dependente da função mãe.”

Geraldo Caldeira assegura que o indivíduo, quando tem caráter gentil, demonstra a gentileza na adversidade e, teoricamente, tem um modelo de saúde existencial (psicofísica) melhor, mais saudável. Ou seja, não vai tomar um monte de remédios, estar na sala do psiquiatra ou na fila para operar. Óbvio, dentro da normalidade. “Temos permanentemente três sistemas em equilíbrio. O sistema nervoso central , que faz parte do límbico, tem vários núcleos geradores das emoções, que o tempo todo estão em articulação e atuantes com o sistema imunitário (defesa do organismo) e o endócrino (produção de hormônios). Um influencia o outro e o que mantém o equilíbrio é o bom humor, que tem de passar pelo bom amor e pela gentileza. Por isso, quem é gentil tem saúde psicofísica muito boa.” O psicanalista enfatiza que a pessoa gentil transmite ao outro o reconhecimento de que ele é um ser significativo, bom e que merece atenção.

Já quem apenas assume um papel gentil, como no Natal e réveillon, Geraldo Caldeira enfatiza que a tentativa vai acabar nas conhecidas brigas e desentendimentos familiares típicos das comemorações e reuniões de fim de ano. “O gentil esporádico traz a esses encontros a hostilidade do ano, de viver às turras, e será mais comum ter atritos nesses festejos. Tudo aborrece quem não é gentil. Ser social, dar presentes e desejar boas-festas vão soar vazio. É a gentileza ilusória. Repetição. Se não é, melhor não fazer porque a expressão falsa vai se mostrar o contrário, e com frequência.”

DESARMA Aposentada depois de mais de três décadas de atuação, a psiquiatra Mary Ávila Abrahão Reis é mestre ao interpretar e praticar a gentileza. Ela ensina que “nas emergências as pessoas têm dificuldade de ser gentis por causa de uma necessidade imediata. Ao levar meu filho à escola pela manhã, o horário, o trânsito, o ímpeto é furar tudo. Mas é nessa hora que tenho de ser gentil. É difícil e é um exercício.” Ela lembra que somos postos à prova a todo momento. “É preciso exercitar. Acredito que as pessoas querem ser gentis, mas muitas vezes não se controlam diante da sua urgência.”

Observadora, Mary conta que é casada com um homem extremamente gentil, Luiz Fernando Abrahão Reis, o que a deixa encantada e a faz exercer ainda mais sua gentileza. “Quando eu não dirigia, observava como ele era atencioso no trânsito ao dar passagem e ceder a vez a outros carros. Acho também que a maturidade me deu capacidade de perceber ser gentil. A juventude não deixa, as emergências são prioridades. Com os anos, pude me dedicar mais.” Mas Mary assegura que gentileza se ensina. “Além do meu marido, meus filhos, adolescentes, Marina e Guilherme, têm atitudes gentis porque têm exemplos. E confesso que, por ser do interior, onde o dia tem 16 horas e não 10 como na capital, a pessoa nasce e vive gentil.”

 Mary Ávila, psiquiatra aposentada (Beto Novaes/EM/D.A Press)
Mary Ávila, psiquiatra aposentada


Mary concorda que, infelizmente, justo no fim do ano a gentileza some das relações ou fica escassa. “É triste. A pessoa corre para confraternizar, mas antes de chegar perde todas as chances de ser gentil. Vai buzinar, xingar, reclamar… É preciso ser gentil na vida e não só com data e hora marcadas. É gostoso, agradável e tão bom.” Ela conta que outro dia estava no supermercado com a sogra e percebeu uma senhora com dificuldades para colocar as compras na sacola. “Fui ajudá-la e ela se assustou, disse que não precisava. Mas aceitou. Quis levá-la até o carro, mas não deixou. Então, recuei. Outra situação é dar lugar a alguém no ônibus e receber olhares como se tivesse feito algo absurdo. A falta de prática assusta as pessoas, tanto para quem recebe ou observa a gentileza. Não deveria ser assim.”

Para Mary, a gentileza também tem a ver com educação. “Por respeito, dedicação e carinho, chamo os mais velhos por senhor e senhora. Mas, às vezes, me olham e sinto que soa como indelicadeza.” Nas percepções da psiquiatra, ela conta que notou que quando a gentileza é exercida num ambiente ou situação de tensão ou estresse “desarma as pessoas”. Por isso, ela a vê também como “generosidade, de não julgar ninguém e continuar sendo gentil”. E, ainda, que “a gentileza está presente na palavra, no ato de ligar para alguém que passa por um momento difícil para conversar.” Mary ensina que nada a impede de praticar a gentileza. “Ser gentil é fazer o bem com o outro e para você também. Gentileza é a disponibilidade que existe para a vida.”


Concurso estimula valores da gentileza

Você cumprimentou seu vizinho hoje de manhã? Desejou bom-dia ao porteiro ao cruzar com ele no saguão? Se respondeu positivamente, você está fazendo bem a sua saúde e a das pessoas que o cercam com ações gentis. Para premiá-lo, a Associação dos Empregados da Copasa (Aeco) promove, com apoio institucional da Copasa, o 3º Concurso de Redação e Desenho voltado para crianças e adolescentes. Das 527 redações e desenhos recebidos foram selecionados 120 por uma professora de português do Núcleo de Estudos Orientados e por Glauco Moraes, artista da Maison Escola de Artes. Na categoria Desenho, os participantes foram convidados a atender ao subtema “Gentileza urbana – o que podemos fazer para viver em um mundo melhor?”. Os 12 vencedores serão conhecidos amanhã.

Uma questão de escolha 

O fim de ano é tempo de confraternização, cordialidade e sorrisos. Mas traz também estresse e correria em meio a compras. A gentileza é o antídoto para manter o bem-estar


Lilian Monteiro


 (istockphoto)


O que ocorre com as pessoas no fim de ano? Fala-se tanto do “espírito natalino”, “da energia da virada de ano”, mas até chegar o dia das comemorações, das festas, das trocas de presentes e beijos, a vida parece mergulhada num caos. A correria contra o relógio é ainda maior, o estresse chega no grau máximo, problemas corriqueiros tomam outra dimensão, a chuva atrapalha, a temporada de compras vira tortura para carregar sacolas e enfrentar filas até na escada rolante, os engarrafamentos, se possível, ficam piores, e, nesse cenário, a irritação impera, a paciência vai para o espaço e a gentileza… Ah, a gentileza… Onde vai parar? Aliás, é possível aplicá-la mesmo à beira de um ataque de nervos?

Imaginem outro cenário. Onde todos fossem mais gentis. Motoristas cedendo passagem numa rua movimentada, alguém no ônibus lotado levantando-se para dar lugar a quem parece cansado, outro ajudando quem tem dificuldade para atravessar a rua, uma terceira cedendo a vez na fila do banco, outra disposta a carregar as sacolas para quem não tem mais mãos vazias, alguém segurando a porta do elevador para um estranho, ou, simplesmente, aqueles que se propõem a dar bom-dia, dizer obrigado.

Saibam que o professor residente e Ph.D em economia da Universidade de Harvard Sam Bowles, do Instituto Santa Fé, nos Estados Unidos, entidade sem fins lucrativos de pesquisa teórica e dedicada ao estudo e pesquisa multidisciplinar que amplia os limites do conhecimento científico, analisou sociedades antigas e constatou que a gentileza era componente fundamental para a sobrevivência delas. Além de ser mais felizes, ao cooperar e contribuir umas com as outras elas garantiam o bem-estar e viviam melhor. Desse estudo nasceu a teoria “sobrevivência do mais gentil”, que confirma a capacidade inata do ser humano para o altruísmo, o que mantém a espécie ao longo da história.

A gentileza regula as emoções, causa impacto positivo na saúde e manda para longe ressentimentos, raivas, dores, medos… É uma virtude. E, claro, não é fácil. Precisa praticar para se aperfeiçoar. O legal é que ser gentil é uma escolha. Uma opção por fazer a diferença na vida das pessoas. Para inspirá-los e livrá-los das garras do mau humor e das truculências do fim do ano, o Bem Viver apresenta exemplos de quem pratica a gentileza no dia a dia sem escolher quem, hora, data ou pagamento para ser cortês, cavalheiro, educado, polido, elegante, simpático, agradável… Enfim, gentil!

Atitude da alma

Pessoas comuns disseminam a gentileza por prazer. Postura faz parte de suas vidas para que se sintam plenas, felizes, sem esperar nada em troca


Lilian Monteiro




 Andréa Raydan, gerente comercial (Beto Novaes/EM/D.A Press  )
Andréa Raydan, gerente comercial


Figura singular da vida carioca, o “Profeta Gentileza”, sujeito de cabelos longos, barba branca, vestido de bata decorada com mensagens e levando nas mãos um estandarte com dizeres, isso lá nos anos 1970 até sua morte, em 1996, percorria o Rio de Janeiro e viajava pelas barcas do trajeto Rio-Niterói para pregar a cartilha de preceitos básicos da sua filosofia popular, da sua religiosidade e visão de mundo. Mergulhado em pensamentos, tratava de exaltar a gentileza. “Gentileza gera gentileza” e “Gentileza é o remédio de todos os males, amor e liberdade” são frases que seduz quem admira sua história.

Empresário, José da Trino – esse era seu nome – dizia atender um chamado. Largou tudo depois do trágico incêndio num circo norte-americano em Niterói, em 1961, no qual morreram 400 pessoas. Deixou tudo para trás e foi consolar as famílias das vítimas. Virou ícone. A partir de 1980, cobriu as 55 pilastras do Viaduto do Caju, na capital fluminense, com inscrições nas cores verde e amarelo criticando o mundo e dando conselhos. Ensinava que no lugar de “por favor” o correto seria “por gentileza”. Se de profeta e louco todos temos um pouco, por que não seguir um dos mandamentos de José da Trino?

Gentileza na alma e, consequentemente, na atitude. Assim é a matemática, física, professora e profissional atuante há 32 anos na área de direito previdenciário Joana Angélica de Oliveira. Um ser gentil na essência que quem tem a sorte de conhecer, conversar ou despertar sua atenção por instantes vai se sentir bem. Cantora, é contralto em festivais de coral, se aventura como atriz, fez curso de teatro, costura, pinta, tece. Ela se define como uma “pessoa que gosta da vida”.

Para Joana, “tudo tem um lugar na vida e devemos aprender com os lugares de cada um. O por favor, com licença, muito obrigada sempre foram regras dos meus pais, Nailza e Clemente. Gentileza é ter gratidão pelo processo da vida, que precisa ser compreendida. Ela não é boa nem má em si mesma, nós a fazemos boa, ainda que haja momentos de limitação para descobrirmos novas possibilidades”.

Joana enfatiza que a vida é um tabuleiro e não reclama. Sempre busca pelo espiritual em um tempo material. “Tenho de transcender. É muita correria, imediatismo e procuro ter gosto pelas coisas.” Ela reconhece que ser gentil não é fácil porque requer alguma renúncia. “Mas quem se autoconhece, que sabe que o outro tem os mesmos desejos, sonhos, vontades e direitos é gentil com naturalidade. É um aprendizado. Tem de querer e ter vontade de ser. Para isso, é preciso ser tocada pela vida, que é bela.”

A falta da gentileza, justamente no fim de ano, é interpretada por Joana de maneira sábia. Ela diz que as pessoas não reconhecem a festa interna e a grande angústia de todos nós é ver que o ano acabou e não fizemos nada do que queríamos. Aí, a compensação passa a ser material. “É preciso fazer uma terapia breve para perceber que somos iguais no trânsito parado, no supermercado abarrotado ou na imensa fila do banco. Tudo na vida é escolha e uma forma de crescimento.” Ela lembra que não vale viver aos borbotões e que a vida é um processo de autodesenvolvimento e autoevolução. “Conhecer e amadurecer as emoções é o desafio. Conviver em sociedade é aprimorar.”

Para Joana, tudo tem uma função na natureza. “Gentileza é um viés. O que tenho e posso ser e o que levo ao outro para ser tocado. Fácil? Para mim é, porque faço isso a vida toda. É até referência, é normal. Quem não é gentil não conhece a paz que essa atitude traz.” O recado de Joana é: em vez de reclamar, doe cinco segundos para refletir e perguntar a Deus, a si ou a quem quiser: o que preciso aprender. “É se colocar diante dos desafios e ver como pode resolvê-los. Querer mudar e enxergar o outro.”

CORAÇÃO A gerente comercial Andréa Cleilia Raydan assegura que gentileza se aprende no berço. “A lição veio dos meus pais, Dalmo e Lia. Eles me ensinaram a fazer o bem porque seria bom para mim. Sempre me falaram para ser gentil e sou assim desde pequena. Ainda criança, na minha cidade, Várzea da Palma, fazia questão de acompanhar os mais velhos ao posto de saúde. Carrego essa atitude ao longo da vida. Em casa até me chamam de ‘Madre Tereza de Calcutá’ por ajudar moradores de rua, mendigos, famílias carentes. Mas faço por prazer. Gosto, não tenho medo, converso, escuto, ajudo no que posso, tenho paciência. Penso no próximo.”

Andréa conta que não se deixa contaminar pelo mau humor, estresse e falta de educação das pessoas, seja pela desculpa da correria e pressão do fim do ano, ou em qualquer outro dia da sua vida. “Procuro me manter tranquila, apesar de ser agitada no trabalho. Não trato ninguém mal e me coloco no lugar do outro. Acho importante ser gentil não só com quem tem necessidade especial, idoso, cego, grávida, mas com todos, sem distinção. Não é obrigação. Faço para me sentir feliz e melhor. E não espero nada em troca. Às vezes, as pessoas não respondem ao meu bom-dia. Não me importo e não fico chateada, porque fiz a minha parte. É o meu jeito. Acredito que para praticar a gentileza é preciso ter o coração aberto.”