sábado, 9 de março de 2013

Rasgaram a Constituição -LUIZ FERNANDO PEZÃO


O Globo - 09/03/2013

A Lei 12.734, que muda as regras de distribuição
dos royalties do petróleo, alterando
contratos em vigor e acabando
com receitas garantidas, é uma
grande violência contra os estados produtores.
Responsável pela produção de mais de 80% do
petróleo brasileiro, o Rio não aceita essa violação
da Constituição Federal.

A Constituição de 1988 garante recursos específicos
a estados e municípios produtores de petróleo,
não como privilégio, mas como forma de compensar
os riscos ambientais próprios da atividade
de extração e refino do petróleo e repor em parte o
que o estado deixa de arrecadar com a taxação do
petróleo, que, ao contrário do que acontece com a
maioria dos produtos, não é pago ao estado que o
produz, mas ao estado que o consome.

Por isso, a decisão do Congresso Nacional de
derrubar o veto da presidente Dilma Rousseff representa
uma catástrofe econômica e social para
o nosso estado, já que o próprio estado e 87 das
suas 92 cidades deixarão de receber recursos que
lhes são imprescindíveis.

O Rio quebra. As perdas somam R$ 4,2 bilhões
só neste ano de 2013, contando o que cabe ao estado
e aos municípios. Até 2020, esse valor ultrapassa
R$ 75 bilhões.

Esses são recursos necessários para honrarmos
o pagamento de aposentados e pensionistas do
estado e para realizarmos os investimentos para
atender às demandas que temos em áreas fundamentais,
como infraestrutura, segurança e meio
ambiente. Isso sem falar no financiamento dos
eventos de grande porte que vamos receber, como
a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.

A nova lei desrespeita a Constituição, dentre
outras razões, por romper com o chamado “ato
jurídico perfeito”. Ela quebra contratos e viola o
equilíbrio orçamentário dos estados e municípios
produtores, como demonstrou a própria
presidente Dilma na sua justificativa ao vetá-la.

Caberá ao STF, que é o guardião da Constituição,
julgar as ações de inconstitucionalidade que
serão propostas contra essa lei assim que ela for
promulgada. Ele vai decidir o destino e o futuro
dos estados produtores. Tenho a confiança de que
os seus ministros não permitirão que a Constituição
seja rasgada em nome de uma falsa distribuição
igualitária de recursos, que pode levar estados
e municípios a uma guerra federativa de consequências
desastrosas e imprevisíveis. 

Luiz Fernando Pezão é vice-governador e
coordenador de Infraestrutura do RJ

Quadrinhos

folha de são paulo

CHICLETE COM BANANA      ANGELI

ANGELI
CHICLETE COM BANANA      ANGELI

ANGELI
PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE

LAERTE
DAIQUIRI      CACO GALHARDO

CACO GALHARDO
NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES

FERNANDO GONSALES
QUASE NADA      FÁBIO MOON E GABRIEL BÁ

FÁBIO MOON E GABRIEL BÁ
HAGAR      DIK BROWNE

DIK BROWNE

Laertevisão

folha de são paulo

João Montanaro - Charge


Charge


O difícil diagnóstico psiquiátrico - Julio Abramczyk

folha de são paulo

Diagnosticar doença mental parece fácil, mas, para o médico, é bem complicado. Pesquisadores da área querem retirar parâmetros subjetivos ou comportamentais desse diagnóstico, substituindo-os por marcadores biológicos.
Querem descobrir um exame tão exato quanto o de sangue para o diabetes ou a radiografia de tórax para a pneumonia.
Em editorial na revista canadense "Journal of Psychiatry & Neuroscience", a professora Patricia Boksa, da Universidade McGill, no Canadá, mostra os desafios para identificar esses biomarcadores.
Ela cita estudo de P. J. Benson e colaboradores no "Biological Psychiatry", no qual são mostrados testes para detectar anormalidades no movimento ocular e diferenciar casos de esquizofrenia.
A professora lembra da possível confusão, nesse teste, não só com outras doenças psiquiátricas mas com problemas neurológicos.
Os movimentos dos olhos têm por base funções complexas, e anormalidades em áreas cerebrais podem eventualmente ser encontradas.
Por outro lado, exames objetivos vêm permitindo identificar precocemente doenças mentais como o alzheimer.
Para essa demência, a análise do líquido cefalorraquidiano e os exames radiológicos, como a tomografia computadorizada, vêm permitindo a detecção precoce da afecção, anteriormente apenas identificada pós-morte, ao exame anatomopatológico do cérebro.
Julio Abramczyk
Julio Abramczyk, médico formado pela Escola Paulista de Medicina/Unifesp, faz parte do corpo clínico do Hospital Santa Catarina, onde foi diretor-clínico. Na Folha desde 1960, já publicou mais de 2.500 artigos. Escreve aos sábados na seção 'Saúde'

Entrevista Suketu Mehta

folha de são paulo

Favelas brasileiras são mais agradáveis, mas têm violência
PARA JORNALISTA E ESCRITOR INDIANO, OCUPAÇÕES IRREGULARES DE SEU PAÍS TÊM MENOS ESTRUTURA, MAS, SEM A PRESENÇA DE ARMAS E DROGAS, SÃO MAIS SEGURAS
ROGÉRIO DAFLONCOLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DO RIOAutor de "Bombaim, Cidade Máxima", Suketu Mehta diz que o crescimento econômico da Índia transformou a cidade em que viveu -hoje chamada Mumbai- num canteiro desordenado de obras e que os aglomerados urbanos podem ter problemas pela falta ou pelo excesso de dinheiro.
"Há uma febre especulativa no setor imobiliário e os preços dos imóveis quintuplicaram. O mercado viola toda e qualquer lei que restringe sua ação. Tornou-se quase impossível caminhar", diz o escritor e jornalista.
O caos urbano faz aumentar a violência e por isso, diz ele, o desafio dos próximos anos é redistribuir a renda.
Segundo ele, as "favelas brasileiras são mais agradáveis, limpas e mais bem construídas", mas mais violentas que as de seu país. "Dada a ausência de drogas e armas, é normalmente seguro andar nas favelas indianas."
Mehta esteve no Rio na semana passada para o seminário "Arquitetura, cidade, metrópole: democratizar cidades sustentáveis", no Instituto dos Arquitetos do Brasil.
-
Folha - Em seu livro, o sr. diz que entre os rótulos de moribunda e assassina atribuídos a Mumbai, considera o de moribunda inadequado. Por quê?
Suketu Mehta - Há muita miséria, a corrupção está impregnada em todos os níveis, o transporte público é péssimo, mas um milhão de pessoas migram todos os anos para Mumbai. Elas enfrentam problemas urbanos sérios, mas ainda assim são atraídas pela cidade.
Há uma grande energia e as melhores oportunidades disponíveis na Índia. Qualquer um pode encontrar emprego, ninguém morre de fome e é possível enviar dinheiro para os familiares que ficaram nas vilas [áreas mais rurais].
O sr. viveu muitos anos no exterior. Que transformações em Mumbai achou mais gritantes?
Há agora uma febre especulativa no setor imobiliário e os preços dos imóveis quintuplicaram. O mercado viola toda e qualquer lei que restringe sua ação. Os capitais globais chegaram.
Uma cidade pode ter problemas tanto pela falta como pelo excesso de dinheiro.
Mumbai agora padece dos problemas associados ao excesso: há especulação por toda parte, muitos canteiros de obras, e tornou-se quase impossível caminhar.
As calçadas se tornaram lugares disputadíssimos e muitos são forçados a andar nas pistas, entre centenas de carros. As cidades indianas estão sendo destruídas pelos automóveis e, em vez de investir no transporte público, o Estado insiste no privado.
Mumbai é um pesadelo, mas as pessoas não param de chegar, tanto as pobres como as ricas. Eu me pergunto: como uma cidade tão desagradável atrai tanta gente?
No Brasil, projetos de urbanização das favelas são descontínuos, mas existem. Como isso se dá na Índia, onde divisões religiosas e de casta parecem legitimar desigualdades sociais e espaciais?
Em Mumbai, existe uma lei que estabelece que, se 70% das pessoas de uma favela concordarem, ela pode ser demolida, independentemente da vontade dos demais 30%.
O governo então cria moradias, mas com frequência essas pessoas são transferidas para lugares distantes ou realocadas para uma parte menor do espaço originalmente ocupado pela favela.
O senso de comunidade é perdido e a violência sobe. Além disso, as novas habitações são de péssima qualidade, construídas com material barato. O terreno desocupado é então liberado para o mercado e a especulação.
Algo que pode parecer inusitado para quem não conhece Mumbai é saber que 60% das pessoas na cidade vivem em favelas e muitas delas pertencem à classe média. São médicos, engenheiros etc.
As favelas brasileiras são mais agradáveis, limpas e mais bem construídas. É assustador constatar que mesmo aquelas que estão sob controle dos traficantes são mais bem equipadas e atendidas do que as que estão sob controle do Estado na Índia.
Nas favelas brasileiras, a violência é associada à presença de armas e ao tráfico de drogas. Como é a violência nas favelas indianas?
Estive no Brasil quatro vezes. Nas visitas, passei uma semana indo a favelas como a Rocinha e o Complexo do Alemão. Noto que a grande diferença diz respeito justamente à presença de drogas e armas.
Na Índia, a violência é de caráter político e religioso, entre castas, entre muçulmanos e hindus, entre nativos e imigrantes. Mas, dada a ausência de drogas e armas, é normalmente seguro andar nas favelas indianas.
As favelas da Índia que, nesse aspecto, se assemelham às brasileiras ficam no interior do país e hoje são controladas pelos Maoistas, ou Naxalitas, que não permitem a entrada do Estado.
O sr. pode fazer uma comparação entre as áreas mais degradadas do Rio, Mumbai e Nova York, onde o sr. vive?
Nesse momento estou escrevendo um livro sobre Nova York. A cidade teve melhorias dramáticas nas últimas décadas. No entanto, trata-se de uma das cidades mais desiguais na América do Norte.
Para se ter uma ideia, em Nova York o 1% mais rico ganha mais em um dia do que os 44% mais pobres ganham em um ano inteiro de trabalho. Manhattan se tornou um playground para os ricos globais e os pobres foram expulsos. Os negros, por exemplo, estão migrando para lugares como Atlanta.
Na Índia as divisões religiosas e entre castas explicam a maior parte da discriminação social e espacial. Quais são as clivagens sociais mais importantes no Brasil e nos EUA?
Nos EUA, é a desigualdade de renda. No Brasil, o que mais chama atenção são as desigualdades raciais.
As favelas são predominantemente negras, as posições de prestígio na sociedade brasileira não são ocupadas por eles, que estão em sua maioria ausentes nas universidades, na mídia e nas empresas.
O sr. crê que os elevados índices de crescimento econômico estão contribuindo para elevar a qualidade de vida de todos os indianos ou beneficiam apenas a elite?
Por muitas décadas as taxas de crescimento da Índia foram muito baixas. De repente, atingem quase 10% ao ano.
Se você observar a história da Índia desde a independência verá que ela foi marcada por uma imensa transferência de poder. A democracia trouxe o sufrágio para todos e, diferentemente de países como os EUA, na Índia os pobres votam e os ricos não.
Há muitos políticos de castas baixas. Apesar de 82% da população ser hindu, o primeiro-ministro é sikh [religião monoteísta], a presidenta é uma mulher, o líder da coalizão do governo é um católico italiano.
Ocorre que essa divisão do poder contrasta com o fato de que a riqueza não está sendo repartida. Por isso, o desafio dos próximos anos é redistribuir a renda, e isso é uma questão até mesmo de sobrevivência para os ricos.
Nesse momento, as pessoas ainda podem migrar para cidades como Mumbai e encontrar outras opções que não a violência.
A visão da prosperidade dos ricos e a ocidentalização, porém, estão gerando inquietação social entre os pobres.
Uma religião que prega o conformismo não está mais segurando a insatisfação diante das desigualdades.
No seu livro, o sr. menciona que aprendeu a ver além das ruínas da cidade física e enxergar a força vital incandescente dos seus residentes. Quais conselhos daria a alguém que deseja conhecer a força vital das cidades?
O fenômeno mais importante em curso hoje no mundo é a migração das áreas rurais, das vilas, para as cidades. Isso em lugares como a África, América, Ásia...
Na Índia, a maioria das pessoas ainda vive em vilas, mais isso está prestes a mudar. E há algo nas cidades que ultrapassa em muito a questão apenas econômica: as pessoas encontram liberdade para casar com quem quiser, assistir a um filme, fazer escolhas.
Há pouca liberdade individual nas vilas, e a vitalidade das cidades está justamente nessa conquista da liberdade.

    FRASES
    "As favelas brasileiras são mais agradáveis, limpas e mais bem construídas. É assustador constatar que mesmo aquelas que estão sob controle dos traficantes são mais bem equipadas e atendidas do que as que estão sob controle do Estado na Índia"
    "A grande diferença [nas favelas brasileiras] diz respeito justamente à presença de drogas e armas. Na Índia, a violência é de caráter político e religioso, entre castas, entre muçulmanos e hindus, entre nativos e imigrantes. Mas, dada a ausência de drogas e armas, é normalmente seguro andar nas favelas indianas"


    RAIO X - SUKETU MEHTA
    VIDA
    Jornalista e escritor, nasceu em Calcutá, na Índia, em 1963, mas fixou-se em Bombaim (atual Mumbai). Mudou-se com a família para Nova York e retornou a Mumbai 21 anos depois
    OBRA
    "Bombaim, Cidade Máxima", sobre o cotidiano de uma das cidades mais populosas do mundo

      Walter Ceneviva

      folha de são paulo

      Significado jurídico de Chávez
      A Venezuela pode ter boa ligação com o Brasil, mas o relacionamento passará por necessária reavaliação
      A MORTE de Hugo Chávez gera preocupações quanto às mudanças que dela decorrerão em seu país e nas relações externas. Terminou o governo que, por quatorze anos, controlou todo raio de ação da realidade venezuelana.
      O Brasil tem interesse em manter em bom nível a relação com o novo governo. Não faz exceção à regra. Mas como será?
      Três questões chamam atenção. A primeira é chamada internacionalização da Amazônia que, ao menos em tese, pode encontrar eco entre nossos vizinhos da área, mas a cujo respeito o Brasil tem forte posição contrária.
      A segunda está relacionada, em parte, ao Mercosul. A institucionalização do Cone Sul não tem encontrado soluções duradouras rápidas para problemas surgidos na passagem das fronteiras. A integração econômica, política, social e cultural não atingiu a velocidade desejada pelos idealistas que inseriram esse programa no parágrafo único do art. 4º da Constituição.
      Especificamente no que se refere à Venezuela, a aproximação por via terrestre ou fluvial poderá, no futuro, ampliar a relação dos dois vizinhos. Talvez um pouco da experiência do Mercosul seja útil.
      A Venezuela chama atenção em parte pela enorme riqueza em petróleo, cujo significado econômico e político é de interesse recíproco.
      O país pode ter boa ligação com o Brasil. Será ampliada a comunicação rodoviária ao norte de Manaus, no rumo final de Caracas, praticável sem as chuvas.
      Nada obstante a proximidade, o relacionamento passará por necessária reavaliação. Depende do realinhamento dos líderes no grupo de Chávez como adaptação à nova realidade. A forma jurídica das soluções terá influência, mas não se confundirá com o ajuste direto dos interesses comerciais recíprocos.
      Há, ainda, a busca de soluções do interesse dos países ao longo da linha equatorial, abaixo e acima dela. A questão foi enfrentada pela primeira vez em 1978, com a assinatura do Tratado da Cooperação Amazônica, para a bacia do Amazonas e de seus afluentes. De tempos em tempos, fala-se desse assunto, mas sem grande divulgação.
      As condições brasileiras da região foram substancialmente alteradas, em Mato Grosso, Tocantins até o Atlântico, modificando a ideia de cooperação.
      Muito embora se reconheça que a soberania nacional tem influência no diálogo continental, a convicção sobre o interesse comum tende a se ampliar.
      Na região equatorial, a convicção das posições relativamente próximas tem como exemplo a estrada entre o Brasil e o litoral peruano, que permite o acesso brasileiro ao Pacífico.
      Nos países da América Latina, de um modo geral, a tradição histórica manteve a estrutura de comando nas mãos de uns poucos, frequentemente apoiados pelas forças armadas, dividindo os atos de governo entre eles. Nesses países -quer a Constituição seja a expressão média das tendências da maioria, quer seja uma hipocrisia ditatorial para efeitos publicitários-, a ação do Estado ainda se confunde muito com pessoas que dominam o poder.
      A democracia é o ideal a ser buscado, mas a visão planetária mostra que a verdadeira democracia -exemplo do Brasil de hoje- é minoritária. Nosso país terá de se haver com todas alternativas. É o preço de seu crescimento.


      LIVROS JURÍDICOS
      COLEÇÃO DIREITO, DESENVOLVIMENTO E JUSTIÇA
      AUTORES Vários
      EDITORA DireitoGV e Saraiva (0/xx/11/3613-3344)
      Inclui obras coletivas: "Pensar o Brasil" (R$ 102, 424 págs.), organizado por José Roberto Rodriguez, discute os problemas nacionais e o direito em visão atual; "Dogmática é Conflito" (R$ 52, 252 págs.), organizado por Rodriguez e outros, traz uma visão crítica da racionalidade jurídica.
      OS FUNDAMENTOS ÉTICOS DA CULTURA JURÍDICA OCIDENTAL
      AUTOR Marcelo Maciel Ramos
      EDITORA Alameda (0/xx/11/3012-2400)
      QUANTO R$ 48 (298 págs.)
      Ramos vai dos gregos aos cristãos, com belo prefácio de José Luiz Borges Horta. As 20 páginas finais a contar da 269 talvez devam ser lidas antes do corpo da obra, para compreender o conceito de "resgate dos elementos culturais da civilização ocidental".
      RELAÇÕES HOMOAFETIVAS: DIREITOS E CONQUISTAS
      AUTORA Ana Brúsolo Gerbase
      EDITORA Edipro (0/xx/11/3107-4788)
      QUANTO R$ 55 (240 págs.)
      Atenção para o subtítulo "Adoções Homoafetivas" e prefácio de Maria Berenice Dias. Há, ainda, trabalhos de Silvana Monte Moreira, Marcelo Napolitano e Flavio Fahur. No fim, projetos de lei, anteprojeto do estatuto da diversidade sexual e de emenda constitucional.
      CONVÊNIOS ADMINISTRATIVOS
      AUTOR Gustavo Alexandre Magalhães
      EDITORA Atlas (0/xx/11/3357-9144)
      QUANTO R$ 79 (384 págs.)
      O autor define o conjunto dessa obra no subtítulo: "aspectos polêmicos e análise crítica de seu regime jurídico". O público alvo reúne os que negociam com a administração e os que têm interesse na área, em todos os níveis. Princípios e fundamentos constitucionais têm especial atenção.
      O EMPRESÁRIO DE RESPONSABILIDADE LIMITADA
      AUTOR Paulo Leonardo Vilela Cardoso
      EDITORA Saraiva
      QUANTO R$ 38 (150 págs.)
      O prefácio acentua a participação do escritor no projeto que antecedeu a lei 12.441/11 e seus efeitos para o empresário do título.
      ASSÉDIO MORAL, DISCRIMINAÇÃO, IGUALDADE E OPORTUNIDADES NO TRABALHO
      AUTOR Aparecido Inácio Ferrari de Medeiros
      EDITORA LTr (0/xx/11/2167-1100)
      QUANTO R$ 35 (116 págs.)
      Traz o resultado das vivências do advogado militante.

        Xico Sá

        folha de são paulo

        Só a Lampions League salva
        Atualmente nem o Pacheco tem mais motivos para se ufanar deste país. Creio que nem a Velhinha de Taubaté
        Amigo torcedor, amigo secador, só a Lampions League salva a essa altura da barbárie. É assim que o empolgante torneio do país é chamado nas melhores bodegas da região e nas redes sociais. A Lampions que tem o Asa de Arapiraca e o Campinense na disputa. Passaram por cima de Bahia, Vitória, Sport, Santa Cruz, Fortaleza, Ceará, as potências favoritas.
        No contraponto da Lampions, a lambança e o jangucismo escancarado. Como se ufanar desse país, meu caro conde Afonso Celso? Nem o Pacheco tem mais motivos. Creio que nem mesmo a Velhinha de Taubaté se viva fosse. A respeitável senhora, não sei se você lembra da personagem de Luis Fernando Veríssimo, acreditava piamente no governo Sarney, entre outras assombrações da velha ou nova República.
        Repare só o que temos que ouvir, camarada: "Eu já empurrei jogador para a seleção brasileira, dando comissão", disse o presidente do Sport do Recife, Luciano Bivar, em entrevista à rádio Transamérica. Como se fosse a coisa mais corriqueira do mundo. Sem susto. Como quem comenta banalmente sobre o tempo.
        O cartola falava de Leomar, bravo volante da canarinha na era do técnico Leão, início dos 2000. No comando da CBF, ele, Ricardo Teixeira. Todo mundo nega. O deputado Romário (PSB-RJ), porém, está empolgado. A confissão confirma o que sempre denunciou: o cartel das convocações. Quer CPI urgente.
        É crise técnica -não temos time- e lama moral no pescoço, como na tempestade de ontem em São Paulo. Na direção dos trabalhos, um José Maria Marin que foge como o diabo de perguntas sobre a morte do jornalista Vladimir Herzog. É suspeito de colaborar com a ditadura militar no episódio. Veja o perfil, dona Dilma, do homem da Copa-14. Quero ver é agora.
        Só a Lampions salva. Repare também, amigo, no comportamento das uniformizadas nas viagens com seus clubes na Libertadores. Vai a do Corinthians e provoca aquela tragédia de Oruro. Vai a do Palmeiras e dá vexame no aeroporto de Buenos Aires.
        Agora uma rápida vinheta histórica. Em rolê recente com Mano Brown pela cidade, ele me lembrava da importância política que já tiveram as organizadas, como a Jovem, do Santos, time do rapper. Corta para uma cena de 1979: a torcida abre faixa gigante no Pacaembu pela "Anistia ampla, geral e irrestrita". A PM imediatamente reprimiu alguns responsáveis pelo protesto. Quero ver é agora. Isso bem antes de outro movimento importante, a Democracia Corintiana, com doutor Sócrates e grande elenco, nos anos 1980.
        Só a Lampions salva. E se o Asa for campeão, como previsto na música do Chico e do Francis Hime? A Raposa é osso e quer o título.
        O primeiro embate é amanhã, na terra do Fumo. Aí sim é um torneio onde os fracos não têm vez.

        Marcos Caramuru de Paiva

        folha de são paulo

        Confiança: um bem escasso
        Se o chinês moderno acompanhar outros países, vai ver que confiança em política é um bem escasso
        Neste mês de março, o Congresso do Povo nomeia o novo governo chinês. Muitos se perguntarão, no exterior, o que acontecerá com a política econômica. A resposta possível no momento ainda é vaga: as mudanças serão mais profundas do que as realizadas nos últimos anos, sem alterações radicais no curtíssimo prazo.
        Ansiedades externas à parte, como dizia Tip O'Neil, legendário porta-voz do Congresso americano, toda política é local. Assim, é lícito averiguar que expectativas nutre o cidadão moderno chinês quanto aos seus futuros líderes.
        Quem indagar a pessoas de classe média urbana como veem os temas da sociedade possivelmente acabará concluindo que a demanda latente é por maior confiança nos governantes.
        Desde que a política de abertura se iniciou, há 35 anos, o mais forte fator a gerar confiança na China foi o crescimento com baixa inflação.
        Continuará sendo. Não é de surpreender que, em seu primeiro dia, o Congresso do Povo tenha tratado do assunto: o crescimento previsto para 2013 é de 7,5%, a inflação projetada, 3,5% e o deficit fiscal, 2% do PIB. Ou seja, haverá espaço para estímulos governamentais se o crescimento faltar.
        Numa sociedade onde o crescimento é dado como certo e ninguém duvida que o governo fará tudo para gerar emprego, as pessoas começam a olhar os bens comuns, aqueles que a riqueza individual não pode comprar.
        De uma maneira geral, o cidadão chinês de classe média urbana orgulha-se de gastar com a educação do filho único, ajustou-se à saúde paga, sente-se seguro e acredita na polícia.
        Sua preocupação mais recente é com a poluição. Em Pequim, durante o mês de janeiro, apenas por cinco dias a poluição e o "fog" deram alívio aos residentes.
        Outro tema que incomoda é a corrupção. O Partido, aliás, tem falado muito dele. Outro, as opções de investimento. Todo chinês que tem salário ou renda poupa e busca ter retornos maiores de suas aplicações.
        Finalmente, o cidadão parece querer menos tributos e menos heterodoxia nas políticas. Eis um exemplo: as famílias recentemente têm feito mirabolâncias para circundar uma legislação que taxa em 20% o ganho de capital com a venda de imóveis.
        Os casais estão se divorciando para gozar da vantagem dada aos proprietários de um único imóvel de vendê-lo sem imposto. Recasam-se em seguida. Em Xangai, os funcionários do cartório que produz os certificados de divórcio dizem que os primeiros casais simulavam desentendimentos. Agora vão direto ao ponto.
        O novo governo terá que combinar um ambicioso projeto de redução da pobreza rural (a meta é urbanizar 400 milhões de pessoas em dez anos), novos rumos para uma economia -que gera grandes expectativas- e, sobretudo, respostas à grande classe média urbana.
        A bem da verdade, se o chinês educado moderno acompanhar a realidade da Itália e dos demais países europeus, as discussões partidárias americanas e o sempre frágil quadro japonês, vai se dar conta de que confiança em política é um bem escasso no mundo de hoje. Mas isso não reduzirá a sua expectativa por dias melhores.

          Criadora de cadastro social ironiza tentativa de 'reescrever a história'

          folha de são paulo

          Ex-ministra Wanda Engel afirma que em 2002 Cadastro Único já incluía 7,5 milhões de famílias
          Engel diz que banco de dados foi 'muito bem' conduzido sob Lula e que a atual gestão 'avançou muito'
          JOÃO CARLOS MAGALHÃESFERNANDA ODILLADE BRASÍLIAWanda Engel está achando "ótima" a disputa entre tucanos e petistas pela paternidade do Cadastro Único de programas sociais federais, criado por ela quando ministra da Secretaria de Assistência Social na segunda gestão de Fernando Henrique Cardoso.
          "É ótima. Há um tempo essa não era nem uma questão no centro das atenções políticas", disse ela sobre o cadastro, lembrando que, no início do governo Lula, a prioridade era o Fome Zero, e não as transferências de renda alavancadas pelo cadastro.
          Nele estão reunidas hoje informações de mais de 23 milhões de famílias de baixa renda (algo em torno de 40% da população brasileira).
          Uma ferramenta de gestão de políticas públicas, ele veio à superfície do debate sobre o fim da miséria após uma nova expansão do Bolsa Família realizada em fevereiro.
          A ação zerou o número de miseráveis no cadastro, levando assim à erradicação da "miséria cadastrada". Com base nesse resultado, o governo passou a usar o slogan "O Fim da Miséria é só um Começo", provável mote eleitoral de Dilma no ano que vem.
          Foi o suficiente para que a presidente e um de seus prováveis rivais em 2014, o senador tucano Aécio Neves (MG), trocassem nas últimas semanas críticas sobre quem afinal criou o cadastro.
          POLÊMICA
          "Criamos um cadastro, porque não existia cadastro. É conversa que tinha cadastro", disse Dilma na semana passada. Aécio retrucou que Dilma precisa "respeitar o passado" e o PSDB entrou com um pedido via Lei de Acesso à Informação para obter dados provando que o cadastro funcionava antes do início do governo Lula.
          Para Engel, "as pessoas gostam de reescrever a história". "Antes, ninguém dava bola para isso. Aí começaram a dar bola e todo mundo quer ser o pai da criança. Tanto o cadastro quanto o cartão [para pagamento de programas] foram [inventados] de 2000 a 2002 [no governo FHC]".
          O decreto 3.877, de julho de 2001, penúltimo ano do governo tucano, é claro em seu objeto: "Institui o Cadastramento Único para Programas Sociais do governo federal".
          A própria Tereza Campello, ministra do Desenvolvimento Social, agradeceu no ano retrasado em discurso aos "muitos que, ao longo da história, ajudaram a construir o cadastro, como é o caso da professora Wanda Engel". Nesta semana, Campello não negou a existência do cadastro antes do PT, mas disse que ele era "insuficiente para dar conta de um programa [Bolsa Família] que pretendia ter escala nacional".
          Engel conta que, mesmo "sem dinheiro" e "com falhas", o cadastro incluiu 7,5 milhões de famílias até o final de 2002. "[Não digo que] estava perfeito nem que ele estava universal. Mas a pavimentação estava feita."
          Apesar de criado em 2001, foi nos dez anos petistas que o banco de dados ganhou seu atual gigantismo, sendo aperfeiçoado consecutivamente por diversas alterações -está hoje em sua sétima versão.
          Com base em pesquisas sobre o impacto das políticas gerenciadas a partir do cadastro, especialistas são unânimes em dizer que ele é um dos mais precisos do mundo.
          Engel diz que o cadastro foi "muito bem levado". "A evolução foi extremamente positiva. Não quero de jeito nenhum brigar com a ministra [Campello]. Acho que ela avançou muito." Segundo ela, que após o governo voltou ao Banco Interamericano de Desenvolvimento e trabalhou no Instituto Unibanco, o cadastro se tornou "um herói" no combate à miséria.

            Painel - Vera Magalhães

            folha de são paulo

            A variável paulista
            Com desembarque em São Paulo marcado para o dia 25, Aécio Neves deve intensificar nas próximas semanas os acenos para José Serra, que ainda não confirmou presença na palestra do mineiro no congresso estadual do PSDB. "Serra vai estar conosco. Ele é detentor de um patrimônio extraordinário, e terá um papel fundamental em 2014", afirma o senador. Enquanto a ala serrista ainda hesita, Aécio dá como certo o aval de Geraldo Alckmin, além do já público apoio de FHC.
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            Bolo de rolo Em reuniões no interior paulista, o PPS começa a discutir a aproximação com o PSB de Eduardo Campos. As caravanas, que chegam neste fim de semana a Votuporanga e Ribeirão Preto, são lideradas por deputados da sigla, tradicional aliada do PSDB no Estado.
            Na real O partido de Marina Silva lançará cartilha para os 6.000 ativistas cadastrados. Como a meta é atingir 500 mil assinaturas até outubro, um texto alerta: "Não perca tempo com ações secundárias. Nosso objetivo prioritário é coleta de assinaturas, e o tempo é curto. Tenha isso sempre em mente."
            Esse cara... Dilma Rousseff e Lula se reuniram durante quatro horas em Caracas com o embaixador da Venezuela no Brasil, Maximilien Arveláiz. Discutiram o cenário pós-Hugo Chávez e ofereceram ajuda ao futuro governo.
            ... sou eu Segundo interlocutores, Max, como é conhecido, será a principal ponte do governo brasileiro com Nicolás Maduro. Além de ter a simpatia do marqueteiro João Santana, o embaixador é amigo de José Dirceu.
            Pela... Advogado de Duda Mendonça, Antonio Carlos de Almeida Castro contestou no STF (Supremo Tribunal Federal) parecer de Roberto Gurgel contrário à liberação de seus bens. O publicitário foi absolvido no mensalão, mas a corte só deve desbloquear seu patrimônio após a publicação do acórdão.
            ... ordem No texto, Kakay afirma que o procurador-geral da República, ao citar a possibilidade de mudança do julgamento para manter o bloqueio, "ousa atentar contra o direito à liberdade e contra uma declaração de inocência subscrita pela mais alta Corte de Justiça do país".
            Antídoto 1 O tom do pronunciamento de Dilma ontem em rede nacional de TV foi calibrado à tensão do governo federal com a perspectiva de inflação acima da meta e corrosão do poder de compra dos salários em 2014.
            Antídoto 2 A presidente havia dito a empresários que anunciaria a desoneração da cesta básica em maio, no Dia do Trabalho. O pico de preços do IPCA, contudo, levou o governo a antecipar a medida.
            50 tons A petista trocou o vermelho, contestado pelo PSDB em representação ao Ministério Público, pelo cinza em seu figurino televisivo.
            Continua lindo Ministros do governo apostam que o plenário do STF repetirá a divisão geográfica do Congresso ao analisar a polêmica dos royalties do petróleo. Luiz Fux, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio Mello, que têm laços com o Rio de Janeiro, são tidos como contrários à redistribuição dos recursos.
            Escalação Fernando Haddad instalará seu "Conselhão" no dia 26, data em que pretende apresentar o repaginado Plano de Metas do mandato. O colegiado, composto por 100 integrantes, fará quatro plenárias anuais.
            PIB Já o Conselhão de Geraldo Alckmin, com cinco câmaras temáticas, terá sua reunião inaugural na segunda-feira. Participarão 90 personalidades entre empresários -como Paulo Skaf e Marcelo Odebrecht- e sindicalistas. Na ocasião será lançado o Plano Paulista de Incentivo à Competitividade.
            Tucanocídio Em clima nada amistoso, três tucanos disputam a vice-presidência da Assembleia paulista: Fernando Capez, Maria Lúcia Amary e Roberto Engler. A eleição ocorre na sexta-feira.
            com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
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            TIROTEIO
            "Devemos mudar o nome da Comissão de Direitos Humanos. O certo agora é chamá-la de Omissão. Caiu o 'C', de credibilidade."
            DO DEPUTADO CHICO ALENCAR (PSOL-RJ), sobre a eleição de Marco Feliciano (PSC), acusado de homofobia e racismo, para o colegiado da Câmara.
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            CONTRAPONTO
            Medida certa
            José Eduardo Cardozo deixava o Senado após audiência quando foi abordado por jornalistas para uma entrevista coletiva. Em dado momento, um cinegrafista observou que o ministro da Justiça usava pulseira preta e quis saber se era luto pela morte de Hugo Chávez.
            Cardozo, então, explicou:
            -Não. Estou usando é para emagrecer mesmo! Ela marca e controla meus passos.

              A igreja precisa se modernizar? Dom Krieger: Sim! e Mons. Ancona Opus Dei:Não! Tendências/debates

              folha de são paulo

              DOM MURILO KRIEGER
              TENDÊNCIAS/DEBATES
              A igreja precisa se modernizar?
              SIM
              A obrigação de atingir corações
              Antes de afirmar que a igreja precisa se modernizar, penso ser necessário responder a uma pergunta que é fundamental: Qual é a missão da igreja?
              Ao longo de sua pregação, Jesus deixou claro que sua mensagem não era apenas para o povo de Israel, mas que o dom que estava trazendo era destinado a todo o mundo e a todos os tempos.
              Após sua ressurreição, confiou essa missão aos apóstolos, que teriam a responsabilidade de fazer discípulos todos os povos. Para garantir que a salvação atingisse a todos, Jesus legou à igreja o memorial da Páscoa, que deveria ser celebrado sem interrupção, até a sua vinda gloriosa (cf. 1Cor 11,26).
              Os apóstolos, contudo, eram limitados demais para concretizar tão altos sonhos. Jesus os tranquilizou, garantindo-lhes a assistência do Espírito Santo: ele é que atualizaria geográfica e cronologicamente a obra de salvação.
              O Livro dos Atos dos Apóstolos testemunha como se deu, já nos primeiros tempos do cristianismo, a compenetração entre a ação do Espírito Santo, os enviados de Cristo e as primeiras comunidades que começavam a ser formadas.
              Essa atualização contínua da presença viva de Jesus no meio de seu povo tem o nome de tradição.
              Dito tudo isso de outra forma: a igreja é portadora de um patrimônio que não é dela, mas de Cristo. Fazem parte desse patrimônio a palavra de Deus, os sacramentos, especialmente a eucaristia, a unidade em torno de Pedro e seus sucessores, os escritos dos Padres da Igreja (teólogos dos primeiros séculos), os ensinamentos do magistério, o testemunho dos santos e, particularmente, dos mártires, a devoção mariana, as escolas de oração etc.
              Feitas essas colocações, volto à pergunta proposta: A igreja precisa se modernizar? Não tenho dúvida em afirmar: sim, precisa.
              Ela deve descobrir meios adequados para transmitir a todos os homens e mulheres, de cada tempo e lugar, o patrimônio que recebeu. Do direito que tem cada ser humano de entrar em contato com a proposta de Jesus Cristo nasce o grave dever, da parte dos que já são seus discípulos missionários, de transmitir aos demais a graça que receberam.
              A garantia da ação do Espírito Santo na igreja, longe de nos acomodar deve nos levar a ser criativos, inquietos e ousados. Afinal, os atuais meios de comunicação e tecnológicos, que nos permitem entrar no recinto privado das pessoas, especialmente em suas casas, onde de outro modo não conseguiríamos entrar, e atingir corações aos quais não teríamos acesso, são fruto da inteligência humana -inteligência que é dom do Criador. Usá-los, bem como utilizar tudo aquilo que o progresso técnico coloca à disposição dos cristãos, mais do que uma possibilidade é uma obrigação.
              Essa modernização não nos dispensará do essencial: a busca da santidade e o respeito aos valores que fazem parte do núcleo do patrimônio deixado por Jesus Cristo, como, por exemplo, o reconhecimento da dignidade da pessoa humana, a defesa da vida, desde sua concepção até o seu término natural, a indissolubilidade do matrimônio, a valorização da família etc.
              Por fim, é importante ressaltar que -e aqui está o grande legado que o papa Bento 16 deixou à igreja, uma vez que seu pontificado se baseou na contínua reafirmação dessa certeza-, mais do que uma doutrina, somos chamados a anunciar uma pessoa: Jesus de Nazaré, o filho de Deus vivo, que morreu e ressuscitou e que, no final dos tempos, virá para julgar os vivos e os mortos.
              Conhecê-lo é uma graça; viver segundo ele viveu, uma possibilidade, e anunciá-lo, um privilégio.


              MONSENHOR VICENTE ANCONA
              TENDÊNCIAS/DEBATES
              A igreja precisa se modernizar?
              NÃO
              O concílio já modernizou a igreja
              Fomos surpreendidos na manhã do dia 11 de fevereiro. Bento 16 (logo ele!), rompendo uma tradição de 600 anos, anunciou que iria renunciar. Voltou-se a viver um clima parecido ao do Concílio Vaticano 2º, no qual a mídia discutia diariamente questões teológicas e morais.
              Diz-se que a igreja está encolhendo e em trajetória de extinção. Por que então a figura do papa ainda desperta tanto interesse? Talvez a resposta esteja na própria compreensão que a igreja tem do papa. Por mais atrevido que possa parecer, nós, católicos, acreditamos que ele não erra ao transmitir a doutrina de Jesus Cristo.
              Não é pouco. Jesus disse "Eu sou a Verdade". Por esse motivo, a igreja afirma que há verdades inegociáveis, e não apenas consensos. Ela ainda aposta, por exemplo, na capacidade (e na beleza) de se viver a fidelidade conjugal e a castidade.
              "Não vim abolir a lei, mas cumpri-la", explicava Jesus. Ele não veio modernizar os dez mandamentos da lei de Moisés. Com a igreja ocorre o mesmo. Ela não negocia o núcleo da sua doutrina.
              Temos a mesma fé de Pedro, de Agostinho e de Teresa de Calcutá. E estamos agradecidos por tantas gerações de católicos que souberam respeitar as condições de sustentabilidade da sua fé. Há uma linha ininterrupta de 264 papas que nos transmite o tesouro que Pedro e os apóstolos receberam diretamente de Jesus Cristo. O papa não é o produto midiático de uma época, mas transcende o seu tempo.
              Isso significa que a igreja vive da inércia? Em absoluto. Mas ela não necessita, neste momento, modernizar as suas propostas pastorais, pois o Concílio Vaticano 2º já o fez. Foram estabelecidas as pontes para um diálogo construtivo com o mundo moderno. Trata-se agora de continuar a implementá-las.
              O Concílio Vaticano 2º ofereceu luzes para a ação da igreja no mundo. Permitiu uma compreensão mais profunda das consequências da liberdade, da secularidade e do pluralismo. A igreja está apta a conviver com a cultura política contemporânea e a sociedade pós-moderna. A verdade deve ser proposta, e não imposta, repetiu diversas vezes Bento 16.
              Os textos do Vaticano 2º são uma eloquente manifestação desse equilíbrio entre continuidade e reforma, cujo mérito se deve a Paulo 6º. No entanto, a interpretação de um concílio nunca é um céu de brigadeiro. Sempre há a tentação da ruptura com a verdade revelada, na tentativa de substituí-la pelas opiniões do momento.
              João Paulo 2º e Bento 16, ambos protagonistas do Vaticano 2º, sofreram enorme pressão para que pactuassem com tal ruptura. No entanto, escolheram outra via de modernização para a igreja. Estavam serenamente convictos de que o verdadeiro concílio exigia a hermenêutica da reforma na continuidade.
              Os dois rejuvenesceram a igreja, tanto com os seus escritos -o catecismo da Igreja Católica é surpreendentemente contemporâneo!- como com as suas vidas. Que o digam os funerais de João Paulo 2º, com 174 chefes de Estado e milhões de peregrinos.
              Esse equilíbrio entre reforma e tradição é o milagre constante da igreja e o seu desafio permanente. Não é fácil explicar como uma instituição, que começou sendo governada por uns pescadores da Galileia, tenha sobrevivido a tantos impérios, revoluções e cataclismos. Há algo nela que ultrapassa a nossa compreensão.
              Quando aparecer a "fumata bianca" e for anunciado "Habemus papam" -seja quem for-, vou me posicionar diante da TV para receber a sua bênção. Penso que não conseguirei segurar as lágrimas de alegria, porque a igreja de sempre continua viva e caminha na história.

                André Singer

                folha de são paulo

                A perspectiva da oposição
                O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é o principal formulador do pensamento oposicionista no Brasil. No domingo passado, compôs notável síntese de como o PSDB vê o futuro do país ("Sem disfarce nem miopia", "O Estado de S. Paulo", 3/3).
                Em primeiro lugar, chama a atenção a maneira desapegada, fria e realista com que FHC enxerga 2014. Elemento oculto, mas de fácil apreensão nas entrelinhas do artigo, percebe-se que ele não acredita em vitória já. A disputa para valer foi transferida para 2018, quando o Brasil provavelmente precisaria optar por aderir ou não à onda de crescimento capitalista cujos sinais, distantes, "já se veem no horizonte".
                Até lá, será preciso esperar que amadureçam as condições externas e internas, o que também explica a opção por uma candidatura jovem como a de Aécio Neves.
                No front nacional, "por hora, o trem não descarrilou" e "enquanto a China puxar as exportações de matérias-primas e de alimentos, tudo vai se arranjando". Mas, como o governo afrouxou a santíssima trindade do real (metas de inflação, câmbio flutuante e responsabilidade fiscal), a deterioração torna-se inevitável, vindo a aparecer, "em prazo mais longo", na forma de vulnerabilidade externa.
                Na frente internacional, o ex-mandatário prevê uma rearrumação em que os EUA liderarão um bloco capaz de competir com o ascendente poder sino-asiático. Fazendo uso de sua conhecida capacidade de entender o funcionamento geral do sistema, o antigo professor da USP cita Schumpeter para mostrar como as inovações que movem a economia já se fazem sentir. Mesmo na vigência da crise geral, a descoberta de nova tecnologia para extrair gás e petróleo do xisto é exemplo do que vem por aí.
                Estariam, assim, na confluência futura dessas vicissitudes internas e externas as melhores chances da oposição. Tal como se deu 20 anos atrás, quando o próprio Cardoso implantou o plano de estabilização, em sua opinião deve-se abrir mais adiante uma janela mundial de oportunidade para o Brasil. Ela seria aproveitável só se o Brasil se ajustasse outra vez à globalização.
                O ex-mandatário afirmou que a globalização é "a maneira contemporânea de organizar a produção com base em novas tecnologias e novas normas", e não uma ideologia -o neoliberalismo-, como pensou, no passado, o PT.
                Goste-se ou não, aí está o melhor resumo do que propõe à alternativa de poder realmente existente hoje no país. Sobre o cortejo de desigualdade, barbárie e destruição que essa "maneira contemporânea" acarreta, nenhuma palavra. Mas, se as houvesse, não seria o manifesto da oposição.

                CLÁUDIA LAITANO - Um homem fora do lugar

                ZERO hORA - 09/03/2013

                Somos o país da gambiarra ideológica. Quem sacou a inclinação brasileira para o “gato” de ideias foi o crítico literário Roberto Schwarz. Escrevendo sobre o Brasil do século 19, Schwarz mostrou como o país da escravidão e da desigualdade extrema estava aquém das elegantes ideologias liberais que, assim como os vestidos das senhoras mais exigentes da época, costumavam ser importadas da Europa.

                O crítico chega a usar a expressão “comédia ideológica” para descrever a tentativa de enfiar um Brasil atrasado, analfabeto e escravagista na fatiota desconfortável do liberalismo político e econômico – que, obviamente, pressupunha conquistas básicas como liberdade de trabalho, igualdade perante a lei e universalismo. O teste da realidade e da coerência, escreve Schwarz, não parecia necessário para os senhores que defendiam a liberdade em praça pública e os escravos dentro de casa. Eram ideias fora do lugar. Por fora bela viola, por dentro pão bolorento.

                Quase 40 anos depois da publicação do livro Ao Vencedor as Batatas (1977), que inclui o clássico ensaio Ideias Fora do Lugar, e mais de 120 depois da abolição da escravatura, o Brasil continua ensinando ao mundo como adaptar o céu das boas intenções ao pedregoso purgatório da realidade.

                Pega-se uma ideia lustrosa como a defesa dos direitos humanos, baseada no princípio de que todos os homens nascem iguais em dignidade e em direitos e devem agir uns para os outros em espírito de fraternidade, e cria-se para ela uma comissão no Congresso Nacional – o que, imagina-se, deve fazer bonito em relatórios internacionais e em discursos de campanha nos rincões mais civilizados.

                Criada a comissão, algum espírito suíno-pragmático percebe que, por mais que a ideia lustrosa pegue bem em determinados ambientes, não é tão relevante assim como moeda política. Abandona-se a comissão, então, não apenas à própria irrelevância, o que já seria ruim o suficiente, mas à porta daqueles a quem, desde o princípio, a comissão contradiz em essência. Como se a Princesa Isabel entregasse a redação da Lei Áurea a um senhor de escravos. Ou o próximo conclave chegasse à conclusão de que Richard Dawkins, afinal, até que daria um bom papa.

                Graças ao YouTube, qualquer um pode iniciar-se na vida e na obra do deputado Marco Feliciano (PSC-SP), novo presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, que responde a processos por estelionato e homofobia. Aviso, porém, que as pregações do pastor presidente da Igreja Catedral do Avivamento não são recomendadas para os fracos de estômago.

                Assim como os relatórios da ONG Todos pela Educação divulgados esta semana, que revelaram quedas em índices de aprendizado já suficientemente vergonhosos, a escolha para um fórum de direitos humanos de um homem que não apenas pensa torto, mas tem coragem de defender ideias discriminatórias em público mostra que, no Brasil, o que está ruim sempre pode tornar-se infame.

                Ruy Castro

                folha de são paulo

                Quem falou primeiro?
                RIO DE JANEIRO - Há tempos, por causa do "gol de placa" inventado por Joelmir Beting, perguntaram-me quem havia criado outras expressões do futebol, como "gol de bicicleta", "dar carrinho" ou "meter entre as canetas". Embatuquei -como foi que nunca procurei levantar isso? Para não perder pontos, perguntei se valia saber que o autor da palavra "robô" era o escritor tcheco Karel?apek; de "cibernética", o matemático americano Norbert Wiener; e de "fluxo da consciência", o filósofo idem William James.
                De "surrealismo", o poeta Guillaume Apollinaire; de "contracultura", o historiador Theodore Roszak; de "radical chic", o jornalista Tom Wolfe; de "a era do jazz", o escritor F. Scott Fitzgerald; e de "bebop", o baterista Kenny Clarke. E a expressão "bossa nova"? Já existia nos anos 50, significando novidade. Mas foi o repórter Moyses Fuks quem a aplicou à nova música que surgia -e só então Tom, Vinicius e João Gilberto foram informados de que haviam criado a "bossa nova".
                Quem chamou os filmes de Glauber Rocha e outros de "cinema novo"? O crítico Ely Azeredo. Quem falou primeiro em "filme noir"? Outro crítico, o francês Nino Frank. E em "nouvelle vague"? A jornalista Françoise Giroud. E quem apelidou de "Oscar" o famigerado boneco? O repórter Sidney Skolsky.
                Quantos saberão quem batizou o Rio e quando? Foi o navegador florentino Américo Vespúcio, quando passou por aqui, em 1° de janeiro de 1502, a bordo da expedição do português Gonçalo Coelho. Vespúcio viu a baía de Guanabara e sapecou: "Rio de Janeiro". Que adoramos e logo simplificamos para "Rio".
                Pergunte-me agora quem criou os famosos "geraldino" (torcedor da geral), "arquibaldo" (da arquibancada), "macário" (carregador de maca) e "onde a coruja dorme" (interseção entre o travessão e a trave). Fácil: o radialista Washington Rodrigues.

                  Fernando Rodrigues

                  folha de são paulo

                  Só vai piorar
                  BRASÍLIA - A Câmara escolheu para presidir sua Comissão de Direitos Humanos e Minorias o deputado e pastor Marco Feliciano, do PSC de São Paulo. Ele já deu declarações contra negros e homossexuais. Num culto gravado em vídeo, aparece reclamando de um fiel que entregou o cartão magnético do banco, mas não revelou a senha.
                  Feliciano é réu num processo no qual é acusado de estelionato. Também defende a castração química de estupradores e um curioso programa "Papai do Céu na Escola" no ensino fundamental.
                  Não vale a pena entrar no mérito dos conceitos filosóficos defendidos pelo deputado Feliciano. O que importa é entender a razão pela qual ele e outros políticos controversos estão conquistando cargos e notoriedade dentro do Poder Legislativo.
                  A deterioração da reputação do Congresso Nacional não é algo novo. Há décadas os políticos se investiram do papel de saco de pancadas do país. Esse fenômeno é como um desastre de avião. Tem várias causas.
                  Uma delas é quase insolúvel: a proliferação de partidos dentro do Congresso. Há, hoje, 24 siglas representadas ali dentro. Se Marina Silva tiver sucesso na montagem da sua Rede, serão 25. Há dez anos, eram 16 as legendas presentes no Legislativo.
                  Há uma demanda por cargos para os partidos nanicos como o PSC. Em 2003, com apenas um deputado, essa agremiação ficava sem direito a presidir comissões. Agora, com 15 deputados, a coisa muda de figura.
                  E qual comissão será entregue aos partidos menores? As que não mexem com assuntos, vamos dizer, concretos. Eis aí como Marco Feliciano acabou escolhido e comandará a Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Para a sociedade, o assunto é relevante. Na cabeça dos congressistas, é só uma sinecura na qual acomoda-se um partido pequeno.
                  Como o número de partidos está em crescimento, a chance de melhora é zero. Só vai piorar.

                    Helio Schwartsman

                    folha de são paulo

                    Desserviço à educação
                    SÃO PAULO - A mais fantástica tecnologia humana não é o computador nem o velcro, mas a escrita. Se um pensador antigo como Platão podia vê-la com desconfiança, por imaginar que destruiria a capacidade de memorização, hoje, 2.400 anos depois, sabemos que não é assim.
                    Não apenas não existiria civilização, se não dispuséssemos de uma forma de registro perene das ideias, como ainda há indícios de que a alfabetização modifica fisicamente o cérebro, criando rotas de comunicação entre diferentes regiões do córtex e ampliando a memória verbal, como mostra Stanislas Dehaene em seu "Os Neurônios da Leitura".
                    O processo de alfabetização tem início já nos meses finais da gravidez, quando o feto vai se familiarizando com os ritmos e sons da língua materna, e só se encerra na adolescência, quando emerge um leitor tão experiente que mal presta atenção nas letras, processando-as em blocos e quase "adivinhando" o sentido das palavras. Entre os 5 e os 6 anos de idade, porém, ocorre uma fase crítica que precisa ser aproveitada. As crianças, que até então apenas memorizavam o formato de palavras especiais, como seus nomes, começam a perceber que a escrita alfabética envolve um jogo de sons. Está surgindo o que os especialistas chamam de consciência fonológica.
                    Embora os construtivistas não gostem, este é o momento em que o código alfabético precisa ser ensinado explicitamente, já que o processo de percepção dos fonemas não é automático nem natural. Deixar de fazê-lo atrasa e pode até comprometer a alfabetização, em especial a das crianças mais pobres, que já saem em desvantagem por terem sido menos estimuladas para a leitura.
                    Nesse contexto, a Câmara, com apoio do governo, prestou um desserviço à educação, ao rejeitar uma emenda à MP 586, que reduzia de 8 para 6 anos a idade ideal para as escolas alfabetizarem a garotada. Detalhe: a mudança só valeria em 2017.

                      Editoriais FolhaSP

                      folha de são paulo

                      Controlar a inflação
                      Para enfrentar alta de preços, Banco Central mostra disposição de elevar taxa de juros já nos próximos meses, hipótese antes descartada
                      Após os alertas recentes de seu presidente, o Banco Central deu um sinal claro nesta semana de que deverá voltar a elevar os juros para combater a inflação.
                      Segundo comunicado oficial, o Comitê de Política Monetária (Copom) "irá acompanhar a evolução do cenário macroeconômico até sua próxima reunião para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária".
                      No jargão, significa que a alta de juros é muito provável e pode ocorrer já na próxima reunião, em meados de abril, ou na seguinte.
                      Verdade que a economia ainda patina, apesar dos sinais de retomada do PIB, para um ritmo próximo a 3% (contra 0,9% em 2012).
                      A inflação, porém, acelerou -cálculos que desconsideram oscilações de curto prazo apontam para um quadro estrutural preocupante. Nos doze meses encerrados em fevereiro, o IPCA (índice oficial) acumulou alta de 6,33%; em março, deve atingir 6,5% (o máximo aceito acima da meta fixada pelo próprio governo, de 4,5%).
                      No cômputo geral, a inflação é o fator predominante. Embora o governo deva ganhar margem de manobra com novas desonerações tributárias em itens com peso importante na alta de preços, como a cesta básica, é difícil imaginar que tais iniciativas possam, sozinhas, reverter o processo inflacionário.
                      O principal empecilho é a credibilidade do BC, arranhada nos últimos dois anos pela impressão de leniência que passou para os agentes econômicos. As numerosas intervenções verbais da Fazenda apenas reforçaram a desconfiança. Uma vez perdida a expectativa de controle dos preços, é muito mais difícil conter a inflação.
                      O cálculo do BC -e do Planalto- é claro: não fazer nada e deixar a inflação correr solta neste ano pode resultar em um cenário de descontrole para 2014 e complicar a vida da presidente Dilma Rousseff no ano da eleição.
                      Uma alta moderada dos juros em curto prazo -e, neste cenário, quanto antes ela ocorrer, melhor- reduziria tais riscos. Analistas parecem concordar que a taxa básica (Selic), hoje em 7,25%, subirá pouco mais de um ponto, a partir de abril ou maio, salvo improvável melhora dos índices de inflação.
                      Ainda que despertada por interesse eleitoral, é bem-vinda a disposição do BC de combater o processo inflacionário. Há, além disso, sinais de que o governo passará a adotar atitude menos aventureira em vários campos -gestão da Petrobras e concessões de infraestrutura, por exemplo.
                      Maior coerência e mais cuidado na gestão da economia podem reduzir o mau humor do empresariado e, quem sabe, impulsionar os investimentos.

                        EDITORIAIS
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                        Iluminar o lobby
                        São pertinentes as declarações do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, a favor da regulamentação do lobby no Brasil.
                        Em entrevista à Folha e ao UOL, Adams afirmou que a atividade pode se tornar "um sistema de qualificação das demandas da sociedade". Propostas dos mais variados setores seriam encaminhadas ao Estado de maneira transparente, por meio de pessoas tecnicamente qualificadas.
                        A simplicidade da explicação deveria incomodar quem teima em ver com desconfiança a defesa legítima de interesses, fazendo associação imediata entre essa iniciativa e a corrupção. Nada mais contraproducente: criar regras para grupos de pressão é, na verdade, uma forma de combater os crimes contra a administração pública.
                        Faz parte do jogo democrático que agentes particulares procurem membros do poder público para expor argumentos em prol de seus interesses. Esse processo, como demonstra a experiência, independe de lei para ocorrer na prática. Fingir que ele não existe em nada contribui para a fiscalização.
                        A opacidade beneficia os atores corruptos. Dada a ausência de normas, eles podem se travestir de lobistas e manter nas sombras sua verdadeira natureza. Como separar, hoje, quem faz pressão legítima sobre agentes públicos de quem os procura para oferecer propina? Lembre-se que a Polícia Federal apontou um esquema de tráfico de influência dentro da própria Advocacia-Geral da União.
                        Os benefícios da normatização do lobby são atestados por países com tradição na área, como os EUA. O sistema político não fica livre de escândalos, mas os espaços para corrupção se estreitam quando os atores são conhecidos, e suas atividades, transparentes.
                        Uma lei que regulamentasse a prática deveria, além de definir lobby e lobista, criar mecanismos que garantissem a identificação dos agentes, bem como de seus contratantes e interesses. Também seria importante estabelecer padrões para as negociações, assegurando a publicidade da atuação e do registro dos encontros.
                        Com fronteiras bem delimitadas, torna-se mais fácil reconhecer comportamentos anômalos e punir os envolvidos.
                        Apesar das vantagens de iluminar as interações entre o setor privado e o Estado, não há sinais de que o Congresso esteja interessado nisso -projetos de lei sobre o tema tramitam, sem sucesso, desde 1990. Talvez seja esse, afinal, o maior indício de que a regulamentação do lobby representaria verdadeiro golpe nos interesses escusos.

                          Programa traz tradutores estrangeiros para o Brasil

                          folha de são paulo

                          Apaixonados pelo país, alemã e argentino fizeram cursos e pesquisas no Rio
                          Projeto de tradução de livros brasileiros da Biblioteca Nacional vai promover a vinda de outros 13 especialistas
                          MARCO RODRIGO ALMEIDADE SÃO PAULOEles descobriram a literatura brasileira pelos maiorais. O argentino Cristian de Napoli leu Machado de Assis aos 20 anos. Wanda Jakob, alemã, começou por outro gigante, Guimarães Rosa e seu "Grande Sertão: Veredas".
                          Ambos não passaram incólumes pela experiência. São hoje dois dos principais conhecedores de literatura brasileira no exterior.
                          De Napoli, 40, e Jakob, 36, estiveram no Rio entre janeiro e fevereiro. Foram os dois primeiros selecionados do programa de residência de tradutores estrangeiros a chegarem ao Brasil.
                          O projeto da Fundação Biblioteca Nacional (FBN) trará ao país, até agosto, 15 especialistas para verter obras brasileiras para seis idiomas: espanhol, francês, italiano, grego, alemão e inglês.
                          Além de pesquisas para as traduções, frequentarão cursos sobre história e cultura brasileiras. Cada um recebe até R$ 11 mil para despesas.
                          De Napoli está traduzindo "A Vida como Ela É", de Nelson Rodrigues. Jakob, "A Guerra dos Bastardos", romance de 2007 escrito por Ana Paula Maia.
                          De Napoli conhece bem o Brasil -veio 19 vezes ao país. Já traduziu mais de 20 livros brasileiros. Adora Oswald de Andrade, Clarice Lispector, Manuel Bandeira e, claro, Nelson Rodrigues.
                          No ano passado, ele lançou na Argentina, pela editora Adriana Hidalgo, o primeiro volume de sua tradução dos contos de "A Vida como Ela É". O novo volume, pela mesma editora e também com 50 histórias, deve ser publicado por lá em agosto.
                          "Nelson é extraordinário em vários aspectos: na concisão da escrita, das frases, no realismo dos argumentos, na habilidade para ouvir e capturar tudo o que acontecia ao redor", explica.
                          Ele aproveitou o período no Rio para sanar sua principal dificuldade no trabalho: compreender as gírias cariocas dos anos 1950 e as referências a acontecimentos públicos do período.
                          CONTEMPORÂNEOS
                          Jakob descobriu os livros brasileiros por meio de cursos na Universidade de Munique nos anos 1990. Depois de Guimarães Rosa passou a outros clássicos nacionais, como Carlos Drummond de Andrade, mas o foco das pesquisas da tradutora tem sido a literatura contemporânea brasileira.
                          Em sua primeira vinda ao Brasil, em 2011, ficou encantada com "A Guerra dos Bastardos". Com tom de história noir, retrata o submundo de uma grande cidade habitado por traficantes, boxeadores e profissionais do cinema pornô.
                          Além de trocas regulares de e-mail, Jakob e Ana Paula Maia, autora do livro, tiveram no Rio dois longos encontros para discutir a obra.
                          A tradutora tinha dificuldade para compreender, por exemplo, expressões como "bater ou correr" ou o que é exatamente a sacada de uma casa. A temporada brasileira também foi importante para mergulhar na alma carioca.
                          "As estadias no exterior não são obrigatórias para tradutores, mas certamente ajudam. Pude observar a fala dos cariocas, as cadências, como e quando eles aplicam ironia, agressividade ou doçura. Isso não se encontra nos dicionários", comenta.
                          "A Guerra dos Bastardos" deve sair na Alemanha em agosto, pela editora A1 Verlag.

                            Tv Paga

                            Estado de Minas 09/03/2013

                            Em dia com a memória

                            Se alguém ainda desconfiava do talento de Leonardo DiCaprio, essa dúvida é desfeita com a atuação do jovem galã em J. Edgar (foto), que estreia hoje, às 22h, na HBO. O filme traça o perfil de um dos homens mais enigmáticos do século 20: John Edgar Hoover. Um dos principais responsáveis pela criação do FBI, ele foi temido e admirado na mesma proporção, até porque mantinha segredos comprometedores o suficiente para acabar com sua reputação. E mais: a direção é de Clint Eastwood.

                            Muitas alternativas
                            no pacote de cinema

                            Mas como sábado é o dia preferido para as grandes estreias, não se pode ignorar Contrabando, também às 22h, no Telecine Premium, com Mark Wahlberg, Giovanni Ribisi e Kate Beckinsale no elenco. No Telecine Touch, hoje tem a sessão Dupla emoção com filmes que exploram o jornalismo como tema: Faces da verdade (16h) e A vida de David Gale (17h55). No TCM, a Dose dupla de cinema emenda os longas 48 horas (20h) e 48 horas – Parte 2 (21h50).

                            As melhores fitas vão
                            ao ar sempre às 22h


                            Na concorrida faixa das 22h, o assinante tem mais oito opções: Dois córregos, no Canal Brasil; Crash – No limite, no A&E; Dia dos namorados macabro, no Megapix; A casa dos sonhos, na HBO HD; O assassino do alfabeto, no Space; Na companhia do medo, no Max HD; Homem de Ferro 2, na Fox; e Avatar, no FX. Outras atrações da programação: O traidor, às 21h, no Cinemax; Armações do amor, às 22h30, no Comedy Central; De passagem, às 23h15, na Cultura; e Bilhete premiado, às 23h40, no Universal.

                            Bio traça o perfil de
                            craque do Palmeiras


                            No segmento dos documentários, uma boa pedida é o especial do canal Bio sobre Ademir da Guia, Um craque chamado Divino, às 18h30. Às 21h, o Animal Planet exibe o programa Caçadores de dinossauros. No History Channel, às 22h, vai ao ar O tsunami que engoliu o Japão. E no NatGeo, às 22h15, estreia a nova temporada de Missão pet.

                            Fox Life pega estrada
                            com Samantha Brown


                            A Fox Life espichou a homenagem do Dia Internacional da Mulher programando para hoje a maratona Toque de mulher. A partir das 15h30, serão exibidos seis episódios especiais com Samantha Brown: “Las Vegas”, “Havaí”, “Route 66”, “Circo – San Jose”, “Pal Springs” e “San Francisco”.

                            Diversidade marca a
                            programação musical


                            Para fechar, a música. Na Cultura, por exemplo, o grupo Pagode da 27 é a principal atração do programa Manos e minas, às 17h. Mas tarde, às 21h45, na série Clássicos, o maestro sir Richard Armstrong rege um concerto da Osesp, gravado com exclusividade pela Cultura, com peças de Bartók, Mozart e Janácek. No Viva, às 23h, mais uma edição do Globo de ouro, com Roberto e Erasmo Carlos, Sandra de Sá, Milton Nascimento, Fagner, Simone e o convidado internacional Billy Paul, entre outros.

                            Vozes da África - João Paulo

                            Estado de Minas 09/03/2013


                            Este é o romancista nigeriano Chinua Achebe, um dos melhores escritores contemporâneos. Você não sabe o que está perdendo
                            A África é o continente mais próximo da alma brasileira e talvez o mais distante de nossa consciência. Conhecemos muito pouco da África e dos africanos, de sua história e cultura, de seus problemas e realizações. Mesmo com laços tão fortes, que nos atam na carne pela presença do povo em nossa formação – em sangue, emoção e inteligência –, fizemos e fazemos questão, séculos afora, de negar o que nos mostra o espelho. O mesmo processo nos afastou dos hispano-americanos, que, só muito recentemente, passaram a habitar nossos ideais de convivência e felicidade.

                            No caso da África, a questão é ainda mais profunda: não apenas desconhecemos o continente, seja por razões ideológicas ou de pura ignorância, como desdenhamos de suas conquistas. É sempre mais fácil ver no africano o povo indistinto, sem identidade, marcado pela miséria e falta de perspectivas. Até mesmo a sensibilidade à cultura negra, em suas múltiplas manifestações, vem quase sempre tingida de uma condescendência daninha, armada sobre preconceitos.

                            Assim, louva-se a música africana, mas apenas pelo ritmo (como se harmonia e melodia fossem sofisticadas para ouvidos tribais). A mesma operação de escalonar a contribuição estética por fatias valorativas se percebe no caso das outras artes. Os africanos seriam bons na intuição e nos ritmos do corpo; indigentes em termos de reflexão e complexidade. No caso da literatura, há uma aceitação de tudo que aponta para a narrativa pura e cegueira para as outras formas de expressão. Mesmo na valorização dos escritores que surgiram no momento da descolonização que se seguiu à Segunda Guerra, o peso era dado mais pela ideologia do que pela criação.

                            A aproximação dos povos, num contexto de simultaneidade e globalização, nem por isso foi capaz de superar o olhar discriminatório acerca do continente. Temos pronta a crítica à política, traduzida quase sempre como de natureza tribal, mas pouca sensibilidade para ações internacionais concertadas em nome da verdadeira liberdade dos povos. Como não há um mercado imediatamente lucrativo, como o do petróleo, a solidariedade internacional é barrada pelo peso dos interesses econômicos.

                            Por isso, sempre que surgem livros de autores africanos ou de brasileiros interessados em dar a conhecer o continente, a ocasião é propícia para questionamento da nossa orgulhosa ignorância.

                            História e ficção Dois livros lançados recentemente incorporam informações importantes sobre a África, com especial interesse para os brasileiros. O primeiro deles é Imagens da África, de Alberto da Costa e Silva (Editora Penguin Companhia), um compêndio de textos sobre o continente. A seleção, obra de profunda erudição, vale por uma biblioteca inteira. O historiador parte dos primeiros registros ocidentais sobre a África, na Antiguidade Clássica, chegando ao século 19 depois de atravessar a Idade Média e o período moderno. Como era de se esperar, são testemunhos que mostram como os forasteiros, ao conhecer o continente negro, carregam muito de sua visão de mundo. Dos primeiros registros indiretos (quando não se sabia da existência de vida além do Saara) aos viajantes que percorreram a África em busca de riqueza e conhecimentos, tudo vai registrado na voz dos cronistas, geógrafos, navegadores e viajantes.

                            Por distintas vozes, o leitor vai conhecendo as primeiras descrições da região subsaariana, obra dos responsáveis pela expansão islamita; acompanha a exploração e o tráfico de escravos e matérias-primas da região; percebe a maneira como religião, ciência e cobiça se dão as mãos para compor um painel marcado pela visão preconceituosa dos colonizadores brancos, com a consequente destruição das culturas originais. Alberto da Costa e Silva faz uma seleção delicada e arguta, como quem grifa em seus livros de cabeceira os trechos mais significativos já escritos sobre a grande história do continente.

                            Nas palavras de Costa e Silva, em seu livro há de tudo: “Paisagens, grupos humanos, indivíduos e animais se sucedem nestas páginas, nas quais encontrei lugar para os nascimentos, os casamentos e a morte, para as festas e os exércitos, para os reis, os mercadores e os escravos, para as comidas e as roupagens, para a casa e o roçado, o tear e a forja. Pedaços de livros sem cimento a ligá-los, assemelham-se às pedras sossas com que se erguem os zimbabués”. Palavras poéticas e sábias, que denunciam nosso desconhecimento sobre nós mesmos e nos incitam a conhecer um pouco melhor nossas origens.

                            O outro livro que merece atenção é o romance A paz dura pouco, de Chinua Achebe (Companhia das Letras), publicado originalmente em 1960. No registro ficcional, Achebe traz a África contemporânea ao leitor, mas com um estilo sublime, que mescla literatura e narrativas embaladas por uma tradição mágica. O romancista nigeriano, nascido em 1930, é autor de vários romances e ensaios, com destaque para A flecha de Deus e O mundo se despedaça, já lançados no Brasil pela mesma editora. É considerado por muitos o fundador da moderna literatura africana, sobretudo pela capacidade de dar à expressão tradicional do continente o mesmo valor da escrita moderna em inglês, seu idioma de expressão. Esse virtuosismo estilístico de Chinua Achebe está plenamente realizado em A paz dura pouco.

                            O romance narra a história de Obi Okonkwo, um jovem talentoso que ganha uma bolsa de estudos na Inglaterra e volta de lá como uma grande promessa para seu povo. Herdeiro da tradição e emissário da modernidade, ele se vê dividido entre dois mundos e formas de vida. Sua volta à Nigéria e o trabalho que assume como funcionário público parecem tirá-lo da mira do passado, mas se vê envolvido com questões como a corrupção que o cerca em todos os momentos. Nessa hora, instala-se um conflito ético entre o que pode representar sua conquista pessoal e o que lhe ditam valores morais vindos de sua etnia ibo.

                            A corrupção marca o livro desde sua abertura, com o julgamento de Obi Okonkwo, acusado de suborno. Se este conflito o deixa em crise com sua nova identidade, ele se vê também preterido de seu povo ao anunciar o casamento com uma jovem pertencente a uma etnia considerada intocável por sua família. Essa mescla de relações modernas e pré-industriais, de cristianismo e religiões animistas, de ética das convenções e valores milenares, tudo isso ganha tradução no estilo, marcado sempre pela presença do maravilhoso.

                            Saga do desenraizamento, mergulho na alma de um homem partido, A paz dura pouco não diz apenas de Obi Okonkwo e seu continente, como o signo de um fracasso. Chinua Achebe parece enxergar longe e lança uma pergunta ao futuro: como viver num mundo que não nos diz respeito?