quarta-feira, 19 de junho de 2013

A gente não quer só eletrodomésticos - Luiz Carlos Delorme Prado


O Globo - 19/06/2013

Os indicadores econômicos mostram que há uma grande melhoria na renda e no consumo das populações mais pobres do país. No entanto, uma parte dessa população - a mais beneficiada delas, os mais jovens, mais educados, que tiveram substanciais melhorias no acesso a bens de consumo, inclusive eletrodomésticos e produtos eletrônicos - parece estar profundamente insatisfeita.

Esses jovens, muitos deles estudantes universitários, que foram chamados de nova classe média, são o núcleo das recentes manifestações nas principais cidades brasileiras. As demandas são muitas, nem sempre consistentes. Algumas razoáveis, outras absurdas. O comportamento dos manifestantes nas ruas é igualmente variável: alguns demonstram com palavras de ordem sofisticadas, e outros, com expressões banais. Alguns querem demonstrações pacíficas, outros as querem iradas e destrutivas. Não há ordem nem liderança nesse processo - as poucas bandeiras vermelhas dos tradicionais grupos radicais parecem isoladas e perdidas em uma multidão desorganizada com muitas demandas, nem sempre claras, e muita indignação.
Uma explicação para esse fenômeno pode ser buscada no conceito proposto pelo economista do desenvolvimento Albert Hirschman, falecido no ano passado, chamado "efeito túnel".

Imagine, diz ele, que estejamos em um engarrafamento parado em duas pistas. De início, há uma sensação de desesperança e resignação, já que ninguém se move. Mas imagine que uma das pistas comece a andar, e uma delas não se movimente. O resultado é frustração e, no limite, a tentativa de mudar de fila a qualquer custo, e exigir de forma barulhenta o movimento da fila em direção ao fim do túnel.

Ou seja, no Brasil, estagnado, desde a década de 1980, havia uma certa resignação com a má qualidade da vida, que incluía pouco acesso aos bens de consumo e ao serviço público. No entanto, nos últimos dez anos, houve uma grande melhoria na qualidade de vida de uma parcela da população tradicionalmente excluída. A fila andou. Ampliou-se o acesso a eletrodomésticos e outros bens e serviços. A educação ampliou-se, o desejo de acesso a lazer ampliou-se. A vida melhorou.

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