quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Pessoas vendáveis e pessoas invendáveis - Lee Siegel

estadão

Lee Siegel - O Estado de S.Paulo
NOVA JERSEY - As sociedades têm um inconsciente, como as pessoas, e às vezes as sociedades tomam rumos inconscientes que horrorizariam as pessoas se elas tomassem consciência de para onde realmente estão seguindo. Quando Mussolini chegou ao poder, inocentemente prometeu fazer os trens circularem no horário. Todos queriam que os trens circulassem no horário. Ninguém teve consciência de quanto custaria essa pontualidade.
Nos últimos anos, a sociedade americana veio criando um sistema de dois níveis que está dividindo o país em dois grupos: pessoas vendáveis e pessoas invendáveis. Esse movimento divisório se desenrola em muitas áreas da vida americana, mas em nenhuma é mais influente, e venenoso, do que na educação pública. No entanto, ele parece ser apenas mais uma técnica benigna para nos tornar mais felizes e mais eficientes.
Já escrevi anteriormente sobre como "ensinar para realizar provas" é trair uma geração de jovens americanos. A qualidade de inteligência formal é elevada, e as qualidades de intuição, criatividade e empatia são desvalorizadas. Isso é perfeito para uma sociedade guiada estritamente pelas linhas do mercado. Mas é muito ruim para a criação de uma sociedade de pessoas imaginativas, curiosas, interessantes.
E agora começou a mais recente ofensiva contra O Invendável. Ela se chama Common Core State Standards (padrões estatais essenciais comuns, em tradução literal). Trata-se de uma série de indicações de leitura para alunos do jardim da infância ao ensino secundário. Apesar de estarem previstos para entrar em vigor somente em 2014, esses padrões já estão sendo implementados em todo o país. O traço mais marcante das diretrizes de leitura é sua ênfase em não ficção. Elas dizem que a maioria dos textos indicados para os estudantes deve ser materiais de leitura como, segundo um relato confiável, "documentos históricos, tratados científicos, mapas... receitas e horários de trens". Quando os estudantes estiverem no segundo grau, dizem as diretrizes, 70% de sua leitura deveriam ser de não ficção por esses critérios.
Assim, a guerra contra a literatura imaginativa que foi travada durante as "guerras culturais" dos anos 1990 finalmente atingiu seu objetivo. Na época, os textos imaginativos, intuitivos, empáticos eram considerados de pouco valor. Nos anos 1990, essa crença era justificada pelo argumento de haver muita literatura com um viés contra mulheres e minorias. Isso, claro, era absurdo, já que, de um lado, tempos diferentes tinham costumes diferentes, como reza o velho ditado. Mas é também verdade que textos condenados por serem imperialistas, por exemplo, não eram nada disso. Mansfield Park, de Jane Austen, era constantemente atacado pelo que seus detratores alegavam ser atitudes imperialistas de Austen quando, de fato, o livro era no mínimo um ataque ao imperialismo, a começar por seu título. Mansfield Park foi onde, em 1771, um tribunal britânico emitiu uma sentença proibindo a posse de escravos negros - caçados nas Índias Ocidentais ou na África - na Inglaterra.
Não me passou despercebido na época que os professores mais veementes na condenação de quase toda literatura ocidental com base em fundamentos politicamente corretos eram também figurões Wasp (da elite branca protestante). Suas restrições tiveram o efeito de dificultar para estudantes de origem humilde o acesso às grandes obras de imaginação. Isso foi esperto da parte dos figurões Wasp porque a grande literatura é subversiva da mesma ordem social de cujo topo eles confortavelmente mandavam. A heroína de Mansfield Park é uma garota pobre solitária.
A mesma dinâmica está ocorrendo no boicote da literatura imaginativa pelo Common Core, só que desta vez o pretexto não é a virtuosidade politicamente correta, mas as demandas da nova economia. Vivemos hoje em uma economia informática, dizem os proponentes do Core. É fundamental que os estudantes dominem a compreensão de textos informáticos para prosperarem na nova economia informática. A literatura, eles dizem, apenas os ajuda na "autoexpressão", que é autoindulgente. Pior, ela conduz à ineficácia e à queda da produtividade.
Assim, mais uma vez, há pessoas sentadas confortavelmente no topo da sociedade, que desfrutaram uma educação clássica, enriquecida pela leitura de todas as grandes obras da literatura, negando essas mesmas obras à geração atual de jovens. Seja qual for a intenção - e estou certo de que o caminho para esse destino particular está forrado de boas intenções -, as consequências estão perfeitamente alinhadas com os valores do mercado que se apoderaram de todas as áreas da vida americana. As pessoas que dominam o mundo concreto da informação ajudarão a impelir o mundo concreto do lucro. As pessoas que se perdem nas áreas cinzentas confusas e na névoa envolvente de ficção e poesia em nada contribuem para a economia.
Talvez não seja coincidência que, ao mesmo tempo, as grandes editoras de livros estejam se fundindo neste país, a ponto de em breve existir somente uma editora gigante, não diferente do aparato editorial estatal da antiga União Soviética. O Common Core terá um efeito parecido no âmbito pessoal, na medida em que funde indivíduos distintos numa entidade coletora de informações. Mas é a literatura que faz aflorar a singularidade de cada indivíduo. E é a singularidade individual que um dia se ergue contra o pensamento único, a estupidez, o assassinato em massa e diz: Basta! Não surpreende que os comissários soviéticos preferissem a leitura de mapas e horários à leitura de ficção e poesia.
Na verdade, a literatura (ainda) não foi colocada na ilegalidade, e os jovens que a desejam procurarão por ela. Mas eu temo pelos jovens que ainda precisam ser informados de que ela existe, antes de mais nada. Eles poderão não descobri-la jamais; ou, se o fizerem, poderão descobri-la quando estiverem mais velhos e sob o peso de responsabilidades e da falta de tempo e sofisticação para ler obras de arte exigentes.
O resultado será uma nação de ovelhas que jamais foram ensinadas por ficção ou poesia, que os dados da vida podem ser mudados, que arranjos sociais injustos e cruéis são arbitrários, que sofrimento, revezes e erros são universais, e que, portanto, eles não deveriam se punir por não ser dentes de engrenagem perfeitos numa sociedade obcecada por perfeição.
Mas eles saberão ler um horário de trem! E, sem dúvida, a essa altura todos os trens estarão circulando no horário.

Os segredos de uma chaminé abandonada

estadão

Fernando Reinach - O Estado de S.Paulo
Fiquei pensando: o que faria se tivesse de limpar uma chaminé abandonada, repleta de lixo? Por sorte quem tinha de limpar não era eu, mas um dos 450 cientistas amadores da Kingston Field Naturalists, de Ontário, Canada. Amante dos pássaros, Christopher Grooms, técnico de laboratório, sabia que muitas espécies de pássaros fazem seus ninhos em chaminés e foi investigar a história da chaminé antes de limpar seu conteúdo.

Foi fácil descobrir que a chaminé quadrada, com dezenas de metros de altura e um vão interno de 1,2 por 1,2 m não era utilizada desde 1928 e que seu orifício superior só havia sido tampado em 1992. Uma visita à biblioteca foi revelou que entre 1930 e 1940 e novamente em 1970 havia registros históricos da presença de uma população de andorinhões-migrantes (Chaetura pelagica) habitando a chaminé.

Ao coletar e examinar no microscópio uma amostra da pilha de 2 m de lixo no fundo da chaminé, Christopher descobriu que 99% eram exoesqueletos de insetos. Eram restos não digeridos das fezes dos pássaros que habitaram a chaminé entre 1928 e 1992. Será que, analisando cada camada de exoesqueletos, seria possível reconstituir a dieta dessas aves ao longo da segunda metade do século 20? Cientistas de seis especialidades se juntaram para fazer essa análise.

O primeiro passo foi cavar um túnel vertical no lixo, da parte inferior da chaminé ao topo da pilha. A superfície desse túnel passava por todas as camadas do lixo, da mais antiga (no fundo) à mais recente (no topo). A pilha de lixo foi fatiada horizontalmente, como um pão de forma. Mais de 200 amostras, cada uma com 1 centímetro de espessura, foram coletadas e enviadas aos diversos laboratórios envolvidos na pesquisa.

Primeiramente, os cientistas determinaram o ano em que cada amostra havia sido depositada na pilha. Para isso, analisaram a quantidade de césio-137. Antes de 1940, quando os EUA iniciaram as explosões de bombas nucleares na atmosfera, praticamente não existia césio-137 na atmosfera. Entre 1940 e 1963, quando esses testes foram interrompidos, a quantidade de césio-137 que contaminou o ambiente subiu e desceu diversas vezes, dependendo do número de bombas testadas. Os insetos devorados pelos pássaros durante esses anos ingeriram alimentos contaminados por césio radioativo, que permaneceu em seus exoesqueletos. 

Analisando as camadas, os cientistas identificaram as depositadas a partir de 1940 e as depositadas nos anos subsequentes. Esse primeiro estudo permitiu datar o ano em que cada camada foi depositada. Em um segundo estudo, os cientistas analisaram a quantidade de DDT, inseticida usado de 1945 a 1963 - quando foi proibido. E descobriram que o DDT podia ser encontrado nas camadas de 1950, atingia um pico de concentração nas de 1955 e depois diminuía gradativamente até 1970. Estudar a quantidade de DDT permite averiguar se a presença do inseticida alterou as populações de insetos e a dieta dos pássaros.

Finalmente, o dado mais importante. Especialistas na identificação de insetos examinaram os exoesqueletos em cada camada, identificaram a que espécies pertenciam e fizeram um censo da frequência de cada tipo de inseto em cada fatia da pilha. Com isso, inferiram o que as aves da chaminé comiam a cada ano. 

O resultado é espantoso. Antes da introdução do DDT (até 1950), elas comiam coleópteros (a família dos besouros). Dos exoesqueletos, 90% eram de coleópteros. Com o aumento da quantidade de DDT, os coleópteros passaram a representar cerca de 40% da dieta e os hemípteros (a família das joaninhas) subiram para até 80%. Essa tendência foi revertida entre 1970 e 1992.

Os coleópteros são mais ricos em calorias que os hemípteros. Essa mudança na dieta dos pássaros, forçada provavelmente pela ação preferencial do DTT sobre os coleópteros, sugeriu aos cientistas que, durante o período em que o DDT estava em uso, os pássaros tinham maior dificuldade de se alimentar. Isso foi comprovado ao ser medida a quantidade total de dejetos acumulados a cada ano. Logo após o pico de uso do DDT, a quantidade de fezes acumulada a cada ano caiu, indicando uma redução na quantidade de pássaros que utilizavam a chaminé.

Esse estudo é um dos primeiros a reconstituir a dieta de uma comunidade de pássaros de maneira consistente e fidedigna ao longo de toda a segunda metade do século 20. Ele comprova que a introdução do DDT realmente afetou a dieta desses pássaros, forçando os animais a se adaptarem a uma dieta mais pobre. Também reforça a ideia de que essa mudança forçada de dieta colaborou para a diminuição da população dos andorinhões-migrantes. Nada mau para um estudo que foi iniciado por um cientista amador encarregado de limpar chaminés.

MAIS INFORMAÇÕES: HISTORICAL PESTICIDE APPLICATIONS COINCIDED WITH ALTERED DIET OF AERIALLY FORAGING INSECTIVOROUS CHIMNEY SWIFTS. PROC. R. SOC. B.,  VOL. 279,  PÁG 3.114,  2012.

Quadrinhos

folha de são paulo

CHICLETE COM BANANA      ANGELI
ANGELI
PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE

LAERTE
PIRATAS DO TIETÊ      LAERTE

LAERTE
DAIQUIRI      CACO GALHARDO

CACO GALHARDO
NÍQUEL NÁUSEA      FERNANDO GONSALES

FERNANDO GONSALES
MUNDO MONSTRO      ADÃO ITURRUSGARAI
ADÃO ITURRUSGARAI
MALVADOS      ANDRÉ DAHMER

ANDRÉ DAHMER
GARFIELD      JIM DAVIS

JIM DAVIS

HORA DO CAFÉ      TOLES

TOLES

Pasquale Cipro Neto

folha de são paulo

'Ele foi seduzido'
Na voz ativa ('A menina o seduziu', 'A menina seduziu o padre' etc.), o efeito decerto não seria o mesmo
UM BELO dia, aprendemos (aprendemos?) na escola que existe voz ativa, existe voz passiva etc. E aí vêm aqueles exercícios, muitas vezes feitos e resolvidos mecanicamente ("Passe para a voz passiva"; "Passe para a voz ativa"). E lá vão os alunos: "O rato roeu a roda" (voz ativa) se transforma em "A roda foi roída pelo rato" (voz passiva); "O estabelecimento foi fechado pela prefeitura" (voz passiva) se transforma em "A prefeitura fechou o estabelecimento" (voz ativa).
Sim, é importante dominar esses mecanismos etc., mas ficar nisso é muito pouco. É preciso mostrar as diferenças que há entre uma construção e outra. Grosso modo, na voz ativa o sujeito é agente, ou seja, é o executor do processo expresso pelo verbo, o que ocorre, por exemplo, em "O policial agrediu o estudante", em que "o policial" é sujeito e agente. Na voz passiva, o sujeito é paciente, ou seja, é o alvo do processo expresso pelo verbo, o que ocorre, por exemplo, em "O estudante foi agredido pelo policial", em que "o estudante" é sujeito paciente.
Mas isso ainda é pouco. Entender o valor que tem cada uma das construções é um bom caminho para ampliar os horizontes sobre o assunto. Lembro que, na preparação da seleção brasileira para a Copa de 1986, num amistoso contra os juniores do Peru, disputado em São Luís, o jogador Éder deu uma cotovelada num garoto do belo país andino, ainda no primeiro tempo. O árbitro (Arnaldo Cézar Coelho) o expulsou inexoravelmente. No dia seguinte, Telê, o treinador da seleção, defenestrou Éder do elenco canarinho. Pois bem. Um jornal deu o seguinte título: "Telê corta Éder"; outro deu este: "Éder cortado por Telê".
E então, caro leitor, como fica isso? Essencialmente, os dois jornais deram a mesma notícia, mas o sabor e a cor da informação não são os mesmos. O primeiro (que pôs a oração na voz ativa) enfatizou o agente ("Telê"), ou seja, quem manda; o segundo (que pôs a oração na voz passiva) deu destaque ao alvo, ao paciente ("Éder"), ou seja, o degolado.
Às vezes, a ênfase sobre o paciente se dá de outra maneira, sem que se ponha a oração na voz passiva. Nessas horas, fala alto o talento do escritor, como se vê em "As linhas do destino nas mãos a mão apagou", da antológica "O Homem Velho", de Caetano Veloso. O mestre escreveu a oração na voz ativa, mas enfatizou o alvo, o objeto ("As linhas do destino nas mãos") do processo verbal. Como? Invertendo a ordem "normal" dos termos, ou seja, colocando o objeto no início da oração.
Tente escrever ou dizer isso na voz passiva e veja se o efeito se mantém. Vamos lá: "As linhas do destino nas mãos foram apagadas pela mão". Que tal? Cruz-credo!
Pois bem. Ontem, o advogado de um padre de Niterói (RJ) disse que seu cliente (indiciado por estupro de vulnerável) caiu em uma armadilha "malévola" etc. "Ele foi seduzido", disse o advogado. Conscientemente ou não, o causídico proferiu a frase na voz passiva e, com isso, pôs o seu cliente ("Ele") como sujeito paciente, alvo, isto é, vítima. Na voz ativa ("A menina o seduziu", "A menina seduziu o padre" etc.), o efeito certamente não seria o mesmo, ou seja, a vitimização do padre seria menos "branda".
Só faltou ao advogado lançar mão de um modismo, um tanto tosco, como muitos modismos: dizer que o padre foi "abusado" pela menina. Bem, se a frase terminasse em "abusado", a coisa seria diferente, talvez mais próxima do real, a julgar pelo que já se viu e já se leu dessa história, mais uma macabra história dos nebulosos caminhos de algumas sotainas. Em tempos de renúncia papal... É isso.

Ônibus gratuito - Marcelo Miterhof

folha de são paulo

Ônibus gratuito
O Brasil precisa adotar a prática de subsidiar pesadamente a operação dos transportes coletivos
A coluna passada tratou dos lentos avanços no transporte coletivo, o que é em certa medida surpreendente, pois, dado seu impacto sobre o bem-estar cotidiano da população, boas iniciativas no setor são recompensadas eleitoralmente.
Nesse sentido, lembrei que a alta popularidade da ex-prefeita Marta Suplicy nas periferias de São Paulo se deve em boa parte à criação do Bilhete Único. Porém, a necessidade de elevar as receitas para subsidiar essa e outras políticas públicas se refletiu em sua rejeição nas regiões mais ricas da cidade.
Por isso, defendi que -além de fortalecer o planejamento, o que permite melhor avaliar as opções existentes e seus custos- as decisões sobre o transporte público deveriam ser submetidas mais diretamente à população, por exemplo em orçamentos participativos.
Assim, seria mais fácil avaliar a adoção de subsídios públicos operacionais, que são cruciais para a eficiência dos transportes coletivos.
Em 2011, participei de um seminário sobre tecnologias de motorização de ônibus no qual o representante de uma montadora disse que no Brasil, ao contrário do resto do mundo, a empresa não aposta em motores elétricos ou híbridos. A razão é que aqui em geral não há subsídios para a operação dos ônibus.
Essa era uma preocupação com a política industrial. Mas o caso aponta para os problemas que a rara presença de subsídios traz para o transporte coletivo no país. Por exemplo, o tipo de veículo mais comum no Brasil é feito de chassis de caminhão com carroceria de ônibus. Isso faz, por exemplo, com que pessoas com dificuldade de locomoção tenham que subir altos degraus para entrar nos ônibus.
Alguns grupos têm na comercialização de ônibus novos e usados um negócio mais importante do que a atividade de transportar pessoas.
Isso significa que usar um modelo de alta qualidade, durável e mais caro tende a ser pior negócio do que usar outros mais simples, baratos e que podem ser depreciados em poucos anos -e revendidos em seguida-, sob uma tarifa suportável pela população mais pobre.
Como entendem técnicos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), uma ONG que trabalha com mobilidade urbana à qual me referi na semana passada, sem subsídios é difícil otimizar o transporte público, pois o impacto na tarifa o faz perder competitividade. Por exemplo, ter uma motocicleta pode sair mais barato do que andar de ônibus ou metrô.
Os malefícios são diversos: mais acidentes, engarrafamentos e poluição. Com problemas tão generalizados, o subsídio vai além de uma política social de favorecimento dos usuários dos transportes coletivos.
Nesse sentido, gostaria de ver em prática uma opção radical: tarifa zero para o transporte coletivo, que seria financiado totalmente por impostos. Entre eles pode haver uma taxa municipal que incida juntamente com o IPTU, um adicional sobre o IPVA de veículos de regiões metropolitanas para financiar metrô e trens e ainda um tributo que capture o que as empresas já gastam com o vale-transporte. As transportadoras seriam remuneradas pelos quilômetros rodados.
Num transporte público eficiente não há desperdício. As pessoas se deslocam porque precisam. É diferente, por exemplo, de manter tarifas de eletricidade muito baixas, o que tende a prejudicar a conservação de energia. No transporte de passageiros, se alguém quer somente passear num ônibus pela cidade -algo bem incomum em comparação a esquecer lâmpadas acesas-, esse é um uso justificável.
O planejamento, a alocação da oferta de transporte, a definição dos tipos de veículo, a fiscalização e outras questões operacionais poderiam ser feitos por uma agência reguladora, que atuaria em conjunto com prefeituras e governo estadual, que seriam os responsáveis pelos investimentos em infraestrutura.
Uma iniciativa assim seria mais fácil de começar numa cidade média, sem transporte de passageiros sobre trilhos, mas nada impede de ser adotada em regiões metropolitanas, integrando ônibus, metrô, trens e meios alimentadores.
Essa é apenas uma ideia. O importante é que o Brasil precisa adotar a prática internacional de subsidiar pesadamente a operação dos transportes coletivos para ter um sistema eficiente. Espero que um prefeito perceba que essa é uma iniciativa à espera de um líder, que mostre o quanto isso faz diferença para a população.

    Buraco negro fica "obeso" porque come tudo de uma vez, sugere estudo

    folha de são paulo

    SALVADOR NOGUEIRA
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    Aparentemente, os buracos negros gigantes que existem no coração de cada galáxia não seguem o conselho da vovó para crescer fortes e saudáveis. Em vez de fazer várias refeições balanceadas, sem exagerar, eles comem poucas vezes, mas em quantidades brutais.
    É o que sugere o resultado obtido por um grupo internacional de astrônomos publicado hoje no periódico britânico "Nature". A equipe conseguiu determinar, sem deixar margem a dúvidas, que o buraco negro supermassivo no núcleo da galáxia NGC 1365 gira em velocidades estonteantes.
    Nasa/Reuters
    Ilustração mostra buraco negro supermassivo na galáxia NGC 1365
    Ilustração mostra buraco negro supermassivo na galáxia NGC 1365
    Trata-se de um objeto com 2 milhões de vezes a massa do Sol, que projeta uma força gravitacional tão intensa que, ao se aproximar demais, nada pode escapar dele --nem mesmo a luz (fenômeno que justifica o nome "buraco negro").
    O feito, encabeçado por Guido Risaliti, do Observatório Astrofísico de Arcetri, na Itália, só foi possível com a combinação de observações de dois telescópios espaciais de raios X: o velho XMM-Newton, da Agência Espacial Europeia, e o novíssimo NuSTAR, da Nasa.
    Juntos, eles obtiveram observações com precisão sem precedentes dos raios X que são emitidos na borda do buraco negro supermassivo, conforme matéria está prestes a cair nele e é acelerada a velocidades próximas às da luz (300 mil km/s).
    "Podemos rastrear a matéria conforme ela roda na direção do buraco negro usando os raios X emitidos das regiões mais próximas dele", diz Fiona Harrison, pesquisadora do Caltech que participou do estudo.
    Com isso, eles constataram que o próprio buraco está girando muito depressa, a 84% da velocidade máxima possível prevista pela teoria.
    Pode parecer mera nota de rodapé, mas essa informação ajuda a compreender como se formam as galáxias e, em seu núcleo, os buracos negros supermassivos.
    Estima-se que esses objetos tenham surgido praticamente junto com as galáxias, há mais de 13 bilhões de anos (o Universo tem "apenas" 700 milhões de anos a mais que isso).
    Contudo, os astrônomos imaginam que eles tenham começado com cerca de 10 mil vezes a massa do Sol. Um bocado, mas ainda assim longe dos milhões ou até bilhões de massas solares que eles devem ter hoje.
    A grande questão é: como eles cresceram tanto? Teriam eles paulatinamente engolido estrelas, uma após outra, até ficarem gordões desse jeito, ou grandes quantidades de matéria consumidas de uma só vez foram responsáveis pelo crescimento?
    O resultado sugere a segunda possibilidade. Pela teoria, se o crescimento fosse paulatino, a velocidade de rotação do buraco negro seria relativamente baixa. O resultado observado sugere que o crescimento do buraco negro no coração da galáxia se dá em grandes saltos --possivelmente quando duas galáxias colidem e dois buracos negros supermassivos se encontram e se fundem.
    Resta saber se NGC 1365 é um caso típico ou se há também, em algumas galáxias, buracos negros supermassivos de baixa rotação, que cresceram seguindo os conselhos dos nutricionistas.

    Estudo acha riscos genéticos comuns a transtornos mentais

    folha de são paulo

    Bases biológicas poderão ser usadas no futuro para diagnóstico e tratamento
    MARIANA VERSOLATODE SÃO PAULOPela primeira vez, um estudo mostrou que cinco transtornos psiquiátricos -autismo, depressão, TDAH (transtorno de deficit de atenção e hiperatividade), transtorno bipolar e esquizofrenia-compartilham fatores de risco genéticos.
    A conclusão é dos pesquisadores do Consórcio de Genética e Psiquiatria, dos Estados Unidos.
    O trabalho, publicado hoje no periódico médico "Lancet", revisou o genoma de mais de 33 mil pacientes com diagnóstico de doenças psiquiátricas e de 27 mil voluntários de um grupo-controle, sem os transtornos, em busca de variações do DNA que poderiam causar a suscetibilidade às cinco doenças.
    O resultado é a identificação de regiões com similaridades para os transtornos em dois cromossomos e em dois genes ligados aos canais que regulam o fluxo de cálcio nas células do cérebro.
    O estudo aponta que uma via biológica específica relacionada aos canais de cálcio ("poros" celulares) contribui para a patogênese de diversos problemas psiquiátricos e reafirma o potencial dessa via como um alvo para novas classes de remédios.
    Segundo os autores, as conclusões do estudo oferecem evidências para que as bases biológicas sejam usadas no diagnóstico e para a classificação dos transtornos. Por ora, o diagnóstico se baseia na análise clínica.
    CAIXA-PRETA
    Segundo Emmanuel Dias Neto, pesquisador associado do Laboratório de Neurociências do Instituto de Psiquiatria da USP e cientista adjunto do Hospital A.C. Camargo, o estudo tem grande impacto pela quantidade de pacientes envolvidos e é interessante porque analisa o que essas doenças têm em comum.
    "O estudo mostra que elas têm 'caminhos moleculares' parecidos", afirma.
    Ele lembra, porém, que ainda não há aplicação prática do achado para quem tem uma dessas doenças.
    "Estamos começando a conhecer a caixa-preta que é o genoma. No futuro, cada transtorno será visto como uma alteração de determinadas moléculas, o que deve personalizar o tratamento."

      Painel - Vera Magalhães

      folha de são paulo

      Ordem unida
      O apelo do PT para que CUT e MST se integrem às caravanas de Lula tem como objetivo engajar essas entidades à "campanha permanente" de Dilma Rousseff, deflagrada com a antecipação da disputa de 2014. Petistas entendem que precisarão vencer resistências imediatas desses setores à presidente para que eles não criem obstáculos ao projeto de reeleição. Há contenciosos: centrais acham que o governo ignora a pauta sindical, e o ritmo da reforma agrária é considerado lento.
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      Em casa Mônica Valente, mulher de Delúbio Soares, foi homenageada pela CUT ontem no evento aberto por Lula em São Paulo. O ex-tesoureiro condenado no mensalão foi um dos mais festejados.
      Flerte Comitiva da Força Sindical irá a Recife para "visita de cortesia" a Eduardo Campos (PSB-PE) na segunda-feira. O governador fará palestra em encontro da direção da entidade em abril.
      Só love Além de confirmar presença na convenção do PMDB no sábado, Dilma recebe hoje os líderes Eduardo Cunha (Câmara) e Eunício Oliveira (Senado). Na solenidade do fim de semana, a presidente deve discursar e dividir as conquistas do governo com o principal aliado.
      Âncora O Planalto determinou ontem que a condução da medida provisória dos portos passe ao Congresso. O líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), deve coordenar negociação com as centrais sindicais.
      Pressa Em conversa com Braga, ontem, Dilma pediu agilidade na aprovação do projeto que cria o Ministério da Micro e Pequena Empresa, que deverá ser entregue ao PSD de Gilberto Kassab.
      Asas A cobiça de PSD, PR e PMDB pela Secretaria de Aviação Civil se justifica pelo fundo de R$ 7,3 milhões que financiará a construção de pequenos aeroportos regionais. O dinheiro virá da outorga de terminais concedidos pelo governo federal.
      Canelada Setores do PT voltaram a se movimentar para puxar o tapete de Aldo Rebelo e assumir o Ministério do Esporte, empurrando o aliado para a coordenação política. A sinalização do Planalto, no entanto, é que a presidente não mexerá na pasta.
      Adeus Dilma enviará hoje uma carta de despedida a Bento 16. Será a primeira vez que a presidente se manifestará após o anúncio da renúncia do papa, no dia 11. Ela retoma, assim, as relações com o Vaticano, frias desde a campanha de 2010.
      Brinde Luís Inácio Adams foi saudado no jantar oferecido ontem pelo vice-presidente Michel Temer no Palácio do Jaburu, ao qual chegou junto com Dilma. A derrubada da liminar que obrigava a análise dos vetos presidenciais em ordem cronológica ajudou a restabelecer o prestígio do titular da AGU.
      UPP Jaques Wagner entregou a Joaquim Barbosa carta em que manifesta interesse da Bahia em abrigar a Universidade Mundial de Segurança e Desenvolvimento Social, parceria da ONU com o governo brasileiro. Caberá ao STF definir a sede do projeto, aprovado no Fórum de Bellagio, na Itália, em 2011.
      Oremos Servidores do Tribunal de Justiça de São Paulo terão palestra motivacional do padre Fábio de Melo, campeão católico de vendagem de livros e CDs.
      Bandeira branca Barros Munhoz, presidente da Assembleia paulista, visitou ontem Márcio Elias Rosa, procurador-geral da Justiça. Em meio à guerra de deputados e promotores pela tramitação da PEC que limita investigações do Ministério Público, o tucano quis reafirmar "respeito institucional".
      com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI
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      TIROTEIO
      "Como líder, expresso a opinião do meu partido. Infelizmente, outros expressam a opinião que serve a outras legendas."
      DO SENADOR RODRIGO ROLLEMBERG (PSB-DF), sobre Cid Gomes ter dito que ele é um dos que mais estimulam Eduardo Campos a se candidatar ao Planalto.
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      CONTRAPONTO
      Love is in the air
      Em viagem à Espanha, o ministro Paulo Bernardo (Comunicações) telefonou anteontem para a mulher, Gleisi Hoffmann, chefe da Casa Civil de Dilma Rousseff.
      -Tudo certo com você e as crianças? Estou saindo para os últimos compromissos e depois vou ao aeroporto. Chego amanhã cedo.
      A ministra respondeu:
      -Pensei que chegaria hoje! Então não vamos nos ver? Lembrando que Gleisi viajaria a Londres, onde participará do road-show de obras do governo, Bernardo disse:
      -Vamos sim! Se ficar atenta, na travessia do Atlântico.

        Marina Colasanti - A bordo com o felino‏


        Estado de Minas: 28/02/2013 

        E assim, domingo, o diretor Ang Lee recebeu o Oscar de melhor direção pelo filme As aventuras de Pi, e o mesmo filme levou mais três estatuetas. Não fiquei na frente da televisão para ver a noite fetiche do cinema americano, mas no dia seguinte, lendo os jornais, pensei em Moacyr Scliar e em outro amigo, Antonio Orlando Rodriguez.

        Todos sabem, a história de Pi é a mesma história de Max. Em outro contexto, mas a mesma história. Max é um jovem alemão do século 20 que cresceu temeroso e inseguro sob o jugo de um pai severíssimo, e que já adulto, envolvido eroticamente com a mulher de um militar nazista, se vê obrigado a deixar o país. E o faz de navio. Pi é um jovem cuja família, dona de um zoológico em Pondicherry, na Índia, se vê premida pela situação econômica a deixar o pais. E o faz de navio.

        A história de Max foi escrita por Moacyr Scliar em 1980 e publicada em inglês em 1990. A de Pi foi escrita pelo canadense Yann Martel em 2002.

        Todo mundo já sabe que os dois navios naufragam no meio da viagem e que tanto Pi quanto Max se vêm obrigados a lutar pela sobrevivência disputando com um felino o restrito espaço de um bote salva-vidas.

        Mas pouca gente sabe que no oceano narrativo esses acontecimentos parecem se multiplicar, pois outra embarcação salva-vidas navegou quase na mesma época levando uma mulher e um leão. É o que acontece na peça El león y la domadora, escrita pelo cubano Antonio Orlando Rodriquez, e apresentada pela primeira vez em Bogotá, pelo grupo Mapa Teatro, em 1998.

        Antonio Orlando, amigo querido com quem estarei na próxima semana em um congresso na Colômbia, vive hoje em Miami, recebeu em 2008 o prêmio Alfaguara de romance, é autor multipremiado, e com Sergio Andricaín criou o portal Cuatrogatos de literatura infantojuvenil. Quando escreveu a peça, morava em Bogotá. A história, que ele mesmo me contou, é claramente referente a Cuba: leão e domadora estão ao largo em uma espécie de jangada que ela construiu quando, faltando meios, e sobretudo faltando carne na ilha em que viviam e onde atuavam no circo, decidiram emigrar. O leão é depressivo, a domadora é dominante, mas a falta de carne a bordo tende a desequilibrar a situação.

        Yann criou sua história ao ler uma resenha do livro de Scliar. A intenção de Scliar havia sido discutir, por meio de metáforas, o enfrentamento entre judeus e nazistas; ali estão o pai repressivo, o nazi ameaçador e a personalidade submissa que precisa erguer-se e enfrentar a fera para sobreviver. Antonio Orlando, que desconhecia o livro de Scliar e escreveu sua peça antes que Martel escrevesse A vida de Pi, também recorreu às metáforas para elaborar a situação da ilha e seu próprio processo de desligamento.

        A viagem com o felino é comum a todos os que emigram. Que seja tigre, jaguar ou leão. Nem é necessário o naufrágio. Aquele que vai em busca de uma terra a conquistar leva a fera consigo, ela é o risco do fracasso, o medo do desconhecido, a funda consciência de que será necessário passar de caça a caçador.

        Ang Lee ganhou esse Oscar pela direção, e merecia. Parece provável que tenha levado um felino consigo ao se transferir de Taiwan para os Estados Unidos. E todos os que vimos O tigre e o dragão já sabíamos de sua aguçada sensibilidade no trato com as feras.

        TV PAGA

        Eestado de Minas - 28/02/2013

        Clube do filme

        Numa quinta-feira sem grandes novidades na programação de filmes, um dos destaques é o clássico Janela indiscreta, do mestre do suspense Alfred Hitchcock, às 22h, na TV Cultura. James Stewart (foto) é um fotojornalista com a perna quebrada, confinado em seu apartamento, que sem ter o que fazer passa a olhar pela janela e controlar a vida dos vizinhos. Até que, numa noite insone e sufocante, desconfia que um homem matou a mulher.

        Telecine exibe A General,
        do genial Buster Keaton

        Outro clássico do cinema, a comédia A general, com Buster Keaton, é a atração do Telecine Cult, às 22h. No Telecine Action, hoje é dia de Adrenalina em dose dupla, com Arnold Schwarzenegger em O sobrevivente (20h10) e Fim dos dias (22h). Na mesma faixa das 22h, o assinante tem mais oito opções: Guerra é guerra, no Telecine Premium; Sua alteza?, no Telecine Fun; The girl, na HBO2; Sou espião, no AXN; Como se fosse a primeira vez, no Sony; Força policial, no Space; Habitantes da escuridão, na MGM; e Maratona da morte, no TCM. E ainda: Serpentes a bordo, às 20h, no FX; Escorregando para a glória, às 21h, no Comedy Central; e Filme socialismo, às 21h10, no Max.

        O rock’n’roll vai agitar
        hoje os canais Bio e Vh1


        Para quem curte rock,
        uma boa pedida hoje é o especial sobre o músico britânico Billy Idol, que vai ao ar às 18h15, no canal Bio, relembrando sua trajetória, os grandes sucessos, como Dancing with myself, Mony mony, Eyes without a face e Flesh for fantasy, e o perigoso envolvimento com drogas. No Vh1 vai rolar uma maratona da série Video killed the radio star a partir das 21h, com artistas e grupos como Bob Geldof, AC/DC, Sting e U2.

        Canal E! convida para a
        balada em Punta del Este


        O canal E! exibe hoje, às 22h30, o especial Fashion travel Punta del Este, que vai levar o assinante ao badalado balneário uruguaio, onde turistas e celebridades de todo o mundo buscam relax e diversão, praias paradisíacas, ondas ideais para o surfe, pousadas sofisticadas, restaurantes mais exclusivos e uma vida noturna que nunca tem fim. Entre os destaques, a festa do luxuoso Hotel Conrad, o torneio de golfe La Barra e o Torneio de Polo Fiat.

        NatGeo realiza maratona
        com séries sobre a guerra


        O NatGeo dá continuidade à programação especial Quintas de guerra, exibindo esta noite, a partir das 21h30, os episódios finais da série Redescobrindo a 2ª Guerra (“O Dia D” e “O apocalipse”) e mais dois da série O apocalipse nazista (“De Adolf Hitler” e “Ascensão de Hitler”).

        Bem Simples deixa todo
        mundo com água na boca


        No canal Bem Simples, hoje é dia de Cozinha caseira, às 22h30. Carole Crema e chefs como Bárbara Verzola, Marina Hernandez, Mariana Valentini, Alessandra Blanco, Mariana Palmeira, Adelaide Engler, Eleonora Stefani, Fabiana Agostini e Duca Lapenda ensinam a fazer salada de camarão com abacate e hortelã, frutas com sorvete, rolinhos de berinjela e suco de laranja com amora.

        Tereza Cruvinel - Início do necessário‏

        Uma reforma política mínima, mas corajosa, é que pode conter a inclinação da sociedade pela satanização da política. O resto é um bom e necessário começo 


        Estado de Minas: 28/02/2013 

        A Câmara aprovou ontem por unanimidade o fim do 14º e do 15º salários dos parlamentares, matéria que o Senado já havia aprovado. Era uma dívida, um fardo que pesava sobre a Casa. Com habilidade e rapidez, contrariando o baixo clero, o novo presidente, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), construiu o consenso partidário que o jogou ao mar. Mas será mesmo essa medida capaz de resgatar “a altivez e a dignidade do Parlamento brasileiro”, como ele escreveu em seu Twitter depois da votação? Foi um passo, mas ainda há muito caminho a andar.

        Uma evidência de que a supressão das regalias, por si só, não tem efeito tão significativo para a restauração do respeito ao Legislativo: o Senado, embora tenha aprovado a mesma medida em maio do ano passado, não teve refresco no resto do ano e agora enfrenta essa campanha equivocada pedindo a destituição do presidente eleito Renan Calheiros (PMDB-AL). Equivocada porque a garantia de participação popular existe em relação ao processo legislativo. Subscrições de um milhão de eleitores podem propor leis e emendas, mas não interferir nos processos administrativos internos, como a eleição da mesa. Quem tem mandato tem legitimidade, pode votar e ser votado nas eleições internas. O veto do eleitor deve acontecer lá atrás, barrando os candidatos que não julgam merecedores de mandato.

         Mas a Câmara precisava mesmo aprovar a matéria. Sempre que o assunto vinha à baila, os senadores diziam: nós votamos, mas a Câmara segurou o projeto. Agora enviou à sociedade um sinal de que está buscando a sintonia perdida. Assim como Alves, Renan e seus pares, no Senado, também têm uma agenda positiva. Despesas foram suprimidas, procedimentos novos estão sendo adotados, como a adequação do regimento de modo a permitir sessões especiais para grandes debates temáticos. Até a oratória, hoje uma arte esquecida, que já teve grandes praticantes naquela casa, como Paulo Brossard, Marcos Freire, Jarbas Passarinho, e no passado mais distante, Rui Barbosa, Duque de Caxias, JK e Affonso Arinos, entre outros, poderá dar o ar de sua graça.

        Mas, para a restabelecer de fato o respeito ao Congresso, será necessária uma transformação no modo de escolher os representantes, vale dizer, nas regras eleitorais. Isso é a reforma política, que Henrique Alves também promete enfrentar. Sempre realista, o primeiro vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC), afirma: “Medidas de austeridade são importantes, mas não teremos sucesso se a reforma política não for aprovada, e tratar, por exemplo, do fortalecimento dos partidos. Se não abordar o financiamento de campanha, que em boa parte já é público, mas não é assumido como tal, porque sofre a intermediação de interesses privados. Precisamos valorizar o voto do cidadão, dando-lhe transparência efetividade. Enquanto o poder econômico der as cartas nas eleições, não vamos ter igualdade de oportunidade para todos os candidatos”. Muito menos para as candidatas, provado está que as mulheres têm muito menos acesso às fontes privadas de financiamento. Por isso, as cotas para mulheres não reduziram nossa vergonhosa desigualdade de gênero no parlamento.

         Uma reforma política mínima, mas corajosa é que pode conter a inclinação da sociedade pela negação e a satanização da política. O resto é um bom e necessário começo.

        Ninho paulista

        Boa parte do que está acontecendo nos movimentos eleitorais não foi combinada ainda com as elites (políticas e econômicas) daquele poderoso vizinho do Brasil chamado São Paulo. Principalmente no PSDB. Fernando Henrique tem apoiado decididamente a candidatura do senador mineiro Aécio Neves, mas ele, hoje, está mais para papa do que para um cardeal que realmente tange as ovelhas.

        O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, ator relevante naquele rincão, ainda não entrou no jogo. Assim como o recolhido ex-governador José Serra. Alckmim busca a reeleição, que ficou mais difícil depois da crise na área de segurança pública, que o tornou impopular. Mas ele tem US$ 12 bilhões para investir este ano. Bem usados, podem aumentar seu cacife. A Assembleia Legislativa paulista é a única que só elege sua mesa diretora em março. Depois que isso ocorrer, Alckmin fará uma reforma do secretariado, que pretende tornar mais robusto para enfrentar a reeleição.

        Se vai disputar a reeleição, apoiará Aécio para presidente. Parece óbvio, mas ainda não aconteceu. No fim de janeiro, Aécio o visitou e perguntou se pretendia disputar a Presidência. Ele negou, disse ter tido sua vez, agora queria se reeleger. Aécio então jogou a segunda carta: só seria candidato com seu apoio explícito. Em sinal, disse, gostaria que ele participasse de ato com ele em Minas. Alckmin disse que sim, mas era cedo.

        Sabe-se, entre os tucanos, que através do deputado Márcio França, do PSB, o governador Eduardo Campos tem lhe enviado mensagens. Elas sugerem que, mesmo apoiando Aécio, o governador devia guardar “espaço” em sua base eleitoral para o socialista. Isso lhe daria peso num eventual segundo turno em que o tucano ficasse de fora.

        Desencantar Alckmin, eis a tarefa de Aécio agora.

        Fortaleza no mapa

        Prossegue a corte petista aos irmãos Cid e Ciro Gomes, cunha na unidade do PSB em torno da candidatura presidencial do governador Eduardo Campos. O ex-presidente Lula e outros luminares do PT estarão hoje em Fortaleza, abrindo o primeiro dos 13 seminários do PT por seus 10 anos no poder.  Em 13 de março, a presidente Dilma Rousseff é que será recebida com grande festa na capital cearense pelo governador Cid Gomes, para inaugurar a zona de processamento de exportações do estado.

        Kassab se lança como candidato a governador de SP

        folha de são paulo

        Prestes a formalizar apoio à reeleição de Dilma Rousseff, ex-prefeito diz que PSD terá candidatura própria no Estado
        Kassab espera ter aliado no ministério até março e planeja anunciar apoio à petista em seguida
        FERNANDO RODRIGUESDE BRASÍLIAO ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, presidente do PSD, esteve ontem em Brasília e se lançou como candidato ao governo paulista nas eleições de 2014. "Eu gostaria de ter essa oportunidade", declarou à Folha. "Todos sabem que a minha candidatura tem naturalidade."
        Kassab afirmou que o apoio que seu partido está prestes a formalizar à reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT) não impedirá o PSD de ter candidato próprio ao Palácio dos Bandeirantes.
        "As circunstâncias estaduais são diferentes da circunstância nacional", disse. "Sonho em um dia ter a oportunidade de oferecer o meu nome, o meu trabalho, para ser governador de São Paulo."
        A entrada do ex-prefeito na disputa estadual indica que o bloco governista poderá ter três candidatos desafiando o governador Geraldo Alckmin (PSDB), que concorrerá à reeleição. Além de Kassab, deverão estar no páreo Paulo Skaf (PMDB) e um nome do PT, por enquanto indefinido.
        Ontem, em Brasília, havia especulações sobre uma candidatura do ministro da Fazenda, Guido Mantega, pelo PT. O nome dele não é comumente mencionado dentro da sigla, mas teria se robustecido nos últimos tempos porque o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não se convenceu ainda da viabilidade dos outros citados até agora.
        Os ministros Aloizio Mercadante (Educação), Alexandre Padilha (Saúde) e Marta Suplicy (Cultura) disputam a indicação no PT para concorrer. O prefeito de São Bernardo do Campo, Luiz Marinho, é outro petista no páreo.
        Embora tenha controle sobre o PSD, Kassab disse que o apoio a Dilma só será anunciado depois que for formalizado por escrito pelos 27 diretórios estaduais do partido.
        Três diretórios anunciaram ontem a intenção de apoiar a reeleição de Dilma: Bahia, Rio Grande do Norte e Rondônia. Se o cronograma imaginado por Kassab for cumprido, as consultas aos diretórios serão concluídas até junho, e o PSD será o primeiro grande partido a formalizar o apoio à reeleição de Dilma.
        Embora seja uma legenda nova, o PSD se tornou a terceira maior sigla do Brasil para efeito de tempo de rádio e TV no horário eleitoral. Só perde para o PMDB e para o PT. A quarta maior legenda por esse critério é o PSDB.
        Antes de declarar o apoio a Dilma, o PSD espera ganhar um ministério. Guilherme Afif Domingos, hoje vice-governador de São Paulo, deve ser nomeado em março chefe da Secretaria da Micro e Pequena Empresa -pasta que ainda depende do aval do Senado para ser criada.
        O cronograma do partido, então, inclui receber um ministério em março e oferecer apoio à reeleição de Dilma Rousseff em junho. Kassab afirma que os dois fatos não têm relação. "É inaceitável para o partido a prática do toma lá dá cá. Não existe nenhuma vinculação", disse.
        Alvo de críticas nas últimas semanas da gestão do petista Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo, Kassab preservou seu sucessor. Mas atacou de maneira genérica administração paulistana.
        "Às vezes eu tenho um pouco de preocupação com membros da sua equipe [de Haddad], que entendem que os problemas que tem a cidade são problemas herdados de uma administração. É um grande equívoco, tamanha infantilidade, que causa até, em alguns formadores de opinião, uma certa preocupação com a falta de maturidade na afirmação", disse Kassab.

          PSD terá vaga após mudança em ministérios
          DE BRASÍLIAA reforma ministerial a ser promovida pela presidente Dilma Rousseff deve ganhar força depois da convenção do PMDB, prevista para sábado.
          O PSD de Gilberto Kassab deverá ser acomodado na nova Secretaria da Micro e Pequena Empresa.
          Mas não há expectativa de trocas vultuosas, até porque a verdadeira reforma virá em 2014, quando titulares de pastas cobiçadas devem deixar seus cargos para se candidatar ao governo de Estados, caso de Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio).
          O deputado federal Gabriel Chalita (PMDB-SP) foi praticamente descartado depois de denúncias envolvendo seu nome. Dilma desistiu de indicá-lo ao Ministério de Ciência e Tecnologia e até peemedebistas dizem que a nomeação dele ficou complicada.
          Ministros afirmam que a equipe econômica tende a permanecer intacta. Dilma cogita dar a pasta da Aviação Civil ao PR, que pressiona para ampliar seu espaço.
          A presidente estuda ainda manter Paulo Sérgio Passos, que apesar de filiado ao PR não é considerado uma indicação da legenda, no Ministério dos Transportes. O PMDB, porém, se interessa pela pasta -e pode indicar o deputado federal Leonardo Quintão (PMDB-MG).

            Sonho real - Walter Sebastião

            Estreia Colegas, filme brasileiro protagonizado por três portadores de síndrome de Down. A premiada comédia dribla o pieguismo e aposta no humor para enfrentar o preconceito 


            Walter Sebastião

            Estado de Minas: 28/02/2013 

            No material de divulgação para festivais internacionais, o filme Colegas, do diretor Marcelo Galvão, tem sido apresentado como a nova surpresa do cinema brasileiro. É verdade. Essa comédia sarcástica sobre o preconceito mostra a aventura de três jovens, confinados em uma instituição para portadores de síndrome de Down, que fogem para conhecer o mundo. O trio apronta todas ao som de Raul Seixas.

            Os protagonistas entendem do assunto: Ariel Goldenberg, de 31 anos, Rita Pokk, de 32, e Breno Viola, de 31, têm síndrome de Down. “Fiz um filme sobre sonhos. Eles são mais fáceis de realizar do que a gente imagina. O que Ariel Goldenberg conseguiu na vida mostra isso”, afirma o cineasta Marcelo Galvão. Colegas estreia amanhã em cinco salas de BH.

            A comédia diverte e emociona. “Depois de cinco minutos, todos se esquecem de que os atores têm síndrome de Down, passam a torcer pelos personagens e entendem o ponto de vista deles ”, garante Marcelo Galvão. Ele se propôs a fazer um road movie sobre a liberdade – o blockbuster Forrest Gump foi uma de suas inspirações –, com imagens grandiosas de lugares amplos.

            “A síndrome é parte da vida dos atores, mas abordei isso de forma jocosa, sem ser politicamente correto”, pondera o cineasta. O filme, de fato, nada tem de piegas. “Em Colegas, deficientes são os policiais que não conseguem pegar a trinca de garotos”, ressalta o diretor, que buscou captar a energia dos portadores de Down. Inclusive do tio de Marcelo Galvão, a quem o longa é dedicado. “Adorava o modo como ele via o mundo. Divertido e engraçado, tinha um coração gigantesco”, recorda o sobrinho.

            Ariel Goldenberg, Rita Pokk e Breno Viola foram selecionados depois de entrevistas com cerca de 300 garotos. Agora, Marcelo Galvão planeja rodar um seriado para aproveitar parte dessa moçada. O cineasta diz que o talento do trio para o lúdico ajudou Colegas, mas ressalta que as dificuldades dos atores, com a fala, estão na tela. Entretanto, isso não representou problema. “Você explicava como é o personagem e, em segundos, eles já eram o que se pediu”.

            Foi preciso até “segurar” a turma de atores. “Senão o balão subia demais”, conta Marcelo Galvão. “O mais importante tem sido a boa acolhida do público, de todos os lugares e idades. Colegas vem sendo aplaudido em cena aberta”, comemora ele. Ariel trabalhou na novela Jamais te esquecerei (SBT), no seriado Carga pesada (Rede Globo) e em peças de teatro. Rita atuou na mesma novela e em espetáculos teatrais. Breno também é faixa preta de judô e coordenador do site Movimento Down.

            Edital Aos 39 anos, Galvão assinou cinco longas. Colegas foi o primeiro a ganhar exibição comercial. “Não filmo com muito dinheiro, não tenho a Globo Filmes por trás de meus trabalhos e nem faço campanhas grandes. A repercussão desse longa se deve a muita gente bacana comprou a ideia. Dá para fazer cinema sem ficar esperando edital ou ganhar o Sundance”, diz o diretor, citando o aclamado festival norte-americano dedicado à produção alternativa.

            “Essencial é o foco. Colegas é meu TCC”, conclui Marcelo Galvão, referindo-se aos trabalhos de conclusão de curso.

            Premiações

            » Festival de Gramado 2012
            Melhor filme, direção de arte e prêmio especial do júri

            » Mostra de São Paulo
            Troféu Juventude (com voto de estudantes)

            » Festival de Moscou
            Melhor filme

            » Festival de Trieste
            Melhor filme/mostra latino-americana, prêmio do público



            Vem, Sean!

            Um pequeno e simpático vídeo ligado a Colegas – a hashtag #vemseanpenn – vem provocando alvoroço na internet. Ariel Goldenberg surge contando que seu ídolo é o norte-americano Sean Penn (foto) e convida o astro americano para para a estreia do filme brasileiro. Em Uma lição de amor (2001), o ator fez o papel de um portador de deficiência mental que luta para criar a própria filha.

            Tudo começou quando Ariel comprou passagem para os EUA, disposto a fazer o convite pessoalmente a Penn, mas não conseguiu que o visto de entrada no país fosse emitido a tempo. “Nunca imaginamos conseguir 150 mil visualizações nas primeiras 24 horas, entrar para os trending topics do Twitter no Brasil e que o vídeo se tornasse fenômeno de compartilhamentos no Facebook, com a adesão de Juliana Paes, Neymar, Fernando Henrique, Aécio Neves, Rogério Flausino, Bruno Garcia e Falcão, entre outros”, comenta o cineasta Marcelo Galvão. A missão parece impossível, mas Sean Penn é esperado para a estreia brasileira de Colegas. “Temos a esperança de que ele venha. Se não vier, dá para levar Ariel até lá para conhecê-lo”, diz o diretor.




            Boa surpresa



            A recente cinematografia nacional tem obras notáveis, mas, na maioria dos casos, introvertidas, intimistas e autorreferenciais. Isso acaba limitando a apresentação mais comunicativa de novas questões trazidas pela vida contemporânea e, especialmente, a compreensão ampliada de pesquisas formais de grande valor estético. Desafio posto é o entendimento de que a produção independente, de onde vem a renovação do cinema brasileiro, não significa, necessariamente, filmes ensimesmados.

            A primeira boa surpresa de Colegas vem exatamente do fato de ser obra independente, mas destoando do tom dominante. É um filme solar, engraçado e extrovertido – original na forma e no conteúdo. De um lado, mistura sem pudor o cult e o pop, assim como vários gêneros. De outro, ao abordar a condição Down, toca em um tema que resiste à discussão: a falta de conhecimento e de educação, fonte de grosserias na comunicação interpessoal.

            Tudo é ótimo em Colegas – roteiro, diálogos, fotografia, trilha, atores e montagem. Pode-se observar perda de ritmo ao fim da trama, mas ela é movida por imagens tão boas que nem dá para reclamar. Trata-se de um filme de muitas estrelas. Merece destaque o talento de Marcelo Galvão, que escreve, monta, dirige e produz os próprios trabalhos, exibindo linguagem cinematográfica diferente e ousada. Também chama a atenção a enorme habilidade do diretor para driblar todas as armadilhas postas a produções como Colegas. (WS)

            Na despedida, papa faz menção a dificuldades

            folha de são paulo

            Bento 16 formalizará hoje renúncia; sucessor deve ser escolhido em março
            Estima-se que 150 mil pessoas estiveram na praça São Pedro para ouvir papa, que pediu oração pelos cardeais
            CLÓVIS ROSSIENVIADO ESPECIAL A ROMA
            O papa Bento 16 despediu-se ontem do público com uma alusão direta à crise da igreja, ao dizer que, nos últimos anos, ela assistiu "a momentos de alegria e luz, mas também a momentos difíceis", durante os quais "as águas eram agitadas, e o vento, contrário (...) -e o Senhor parecia estar adormecido".
            Mas o tom queixoso logo deu lugar a uma profissão de fé: "Não obstante, eu sempre soube que naquela barca [a de Pedro, que a igreja considera o primeiro papa] estava o Senhor".
            A renúncia será formalizada hoje às 20h (16h em Brasília), e um novo papa deve ser escolhido em março.
            Diante de multidão calculada em 150 mil pessoas e de 65 cardeais, o papa lançou uma mensagem de humildade: "A barca da igreja não é minha, não é nossa, mas é Dele". Acrescentou: "O Senhor não a deixará afundar".
            Bento 16 repetiu a declaração feita no domingo, no sentido de que não abandonará a igreja. "Não retorno à vida privada", afirmou para acrescentar que não terá uma "vida de viagens, encontros, recepções, conferências", mas continuará "a serviço da oração, por assim dizer, no recinto de são Pedro".
            Alusão ao fato de que, depois de dois meses em um palácio em Castel Gandolfo, voltará a viver no Vaticano.
            Bento 16 reclamou, sobre a vida de papa, que ela corta "toda a privacy" (assim mesmo, em inglês, embora o discurso tenha sido em italiano).
            A última audiência pública de Bento 16 começou às 10h37, quando os cardeais presentes levantaram-se para recebê-lo a bordo de um papamóvel. A seu lado, o fiel secretário privado, monsenhor Georg Gänswein.
            Na praça de São Pedro, um punhado de bandeiras, as usuais em audiências do papa, mas também uma faixa insólita, da Indonésia, o país com maior população muçulmana do mundo. E outra em hebraico: "Shalom" (paz).
            Não foi, no entanto, uma cerimônia emotiva, até porque o papa é pouco dado a efusões. Ficou o tempo todo com a mão mecanicamente erguida, espargindo bênçãos, até que se aproximou dos cardeais e um deles juntou as mãos para o alto, sinalizando um abraço no papa, que ele retribuiu.
            O papamóvel só parou para que os seguranças passassem a Gänswein criancinhas que o papa beijava. Foram cinco, a última delas um menininho negro.
            Quinze minutos depois da entrada, o papa desembarcou junto ao estrado coberto, postou-se ao microfone e entoou em latim: "Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". E o público: "Amém".
            O discurso, como todos os que fez desde o dia 11, foi lido, com um improviso para agradecer a Deus pelo dia agradável, apesar do inverno.
            Antes da fala do papa, sacerdotes leram, em diferentes idiomas, português incluído, um pedacinho da carta de São Paulo Apóstolo aos Colossenses, uma forte louvação da palavra de Deus, tema que o papa retomaria e reforçaria na sua alocução.
            Ao fim, encadeou longa série de agradecimentos, começando pelos cardeais (pela "sabedoria, conselhos e amizade"), para os quais pediu orações. Citou a Cúria Romana e a "boa comunicação".

            Sempre na contramão - Mariana Peixoto

            Documentário Hélio Oiticica, premiado no Festival de Berlim, será exibido comercialmente na Europa antes de chegar às salas brasileiras. Distribuidoras nacionais fecharam as portas 


            Mariana Peixoto

            Estado de Minas: 28/02/2013 

            Com dois prêmios importantes no Festival de Cinema de Berlim – da Federação Internacional da Crítica, na categoria Fórum, e o Caligari, de inovação no âmbito cinematográfico –, o documentário Hélio Oiticica, de César Oiticica Filho, vai estrear antes no circuito comercial internacional do que no brasileiro. “Sem dúvida, ele vai viajar bastante, tem vários festivais (estrangeiros) convidando. O mais difícil é conseguir distribuição no Brasil. Por ora, fechei somente na Alemanha”, afirma o diretor, sobrinho de Hélio Oiticica (1937-1980).

             César afirma que não tem levado muitas portas na cara porque “não tem ficado tanto atrás”. “As distribuidoras grandes não querem nem saber, já que procuram filmes água com açúcar, que são mais fáceis de vender. E o filme tem um potencial incrível. O prêmio da crítica internacional foi dado por críticos de vários países e de continentes diferentes. Ou seja, ele agradou numa linguagem universal. Isso é um indício de que vai agradar também no Brasil. Não é um filme de classificação livre, tem uma certa dificuldade, mas uma força visual e de música grandes. Estou sendo procurado por distribuidoras de fora, mas queria muito ser distribuído aqui”, continua o diretor.

            Um não já levado é da Riofilme. “Embora seja uma empresa mista, ela tem dinheiro público, da Secretaria Municipal da Cultura do Rio. Lá as portas estão totalmente fechadas, só falam de dinheiro para blockbuster. Não entendo como uma empresa ligada à secretaria vai dar dinheiro a quem tem.” Na Alemanha, Hélio Oiticica deve estrear em outubro, aproveitando que o Brasil é o convidado de honra da Feira do Livro de Frankfurt, que será realizada naquele mês. Também durante o evento será apresentada a exposição Hélio Oiticica – Museu é o mundo, maior retrospectiva do artista, com curadoria de do próprio Cesar Oiticica Filho e de Fernando Cocchiarale. Ainda em outubro, o filme participa da Viennale, maior festival de cinema da Áustria.

            Tropicália No Brasil, premiado no Festival do Rio (foi considerado o melhor documentário), Hélio Oiticica promove um diálogo direto com o espectador por meio de depoimentos, entrevistas e imagens de arquivo inéditos, organizados depois de extensa pesquisa. Em pauta, o início da carreira, junto ao Grupo Frente, o surgimento do neoconcretismo, a criação dos Bólides, Penetráveis, Núcleos e Parangolés, bem como o envolvimento com a Tropicália.

            “Contratei um pesquisador, Antônio Venâncio, que descobriu muita coisa que nem eu sabia que existia.” César cita como exemplo cenas de Parangolé na Bienal de Paris de 1965. “Da ideia inicial ao filme pronto foram 10 anos. Mesmo antes de captar a verba (o documentário custou R$ 1,5 milhão), comecei a produzir alguma coisa por minha conta. Ajudou muito foi a maneira de filmar, pois a Ancine só aprovou R$ 1 milhão para captação. Antes, fiz dois curtas (Invenção da cor, para o Inhotim, e o outro para o colecionador carioca Luiz Antônio Almeida Braga) sem ter que usar o dinheiro aprovado pela Ancine. Acabei utilizando o material para meu filme. Foi uma maneira inovadora de produzi-lo”, conclui. 

            CIÊNCIA » Semelhantes na dor - Paloma Oliveto‏

            Chimpanzés e gorilas podem desenvolver distúrbios mentais típicos dos humanos, como depressão e ansiedade. Especialistas defendem o fim dos estudos biomédicos com grandes primatas 


            Paloma Oliveto

            Estado de Minas: 28/02/2013 

            Billy Joe trabalhou duro até os 15 anos de idade, entretendo crianças em festas de aniversário. Apesar da exploração, cresceu livre, entre humanos, e apegou-se aos donos. Depois de tanto tempo de dedicação, contudo, foi vendido a um laboratório. O chimpanzé dócil e amigável deu lugar a um animal agressivo, ansioso, medroso. Deixado sozinho em uma jaula apertada, ele tinha repetidos ataques convulsivos e, em seguida, podia ficar horas na mesma posição, olhando para o nada. A libertação de Billy ocorreu apenas 14 anos depois, quando ele foi morar em um santuário. Mesmo cercado de carinho e atenção, o chimpanzé exibia um comportamento típico de quem sofre de estresse pós-traumático.
            Tão parecidos com o homem, seu parente mais próximo na natureza, os grandes primatas também são vítimas de problemas mentais, como depressão, ansiedade, distúrbios alimentares e automutilação. Durante uma crise, Billy extirpou com os dentes o próprio dedo indicador. O comportamento do chimpanzé era tão extremo que, em 2009, ele ilustrou um artigo publicado na Developmental Psychology, a revista da Associação Americana de Psicologia. O caso do animal, porém, não é único. Billy junta-se a Lira, uma fêmea que passou a arrancar os pelos do corpo ao ser confinada, sozinha, em uma sala; a Bobby, o macho separado da mãe quando nasceu e que passou a vida provocando feridas em todo o corpo; a Nuri, um chimpanzé deprimido, que evitava companhia; e a tantos outros primatas usados como cobaias.
            Em uma mesa-redonda durante o encontro anual da Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS), na semana passada, psiquiatras e especialistas em cognição animal alertaram para a necessidade de estudar mais as doenças mentais desenvolvidas pelos grandes primatas, principalmente para buscar uma forma eficaz de tratamento. “É preciso expandir os estudos sobre as psicopatologias desses animais, o que requer uma abordagem interdisciplinar, com profissionais das áreas da psiquiatria e da primatologia”, adverte Martin Bruene, professor do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Ruhr, na Alemanha. “Há poucas pesquisas que investigam como aliviar o comportamento anormal de primatas cativos, mas há indicativos de que o enriquecimento ambiental e o condicionamento behaviorista podem aliviar esses sintomas. Também pouco se fala sobre o uso de medicamentos para animais com problemas psíquicos severos, embora alguns experimentos tenham mostrado que eles podem ser úteis”, afirma.

            Parecidos Para Bruene, contudo, a melhor solução é banir de vez os primatas de estudos biomédicos. “Eles têm uma mente tão parecida com a nossa que, do ponto de vista ético o ideal é abolir esse tipo de pesquisa”, defende. No início do ano, os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês) anunciaram que não vão mais financiar experimentos médicos com chimpanzés, seguindo o exemplo da União Europeia, da Austrália e do Japão, que recentemente proibiram estudos com grandes primatas não humanos. No Brasil, eles também não são usados em pesquisas, embora os macacos ainda sejam cobaias, principalmente nos experimentos sobre malária e outras doenças tropicais. A justificativa dos NIH foi que os chimpanzés são desnecessários para o avanço da medicina. O órgão de saúde, contudo, vai permitir que esses animais continuem sendo alvo de investigações sobre hepatites.
            O fim do uso de primatas em pesquisas invasivas é uma das bandeiras do Comitê de Médicos pela Medicina Responsável (PCRM, sigla em inglês), organização não governamental dos Estados Unidos que participou da discussão no encontro da Academia Americana de Ciência. “A semelhança dos chimpanzés conosco não é simplesmente física, mas também social e psicológica. Existem muitas evidências dos efeitos maléficos do cativeiro para a saúde mental e o bem-estar dos primatas, que sofrem de distúrbios comportamentais, apatia e depressão maior, entre outras anomalias. Nenhuma dessas condições existem entre eles na vida selvagem”, afirma Neal D. Barnard, integrante do PCRM e professor da Faculdade de Medicina e Ciências da Saúde da Universidade de George Washington.
            De acordo com ele, embora no ambiente natural os primatas possam exibir características como agressividade, apenas aqueles usados em experiências de laboratórios ou que foram vítimas de exploração comercial e abandono sofrem de psicopatologias semelhantes às dos humanos. Isso ocorre porque, no cativeiro, além de passar por traumas físicos — Billy Joe, por exemplo, foi submetido a 40 biópsias de fígado —, eles são privados do convívio com outros membros do grupo. “Primatas são animais sociais, eles precisam de interação constante. Ficar isolados em gaiolas não é algo típico da vida selvagem, por isso esses distúrbios não se desenvolvem naturalmente”, alega Barnard. “Ficar perto dos outros é extremamente importante para a vida mental. Quando vão para o cativeiro, os primatas são separados de suas mães, ficam em solitárias; enfim, desde cedo, são privados de um relacionamento social normal, o que terá implicações para o resto de suas vidas”, concorda Martin Bruene.

            Zoológicos O pesquisador alemão, contudo, diz que não é contra outros ambientes controlados, como zoológicos, nos quais os animais podem conviver com os demais, em recintos que reproduzem a vida selvagem. “Se formos pensar que os primatas não podem ficar em zoológicos, então temos de estender isso para nossos animais de estimação e devolver nossos gatos e cachorros à natureza. A questão não é essa. O importante é discutir como esses animais estão sendo tratados, e nós sabemos que o tratamento recebido pelos grandes primatas em laboratórios ou locais de exploração comercial, como circos, que extraem todos os dentes deles, por exemplo, é extremamente maléfico”, afirma.
            O presidente da Sociedade Internacional de Primatologia, Tetsuro Matsuzawa, pesquisador da Universidade de Kyoto, afirma que, quando o tratamento é digno, os grandes primatas gostam de interagir com seus primos próximos, os humanos. Matsuzawa usa como exemplo o Instituto de Pesquisa em Primatologia da universidade, onde são feitas pesquisas cognitivas com 14 chimpanzés. No local, os animais passeiam livremente pelas salas e, quando se cansam dos testes de inteligência, simplesmente usam cordas para ir embora. O telhado da instituição, um ambiente que reproduz a vida selvagem africana, com muitas árvores e plantas, contrasta com os arranha-céus da cidade japonesa. “Eles vêm fazer os testes por vontade própria”, garante Matsuzawa.
            Para provar, o pesquisador exibiu, no encontro da AAAS, um vídeo no qual a chimpanzé Ayumu e seu filho Ai se divertem em um teste de memória numérica executado em um computador. “Essa é uma habilidade incrível, eles são melhores nisso do que qualquer ser humano. Depois, quando não querem mais brincar, eles simplesmente vão embora. Mas sempre voltam no dia seguinte”, diz.